quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Na prateleira - 35

As conversas ao vivo… morreram!
            Todos o sentimos, no metro, no comboio, no autocarro, à mesa, no sofá… Já não há conversas ao vivo. Há-as, sim, mas através de uns aparelhozinhos onde se passa com o dedo para cima, para baixo, para o lado… Outro dia, até demos com o nosso neto de dois anos a querer passar com o dedo as imagens da televisão!… ‘Vivemos’ com o mundo, com o Brasil, Paris, Londres, mas… esquecemo-nos de viver com os que estão ao nosso lado.
            Vêm estas considerações a propósito do que se vê a todo o momento, sim; no entanto, o pretexto maior é o que, decerto, bastantes de nós já receberam de amigos (e podem ver-se na Internet): os instantâneos colhidos nas ruas de Londres pelo fotógrafo londrino, Babycakes Romero, um deveras eloquente conjunto a que deu o significativo nome de "The Death of Conversation”, «a morte da conversação». Inclusive, um par de namorados, de braço dado, está cada um profundamente embrenhado nas imagens do seu smartphone! É caso para garantir: «Já não se namora como dantes!». Outrora, acendia-se um cigarro para entabular uma conversação, diz Babycakes Romero; hoje, liga-se o smartphone para acabar com ela!

Já é usual a «quentinha»
            Quando, em Outubro de 1989, estivemos, pela primeira vez, no Rio de Janeiro, admirámo-nos do hábito, já então aí vigente, de nos proporem, no final da refeição, se queríamos levar o que não comêramos do prato servido. Já tinham mesmo tudo programado, a «quentinha», como lhe chamavam, o recipiente de folha de alumínio, que hoje é banal em qualquer pronto-a-comer. Aproveitávamos habitualmente, pois o que sobejara do jantar dava para o almoço do dia seguinte, a não ser que topássemos pelo caminho de regresso ao apartamento com um sem-abrigo deveras necessitado.
            Estamos, pois, muito contentes por verificarmos que se torna cada vez mais essa uma prática corrente nos nossos restaurantes, onde, até há pouco, a comida que sobrava ia para o caldeirão dos restos, para o lixo, nem sequer servia, como nas décadas de 50 e 60, de lavadura para os porcos; e singular legislação, a cumprir entusiasticamente pelos agentes da ASAE, proibia qualquer reaproveitamento.
            Abençoada «quentinha»!

Os pombos
            Gostamos deles. Sabemos que não podemos dar comida aos que enxameiam as cidades e cujas fezes ácidas contribuem para deteriorar os monumentos. Sabemos que há um ditado popular que reza «casa de pombos, casa de tombos» – para desagrado dos columbófilos. Apreciamos, contudo, a sua fidelidade conjugal e não nos cansamos de lhes admirar os rituais de sedução, mesmo que ‘casados’ há muito! Um exemplo!
            Não deixei, porém, de sorrir para aquele casal que se passeava como quem não quer coisa numa das plataformas em serviço na estação de Cascais, no começo da tarde de 18 de Junho. Assim que o comboio chegou de Lisboa, abeiraram-se das portas e… foram sorrateiramente entrando, na mira de migalhas por ali caídas. Nunca imaginara tamanha capacidade de «desenrascanço»! Abençoados!

Coreografias de grupo – uma experiência para o envelhecimento activo
            Já tive ensejo de me referia à actividade que Teresa Meira está a desenvolver, com alunos dos 60 aos 86 anos, no Centro Eng.º Álvaro de Sousa, no Estoril. Chama-se Coreografias de Grupo (internacionalmente conhecida como Line Dance), tem técnicas específicas para os seniores, com a finalidade de se exercitar o cérebro ao nível da memória, ouvido, concentração e coordenação com a equipa, ao mesmo tempo que se dançam coreografias específicas, com músicas do “nosso tempo”, resultando em benefícios visíveis a nível de saúde, quer quanto ao colesterol, como muscular e ósseo.
            Era bom que mais instituições se consciencializassem da relevante importância de uma actividade assim.

A relatividade do quotidiano
            A data para a celebração foi escolhida tendo em conta as agendas dos vários intervenientes. Um bem aliciante final de tarde de segunda-feira; mas… pouca gente acorreu, apesar da divulgação feita.
            Hoje em dia, porém, a gente pensa que uma data e uma hora são as ideais e logo se lhe pranta em cima um aguaceiro, uma crise política, uma decapitação, o resultado de um referendo… E planeia-se um curso para adultos e pensa-se que o melhor é em horário pós-laboral e, depois, é a turma de dia que mais gente tem, porque pós-laboral há os putos para ir buscar à escola, a sopa para fazer, o farnel a preparar para o dia seguinte, o episódio da telenovela…
            Enfim, também nisso já me habituei à relatividade extrema do quotidiano.

Publicado em Costa do Sol – Jornal Regional dos Concelhos de Oeiras e Cascais, nº 69, 12-11-2014, p. 6.

Sem comentários:

Enviar um comentário