Lembro-me
que minha mãe reservava a quarta-feira para ir à praça na vila. Apanhava a
carreira e por lá passava a manhã. Chegava quase à hora de almoço, de alcova
carregada de legumes e peixe fresco. Não me parece que lá comprasse mais barato,
regatear ela sabia, mormente com as vendedeiras já suas conhecidas, a menina
Sara, por exemplo, a quem ela e meu pai compravam peixe desde que se haviam
instalado na aldeia. Creio, porém, que o mais importante para minha mãe não
eram tanto as compras, era o ambiente, as vizinhas e as amigas que por lá encontrava
e sabia de parentes e conhecidos, a enxaqueca de um, a operação do outro, a Felisberta
que ia casar, a Joquina que pró mês que vem teria criança… Da praça se
desprendia, pois, uma certa magia, que a reconfortava e lhe dava ânimo para
mais uma semana de azáfama.
Viseu
teve feira franca, dizem, que viria a dar lugar, séculos mais tarde, à
tradicional Feira de S. Mateus. E Alberto Correia, com o livro infantil
«Matilde e o Chapéu de Chuva Azul», em boa hora nos proporcionou a nós e, de
modo especial, aos mais pequenos, uma viagem mágica a esse mundo inesperado e
buliçoso. Já é edição de 2012,
patrocinada pela Expovis, Promoção e
Eventos, Lda., a entidade organizadora do certame; mantém, contudo, toda a sua
actualidade, pela forma esbelta como, através de uma narrativa singela, bem
ilustrada pelas fotografias de Rowan Shcelten, sabiamente emolduradas pela
maquetização de Sónia Ferreira, retrata
uma realidade feliz: o carrossel, o algodão doce, os balões… Matilde não
reparou noutros vendedores nem
noutros produtos – bons apenas para os adultos. Saída do sótão das coisas
velhas levada pelos ares pendurada num velho guarda-chuva azul, só o Tio Chico,
que os demais chamavam tolo, a vira e se deu conta dessa viagem. E, no final,
quedamo-nos a pensar quanto é importante o sonho. Como sabiamente nos aju da a compreender melhor a realidade!...
José d’Encarnação
Publicado no Renascimento (Mangualde), nº 723, 15 de Janeiro de
2018, p. 11.
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