segunda-feira, 23 de julho de 2012

Bombeiros de Cascais inauguraram piscina!

            Com o natural júbilo que a concretização de um sonho de mais de duas décadas justifica, foi inaugurada na manhã de sábado, 21, consoante o programa previsto, o novo complexo desportivo da Associação Humanitária dos Bombeiros Voluntários de Cascais.
            Situado na Rua das Macieiras, magnífica e inteligentemente integrado num cenário magnífico – a zona de confluência entre os lugares de Torre, Birre e Pampilheira, debruçado sobre o vale ainda verdejante do Rio dos Mochos, no trecho plano do seu leito que outrora foi de floricultura e está envolto em pinhal – o complexo, cuja  traça se deve ao arquitecto cascalense Gonçalo Andrade,  tem piscina de 10 x 20 m e outra com 8,2 m2 de plano de água para prática de hidroterapia e fisioterapia; dois ginásios, um no piso térreo com 100 m2 e outro no primeiro andar com 96 m2, tudo acompanhado, com é natural de vestiários e balneários. Há também, no entanto, uma sala para primeiros socorros, cafetaria e ainda uma bancada com 45 lugares para acolher eventuais assistentes. Do lado norte, uma plataforma relvada para… usufruto da paisagem!
            Recorde-se que a primeira pedra foi lançada a 19 de Julho de 2010 e também por isso, pelo bom exemplo de concretização em tempo oportuno e de correspondente contenção de custos, merece todo o aplauso! Como aplaudida foi também a concessão do crachá de grau ouro ao vice-presidente da direcção da Associação, Vítor Neves, que muito se empenhou no empreendimento ora inaugurado.
Falaram, na circunstância, o presidente da direcção, Dr. Rui Rama da Silva, e o presidente do Município, Dr. Carlos Carreiras, que, de certo modo emocionado e agradado pelo que acabara de ver, não quis seguir o discurso formal que tinha preparado e preferiu falar de improviso, dando largas aos sentimentos que, na ocasião, o assaltaram. E, claro, as palavras foram de congratulação por mais esta obra concretizada, com estas características e no rigoroso cumprimento dos prazos. Recorde-se que coube à autarquia o financiamento da obra, que – pelo entusiasmo já despertado e consubstanciado no elevado número de inscrições – vai, sem dúvida, constituir mais um pólo de benefício para a população. Aliás, Rui Rama da Silva teve ensejo de salientar que os preços a praticar, de notório sentido social, tiveram já um efeito regulador em estabelecimentos congéneres da freguesia, o que lhe aprouve registar.
Foi uma cerimónia muito concorrida, num final de manhã aprazível – e as mais de cem pessoas presentes pareciam não ter vontade de sair, a fim de prolongarem por mais um tempo o deleite que a deslumbrante envolvência proporciona…


Publicado no Cyberjornal, 22-02-2012:

Finalistas da Escola de Teatro sujeitos a prova de fogo!


            Estreou na passada sexta-feira, dia 20, a peça teatral Woyzeck, da autoria de Georg Büchner, que a escreveu em 1836.
            Não se trata de vulgar peça de teatro e quando se diz que o autor a «escreveu em 1836» não se está, mui provavelmente, a dizer a verdade toda. Primeiro, porque há quatro manuscritos diversos; depois, porque o autor morreu de tifo, com apenas 23 anos de idade; finalmente, porque, devido a estar incompleta, se desconhece exactamente o que Georg Büchner queria fazer. É certo que a versão «definitiva e filologicamente correcta apenas ficou disponível em 1967», como esclarece Miguel Graça, responsável por esta versão e pela sua dramaturgia; contudo, o que nos é apresentado são quadros sucessivos, quase descosidos uns dos outros, em que o elo ligação será o personagem que dá nome à peça, o soldado Woyzeck, progressivamente empurrado para a loucura e para o assassínio da mulher que foi infiel, «consequências directas da opressão que lhe é imposta pela sociedade em geral», nomeadamente de uma médica tirânica que o sujeitou ao tratamento experimental de apenas se alimentar de ervilhas…
Não se andará longe da verdade se dissermos que estes quadros são fruto da ebulição ideológica que se vivia no dealbar do 2º quartel do século XIX (recorde-se que se trata da época pós-napoleónica e do auge das revoluções liberais um pouco por toda a parte…) e fruto também das perturbações e interrogações de um Georg Büchner, que, alemão e inconformista perante o fracasso da Revolução Francesa e revolucionário (chegou a tentar uma insurreição subordinada ao slôgane «Paz às cabanas! Guerra aos palácios!»), deixara os estudos  de Medicina para se refugiar na literatura.
São, pois, de extraordinária riqueza e de enorme intensidade dramática todos os quadros e não admira, por isso, que Carlos Avilez, que assina, mas uma vez, aqui, uma encenação deveras notável, mormente devido è sua complexidade, apesar da aparente simplicidade que a nudez da cenografia poderia dar a entender, haja escolhido a peça para prova (de fogo, dir-se-ia!...) dos alunos finalistas da Escola Profissional de Teatro de Cascais.
São, pois, três os elencos que se vão revezando até 12 de Agosto, no Mirita Casimiro, sempre observados por professores e actores que os avaliam.
Grande beleza plástica a da coreografia, assinada por Natasha Tchitcherova. Extraordinário, o empenho de todos, não apenas dos doze (vezes três) actores principais, mas de todo o elenco (chegam a estar em palco meia centena de jovens actores!). Estão todos de parabéns.
E não resisto a duas a três pinceladas que particularmente me tocaram e me incitam a solicitar que a peça volte a estar em cena.
Primeira: a alegoria do tempo. Começa-se a correr desenfreadamente, como a querer tudo apanhar, numa loucura. Corre-se muito, no decorrer das cenas. Há, porém, um outro quadro, inesquecível pela densidade singela que a sua mensagem nos inocula: o protagonista arrasta, em diagonal, de uma ponta a outra da cena, a longa cauda do tecido vermelho de sangue em que se embrulhara, lentamente, lentamente, no mais completo silêncio, a dar-nos a lição de como um segundo é muito e há que o aproveitar. Aliás, sentencia-se, a dado passo, num outro quadro: «Não corras! Desce a rua devagar! Como deve ser!...».
           E há frases destas, para fazer pensar, disseminadas aqui e além;
«Quando o carpinteiro aplaina as tábuas, ninguém sabe quem é que nelas se vai deitar!».
«Conta-me uma história, como se eu fosse criança» – e a história conta-se, do menino que olha para a lua, para o sol, para as estrelas… «E ainda lá está, sozinho e a chorar».
«O caminho da vida é por ali, não é? Está tão escuro!... Tenho de ir andando!».
«Quando ficamos frios, deixa de estar frio!»
E, a certa altura, o actor interpela o público:
«Estão a olhar para onde? Olhem para vocês!».
O objectivo, proclama-se no início, é mostrar o Homem «como Deus o criou!». Na verdade, saímos desta sequência, esmagados, a pensar… neste Homem que Deus criou! E as reflexões exaradas nesse dealbar do século XIX perante o fracasso da grande revolução, servem-nos hoje, às mil maravilhas, perante o fracasso de outras revoluções…

 Publicado no Cyberjornal, edição de 22-07-2012:

sexta-feira, 20 de julho de 2012

Não basta fazer… é preciso que dizer que se fez!


            Esta máxima, que se prende com uma outra, mais antiga, «Não basta à mulher de César ser séria, tem também de parecê-lo!», assume particular relevância no que à actividade autárquica diz respeito.
            Promessas eleitorais são promessas que amiúde se esquecem. Escreveu Gustave Le Bon, no seu livro A Psicologia das Multidões, datado de 1895 (!), que os candidatos podem prometer sem receio as mais amplas reformas, porque, «no momento, os exageros produzem bastante efeito e não comprometem o futuro», pois que «o eleitor não se preocupa nada em saber se o eleito obedeceu à profissão de fé aplaudida e à qual deve a vitória».
E é verdade! Por isso, a diferença reside no facto de proceder diversamente e cumprir. Por outro lado, cumprir só não basta: urge dizer que se cumpre. E, neste aspecto, sem qualquer outro intuito que não o de verificar o que é verificável, louve-se a incessante acção do GIDI – Gabinete de Imagem, Documentação e Informação, da nossa Câmara Municipal, que, liderado pela vereadora Marlene Guerreiro e dinamizado por Cláudia Guerreiro, nos mantém quase diariamente ao corrente das mais diversas iniciativas que se realizam ou vão realizar-se no concelho, quer as promovidas pelos serviços municipais quer pelas várias entidades aqui em actividade.
Refiro, a título de exemplo, a mensagem divulgada a 4 de Julho:
«No início deste novo mês relembramos alguns dos melhores momentos vividos em São Brás de Alportel e preservados através da imagem…nas reportagens da Local Visão TV! Bons momentos para recordar... à distância de um clique!!».
E lá estavam, de facto, «à distância de um clique», significativas reportagens, que levam o nome de São Brás de Alportel a todos os cantos.
Aplauda-se, pois, esta enorme disponibilidade de um exemplar serviço camarário, que não se poupa a esforços para mostrar… como é diferente viver em São Brás!

  [Publicado em Notícias de S. Braz, nº 188, 20-08-2012, p. 5].

Feira do Artesanato - Inauguração envergonhada ou incompetência reinante?

            Os factos: a 49ª edição da FIARTIL – Feira do Artesanato do Estoril – abriu na quinta-feira, 21 de Junho, às 18.00 h. Pelo Gabinete de Imprensa da CMC, foi enviada à Comunicação Social, às 18.08 horas desse mesmo dia, a seguinte informação:
«A partir de hoje, dia 21 de junho, abre portas mais uma Feira de Artesanato do Estoril, promovida pela Câmara Municipal de Cascais, através da Cascais Dinâmica, no recinto em frente ao Centro de Congressos do Estoril. Até dia 2 de setembro, o certame mais antigo de Portugal reúne mais de três centenas de artesãos para mostrar ao vivo técnicas e tradições ancestrais das artes populares de Portugal. Com um vasto programa de animação, de que fazem parte nomes como Paulo de Carvalho, Vitorino, Lenita Gentil, Carlos Alberto Moniz, Ana Lains e Cuca Roseta, este ano, pela primeira vez na história da Feira do Artesanato do Estoril vai também decorrer um concurso de Fado, para descobrir novos talentos desta sonoridade que é património imaterial da humanidade.»
No dia seguinte, 22, no começo da tarde, foi-nos enviada a habitual agenda do presidente, onde constava para esse dia, às 18.00 horas, a sua presença na «inauguração da Feira do Artesanato do Estoril».
Pelo que pude apurar, estiveram presentes ao acto pouco mais do que cinco individualidades. As fotografias divulgadas, por exemplo, pelo nosso prezado colega local que teve publicidade de capa (página inteira), na sua edição do dia 27, mostram dois artesãos sozinhos e a imagem dos dois intervenientes na inauguração: o Senhor Presidente da Câmara e o Senhor Presidente da Cascais Dinâmica, a empresa municipal que gere a feira.
Por conseguinte, observados os factos, creio justificar-se a pergunta feita: preconizaram uma inauguração envergonhada, para, por exemplo, não fazer concorrência aos outros muitos eventos da temporada, ou tudo isso reflecte uma enorme incompetência ou desinteresse pela Feira por parte da Cascais Dinâmica?
Vivemos em Cascais há muitos anos. Acompanhamos a Feira do Artesanato desde o 1º ano em que nasceu, quase no âmbito das comemorações do VI centenário da elevação de Cascais a vila. No Antigo Regime, sucedânea de certo modo, como fora, do Mercado de Abril, a inauguração tinha honras de Chefe de Estado e ministros. E assim continuou nos primeiros anos após a Revolução, porque se compreendia perfeitamente que o artesanato vivo que ali se apresentava, além de ser forte atracção para os habitantes – ponto de encontro privilegiado das noites dos nossos Verões – o era também para os forasteiros. Turista que se prezasse ia à Feira do Artesanato saborear petiscos bem portugueses e deliciar-se com o que eu cheguei a chamar «Portugal pelas mãos do seu Povo». Ali se convivia com os bonecos da Rosa Ramalho, de Barcelos, os Cristos ingénuos de Mestre Josafaz, a louça de Bisalhães ou os barros negros de Molelos, as procissões com centenas de figuras de Estremoz, a loiça de S. Pedro do Corval, as filigranas minhotas, as rendas de bilros, as bilhas de Nisa… Era isso: Portugal pelas mãos do seu povo, vendo trabalhar ao vivo artesãos autênticos.
E o dia da inauguração era um dia de festa, o Dia da Festa do Turismo Local. Nessa tarde – por que se esperava o ano inteiro – ali se reuniam os hoteleiros, os responsáveis pelas agências de viagens, os capitães do Porto (o que estava em funções a os anteriores, porque, por inerência do cargo, o capitão do Porto pertencia à Junta de Turismo), os representantes das forças vivas do concelho, os jornalistas locais e os nacionais, representantes de empresas ligadas ao turismo, a vereação camarária, os deputados municipais, membros dos executivos das juntas… Enfim, a inauguração constituía agradável pretexto para troca de impressões e de experiências, para gizar novos projectos, para, enfim, juntar num mesmo recinto emblemático quantos contribuíam para o que era (e não continuará a ser?) a principal fonte de riqueza do concelho.
Nessas alturas, não estava lá, claro, ninguém da actual Cascais Dinâmica. Não admira, por isso, que dessa memória nada se tenha retido ou recebido. Ou, se se recebeu, decidiu-se fazer tábua rasa, para se ser inovador ou, se calhar, para tentar reduzir a feira a algo sem importância de maior. E é pena. Mormente porque depressa se terá esquecido, por exemplo, das lutas grandes que tivemos para que esse pinhal fosse preservado para a feira e não transformado – houve projecto quase em fase de aprovação!... – em empreendimento habitacional de luxo, arrancando os pinheiros e contaminando também o manancial que lhe passa por baixo e alimenta as termas do Estoril.
É pena que se tenha perdido a memória. È pena que não se publicite mais a feira (que a determinado momento se começou a chamar Fiartil porque englobou artesanato doutros países). É pena que o artesanato lídimo tenha dado lugar, de modo prevalente, ao chamado artesanato urbano. Mas… é o que temos, que é que se lhes há-de fazer? Se, ao menos, tivessem estudado a História Local!...

 [Publicado no Jornal de Cascais, nº 318, 18.07.2012, p. 6].

terça-feira, 17 de julho de 2012

Património e Turismo Cultural, binómio indissociável


            No quadro do XI Congresso Internacional de Reabilitação do Património Arquitectónico e Edificado que brilhantemente foi organizado na vila de Cascais e que lhe valeu, também por isso, ter sido eleita para sede europeia do CICOP (Centro Internacional para a Conservação do Património), realizou-se na sexta-feira, 13, durante todo o dia, na sala da música do Museu Condes de Castro Guimarães, o seminário «Património e Turismo Cultural, um binómio indissociável? – Um tema de reflexão», coordenado pela Dra. Simonetta Luz Afonso.
Assistiram cerca de vinte congressistas – haja em vista que as sessões eram simultâneas e se distribuíram por diversos locais.
Coube à coordenadora abrir a sessão, invocando três acontecimentos que, em seu entender, deixaram profundas marcas a mostrar que o investimento na Cultura contribui eficazmente para melhorar a imagem do País e, consequentemente, se deve assumir como indispensável e não menosprezável factor de crescimento económico: a Europália, realizada na Bélgica, em 1991, com Portugal como país-tema; Lisboa, Capital Europeia da Cultura (1994); e a Expo’98. Em todas elas, Simonetta Luz Afonso teve intervenção importante, como se sabe. Referiu, a título de exemplo, que data dessa década o interesse pela arquitectura de museus e o despertar da necessidade de haver preparações específicas dos agentes turísticos na área cultural, dado que, ainda que não se deva pensar em construir um mundo para o turismo, o certo é que 40% dos visitantes de Portugal vêm cá por motivos culturais e hoje, em que pode trabalhar-se em qualquer parte do mundo e, por outro lado, os turistas gostam é de sentir o viver da população local, a atenção das entidades governamentais e dos operadores turísticos tem de ter em conta essas vertentes.
            António Lamas – que preside à Sociedade Parques de Sintra, Monte da Lua, S. A., uma empresa criada em 2000, de capitais exclusivamente públicos e que não recebe contribuições do Orçamento do Estado – deu conta de como é gerir, equilibradamente, os recursos ao seu dispor. Referiu que, se um turista pensa estar 3 dias em Lisboa, reserva um para ir a Sintra; por isso, há que proporcionar-lhe aliciantes e isso se está a fazer, nomeadamente após se terem reabilitado a Casa de Monserrate, o palacete da Condessa de Edla, vários outros edifícios em ruínas e, de modo especial, o espaço envolvente: identificaram-se, por exemplo, 53 000 espécies arbóreas!... Acentuou que um dos segredos estava na atenção dada às pessoas, à motivação incutida nos seus funcionários e colaboradores, em que se incluem reclusos e jovens das CERCIs e, na central telefónica, pessoal de mobilidade reduzida. Registe-se que todas as obras e, inclusive, as escavações arqueológicas efectuadas estiveram abertas ao público, como motivo de atracção.
            Andreia Aires de Carvalho Galvão e José António Ribeiro Mendes apresentaram a rota dos mosteiros portugueses património da Humanidade: Jerónimos, Alcobaça, Batalha e Convento de Cristo. Andreia Galvão falou muito depressa, apresentou generalidades e da sua intervenção ressalte-se a importância de se produzirem conteúdos válidos para acompanhar essas visitas. Ribeiro Mendes, por ser da área das TIC (Tecnologias de Informação e Comunicação), hoje na moda, dissertou sobre o papel da Internet, designadamente porque muito se faz através da informática e, antes de partir para um destino, o turista é capaz de o visitar virtualmente; daí, de novo, a relevância que há em fazer uma boa gestão dos conteúdos a disponibilizar. Sublinhou que, de acordo com as estatísticas, disponíveis, 33% dos turistas se deslocam por terem consultado a Internet, 25% devido à publicidade boca a boca, 14% para rever sítios já anteriormente visitados e apenas 17% por acção de agências de viagens. No caso desta rede mosteiros, o slôgane poderia ser «mil anos de sabedoria» a descobrir! Na verdade, o viver uma experiência constitui cada vez mais um atractivo a fomentar.
            De tarde, Manuel Sande e Castro Salgado relatou a feliz experiência em curso no Bairro da Mouraria em Lisboa, um programa de desenvolvimento comunitário que está a dar excelentes frutos. Sob o mote «Há vida na Mouraria!», são quatro os eixos em que o programa se desenvolve: «revitalização do tecido económico local; melhoria da qualidade de vida dos idosos; promoção do acesso ao emprego, saúde e cidadania das populações vulneráveis, nomeadamente trabalhadoras do sexo, toxicodependentes e sem-abrigo; e a promoção do fado como factor identitário». Uma experiência notável!
            Virgílio Gomes, docente de História da Alimentação na Universidade Nova de Lisboa e interveniente em muitas experiências ligadas à Gastronomia (colaborou, por exemplo, com a Dra. Simonetta na escolha das ementas típicas portuguesas para o Pavilhão de Portugal na Expo), demorou-se na explanação do enorme papel que hoje a gastronomia tradicional detém no quadro da promoção turística. Demorou-se, mas não cansou, tão interessante foi o testemunho que nos trouxe. Preconizou o maior rigor na apresentação das iguarias – sobretudo se se tiver em conta que a gastronomia é considerada património imaterial (foi, por exemplo, classificada como património cultural a refeição gastronómica dos franceses e o México apresentou uma candidatura em que o milho, o feijão e as pimentas eram os principais condimentos… Criticou o facto de os restaurantes não darem a primazia, nas suas ementas, aos vinhos locais e regionais. Falou da alheira, da canja (trazida do Oriente por Garcia de Orta). Uma lição de grande alcance. Aliás, o professor pode ser visitado em http://www.virgiliogomes.com – onde há também muito para aprender!
            A Bruno Mota Martinho fora dado como tema «O turismo e o património cultural edificado em contexto urbano e na gestão das cidades». Perdeu-se, porém, num emaranhado de concepções teóricas, ilustradas com diapositivos abstractos cujo significado (decerto) escapou a boa maioria dos ouvintes; falou depressa, monocordicamente e, no fim, mesmo apoiando-nos no extenso resumo da conferência que nos foi facultado, recheado de frases bonitas, ficámos com a ideia de que o que preconizava era, fundamentalmente, «a criação de corredores contínuos e coerentes de oferta cultural e turística». Nesse aspecto, Belém poderá ser um bom exemplo (digo eu); mas o conferencista quiçá não se tenha apercebido também do ‘corredor’ em que se encontrava, na vila de Cascais, onde se criou, na verdade, um núcleo cultural da maior relevância, a abranger a Cidadela, o Palácio da Presidência da República, o Centro Cultural, a Casa de Santa Maria, o Museu dos Faróis, a Casa das Histórias e o Museu do Mar, tendo no meio o amplo e bem agradável Parque Marechal Carmona. E quanto ao património cultural edificado em contexto urbano nada soou, que eu me tivesse apercebido.
            A terminar, já quase em cima da hora de fechar (e foi pena!), Miguel Fialho de Brito veio falar das «novas redes de promoção». Atrasados como estávamos, poderia ter deixado a história do turismo, o diário da viagem a Portugal e a Espanha do senhor W. Beckford (1787-1788); e só quase no fim nos trouxe aquilo que nos interessava: como é que as redes de estudantes ERASMUS constituem doravante um excelente meio de promover o País e a mobilidade. Temos 8000 estudantes ERASMUS em Portugal, o que representa notável capital a não desperdiçar. O portal www.studyinportugal.net  apresenta, em inglês, dez razões para estudar em Portugal e o nosso País é aí apresentado como «a tua porta de entrada para o Mundo»! Sobre isto gostaríamos de ter ouvido falar mais.
            Simonetta Luz Afonso congratulou-se com a jornada e a fidelidade dos participantes.
            O Congresso redundou, de facto, num enorme êxito, com largos ecos, sobretudo se tivermos em conta as múltiplas facetas abordadas por conceituados especialistas de renome internacional. E não é de somenos realçar que no cartão de identificação dos participantes estava incluída uma caneta que contém as actas; ou seja, antes de o congresso se realizar já todas as contribuições estavam disponíveis! Uma ideia genial, mais um motivo para dar os parabéns aos organizadores. Cascais deu cartas, mais uma vez!

Publicado no Cyberjornal, edição de 17-07-2012:

Turismo – uma análise arguta escrita em livro


           Quando, a 8 de Maio, por iniciativa da Fundação António Quadros, com a colaboração da Escola Superior de Turismo e Hotelaria do Estoril e o patrocínio da Câmara Municipal, se realizou o colóquio «Turismo em Portugal. Passado. Presente. Que Futuro?», logo ali se anunciou que o livro de actas se apresentaria a 14 de Julho, data em que António Quadros, se fosse vivo, completaria 89 anos. E a 14 de Julho, sábado passado, o livro foi apresentado!
Parabéns, pois, à Fundação, na pessoa de Mafalda Ferro, coordenadora e organizadora do volume, pela exemplar lição, pois já não estamos habituados a que promessas sejam cumpridas e, de um modo especial, que as actas de um encontro científico vejam rápido a luz do dia. Assim não foi – e está de parabéns a Fundação.
Perante um luzida assistência, de individualidades ligadas ao Turismo (não, da tal Cascais Dinâmica não estava ninguém, que esse era dia de cavalos no hipódromo…), Jorge Felner da Costa, que foi um dos pilares do turismo em Cascais, deu miúda conta do conteúdo do volume, demorando-se a sintetizar o contributo da cada uma das intervenções então feitas e ora passadas a escrito. Pedro Garcia aproveitou o ensejo para se referir aos novos eventos – nomeadamente ligados ao mar (não fora ele um dos responsáveis pela marina!...) – que a Cascais têm trazido inúmeros forasteiros. Carlos Carreiras, que invocou de modo especial a sua qualidade de Presidente do Conselho Geral da Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril), congratulou-se com a publicação, pelo acervo documental e de reflexão que proporciona.
Trata-se de um volume de 254 páginas, pejado de ilustrações a cores – um manancial do maior interesse! –, com o ISBN 978-989-96653-3-0, cuja publicação teve o patrocínio da Fundação para a Ciência e a Tecnologia e não obedece ao novo acordo ortográfico (aplauda-se!).
Celestino Domingues evoca os primórdios do turismo (p. 27-49); Margarida Ramalho escreve sobre Cascais e o Estoril (p. 51-73); Gabriela Carvalho conta das festas de Lisboa (p. 75-97); José Guilherme Victorino recorda António Ferro (p. 99-127); Manuel Coelho da Silva realça o papel do turismo como fautor de identidade de Portugal nos anos 50 (p. 129-141); em «Turismo em Portugal – explorar o passado, perspectivar o futuro» (p. 143-175), Alberto Marques traça uma panorâmica das tendências turísticas antigas e actuais; finalmente, a mui oportuna bem documentada análise de Armando Rocha, põe em confronto, no que concerne à hotelaria, as diferenças abissais que ora se registam em relação ao praticado há uma década atrás (p. 177-193).
O livro traz ainda a reprodução das 177 imagens que integraram a excelente exposição documental patente no dia do colóquio, um repositório de grande interesse, mormente se tivermos em conta, por exemplo, a rara beleza dos cartazes que outrora se produziam!
Uma obra, sem dúvida, doravante de consulta obrigatória por quem se dedique à actividade turística.

Publicado no Cyberjornal, edição de 17-07-2012:

O nosso quotidiano mariposeio

            Mariposear: andar de um lado para o outro, pegar numa coisa agora, deixá-la a meio, começar outra e, de seguida, atirar-se a mais uma sem deixar acabada a anterior. Tal como parece ser a mariposa, que vai daqui para ali, depois volta, volteia, poisa aqui, poisa acolá, está quieta escassos segundos….
            Meu pai preferia um termo mais corriqueiro, menos… poético: besoirar! Besoirar quererá significar vulgarmente «incomodar com barulho insistente», qual besouro que vai e vem e nos acicata os ouvidos. Tenho-o, porém, num outro significado, porventura próprio do falar algarvio: muitas vezes meu pai o usava, mormente quando, por exemplo, nos preparávamos para ir para a mesa; minha mãe ou minha avó ficavam a «besoirar»: tinham sempre mais uma coisa a fazer, faltava isto, faltava aquilo e parecia que nunca mais se despachavam!...
            Lembra-me a palavra duas outras situações.
Uma, a dos que já estamos avançados nos anos e que, amiúde, vamos arrumar a chave e vemos um sapato fora do lugar e o livro desarrumado e toca alguém à porta e… ao fim do dia, perguntamos: «Mas onde é que eu pus a chave?»…
A outra, a história do chanceler D’Aguesseau, contada por Mário Gonçalves Viana (A Arte de Estudar, 1943, p. 151): havia sempre um intervalo, mais ou menos longo, entre o momento em que o chamavam para a mesa e aquele em que a refeição começava; decorrido algum tempo, o chanceler apresentou à família, estupefacta, o livro que escrevera unicamente durante esses ligeiros quartos-de-hora em que o resto do pessoal… besoirava!
            E se a primeira situação acaba por constituir um grito de alerta e nos obrigar, ao final do dia, a rigoroso exame de consciência acerca do nosso estado de espírito habitual e da capacidade de dominarmos os passos do nosso existir quotidiano, revela-nos a segunda um outro ‘drama’ que consubstanciamos na frase «Não tenho tempo para nada!» e a que Michel Quoist retorquiria prontamente: «Tens muito tempo à tua disposição, mas passas o tempo a perder o teu tempo». (Construir, Livraria Morais Editora, Lisboa, 1965, p. 123).
     
Publicado no quinzenário Renascimento [Mangualde], nº 597, 15-07-2012, p. 15.

Lendas do Médio Oriente, dia 14: apoteose!


           García Lorca: Composto no ano 2000, em Granada. Sonoridade surpreendente. Primeiro, introdução; depois, dança-se! Ninguém diria que é um instrumento apenas e só o dedilhar de cinco dedos nas oito cordas do alaúde. Não há por aí saias roçagantes? Ninguém diria! Faz-se uma pausa agora, para um beijo ou um cheiro de amores-perfeitos no jardim do Alhambra. E há um véu que esvoaça. E não é corridinho algarvio também?
            Córdoba: Tímidos acordes, como vontade de quem não quer despertar belezas. Arrisca-se depois, num convite ora hesitante ora sedutor, em malabarismos de sons irrequietos ou dolentes. Mas desculpem: é só um instrumentista a tocar? Para onde, afinal, nos quer levar tão melodiosamente? Agora em cavalgada, parece! E cantamos baixinho.
            Primavera árabe: Num apoio à Tunísia e aos outros, um após outro. Começo plangente como quem pergunta: porquê? E há quem marche alegre, com pressa de cantar liberdade. Esboça-se um hino heróico. Ainda precisamos de avançar mais? E podemos ensaiar um passo de dança? Em frenesim, está bem? Que a vitória tem de ser nossa!
            Infância: Compôs para a filhota, de dois anos; agora tem sete. A ternura duma meiguice, na iniciação aos sons bonitos da vida. E pode ensaiar uns passinhos, não? Tens razão! A música é assim como um labirinto; mas poderás dançar sem te perderes, descansa! Saltita! E já sonho contigo, a saltitar pelos campos joviais! Vamos brincar? Correr, correr, correr!...
            Bagdade: De um Iraque donde saiu há 19 anos, devido à ausência de liberdade e também pela ocupação americana. Que posso mais fazer senão planger? Dói-me o coração, choro a ausência. Estou dolente e pergunto-me porquê. E se eu rodopiar, a tristeza passa? Rodopiarei então! E vocês vão cantar comigo! Há tanques ameaçadores ali? Deixá-los!
            De Ashur a Sevilha: Depois da flauta, foi o alaúde assírio o primeiro instrumento de cordas; todos os alaúdes de Sevilha vieram daí. Toquemos com a forma mais primitiva de o fazer: com cinco dedos só. Só com cinco dedos? Não parece! Ah! Já estamos no sapateado do flamenco, diríamos! E que dedilhar é este, senhores? Ecos do Tigre e do Eufrates, águas de ambos a beijarem o Guadalquivir? Assim em turbilhão não queremos! Ou é a euforia do encontro? Rodopiaremos, pois, em delírio!
A viagem das almas: Começa lentamente, como quem não quer partir. E há uma melodia ao longe, não ouves? Ainda hesito em partir, sabes? E se entoássemos uma canção? Seria melhor, não achas? Vá lá, façamos este diálogo entre os baixos e os altos. Pronto, estamos decididos: é partir! Eu domino bem a sonoridade do meu alaúde, numa carícia…
Retrato: Do folclore árabe. E este é mesmo para bailar. Até apetece bater palmas, assim ao ritmo do compasso. Mudemos os ritmos, para quebrar monotonias. E vai a melodia a ecoar pelo Atlas, frenética ainda, frenética… Ah! Mas não é um turbilhão de alaúdes, uma orquestra? Não. É um só. Parece mentira. E termina com uma só mão.
Síria: Foi o brinde aos cerca de 400 assistentes, num agradecimento aos senhores embaixadores árabes, ao Festival (na pessoa de Piñeiro Nagy), ao engenheiro do som, a quantos quiseram encher a Sala Atlântico do Hotel Palácio no Estoril, para o o ouvir a ele, Naseer Shamma, na noite de sábado, 14, e as suas «Lendas do Médio Oriente», ele que pela primeira vez está entre nós, no âmbito do 38º Festival de Música do Estoril.
Síria sacrificada, morte nas ruas, crianças… O som forte de quem aguenta a pé firme, sem vacilar e trauteando uma cantiga. Alguém tombou agora, choremos pelo inocente, numa canção de embalar! Rufam tambores mil pela cidade ensanguentada! Apoteose! E o Sol irá raiar de mansinho!... 

Publicado no Cyberjornal, edição de 16-07-2012:

domingo, 15 de julho de 2012

O Património Cultural em grande destaque em Cascais

            Começou na quinta-feira, 12, o XI Congresso Internacional de Reabilitação do Património Arquitectónico e Edificado, que se prolongará até domingo.
            Cerca de 400 participantes, entre os quais muitos espanhóis, assistirão, em diversos monumentos da vila de Cascais (Centro Cultural, Casa de Santa Maria, Museu do Mar, Museu dos Condes Castro Guimarães, Casa das Histórias) a sessões do maior interesse pela temática abordada e pela excelência dos oradores convidados.
            É uma realização da Câmara, através do seu Instituto de Cultura e Estudos Sociais, e da Federação Internacional de Centros CICOP (ligados à conservação do Património), com a colaboração de várias entidades.
Foto de Luís Bento
A sessão solene de abertura decorreu numa das salas do Palácio de Cidadela, uma vez que o Congresso tem o alto patrocínio do Chefe do Estado, e foi por isso o director do Museu da Presidência da República, Dr. Diogo Gaspar, o primeiro orador, a regozijar-se por lhe ter sido dada a honra de receber tão ilustres congressistas, apresentando uma pouco da história do palácio em que nos encontrávamos. Seguiu-se o Professor José Manuel Tengarrinha, que preside ao ICES e que saudou os representantes de 25 países que, para além de Portugal, ali estavam representados, sublinhando, por isso, a importância do encontro que, em interdisciplinaridade, reúne os mais conceituados especialistas neste domínio. O Professor Carlos Fabião, do Comité Científico do Congresso, traçou uma panorâmica do que se esperava da reunião e justificou a opção por Cascais: a localização e o empenho demonstrado pela autarquia na salvaguarda e dinamização do seu património edificado. Miguel Matrán, director geral da Fundação CICOP, agradeceu o acolhimento e manifestou o seu apreço a quanto aqui se tem já concretizado. Elísio Summavieille, que ora preside à recém-criada Direcção Geral do Património Cultural, em organização, recordou que, neste momento, pela Europa, cerca de 40% da construção civil se dedica à reabilitação de edifícios e, por outro lado, que «o património mais importante são as pessoas» (conceito que, comente-se de passagem, é bem agradável de ouvir quando parece andar tão arredio da prática concreta dos governos europeus). Encerrou a série de discursos o Dr. Carlos Carreiras, na sua qualidade de presidente do Município que acolhe e que promove, nesta «jovem vila de 648 anos» (frisou). E se ser presidente de um município significa deter nas mãos um forte potencial de destruição maciça, proclamou que Cascais é e quer continuar a ser uma «terra de património», dando respostas locais aos desafios impostos pela globalização.
A conferência inaugural foi proferida por Manuel Fernández Canovas, sobre «Los materiales de construcción y el Patrimonio Edificado». Pedro Vaz referiu-se aos trabalhos levados a efeito no Palácio da Cidadela e Jacinta Bugalhão deu conta de como se processara a reabilitação da Cidadela.
Antes do almoço, inaugurou-se no Museu dos Condes Castro Guimarães uma exposição e foram desde logo apresentados os posters previstos.

Publicado no Cyberjornal de 13 -07-2012
[http://www.cyberjornal.net/index.phpoption=com_content&task=view&id=16607&Itemid=67

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Noite magnífica de sedução e encantamento!


            Os cerca de 200 melómanos que resolveram ir até à igreja dos Salesianos do Estoril, na passada quarta-feira, 11, não deram seguramente por mal empregado o seu tempo, pois tiveram a dita de assistir a um dos mais fabulosos concertos que por estas bandas nos foi proporcionado.
            À bem criteriosa escolha do reportório associou-se o virtuosismo ímpar dos executantes, que nos deliciaram. Ouvi-los-íamos noite fora: foi a sensação com que ficámos. Dos 13 violinos aos 3 violoncelos e um baixo mais as três guitarras – todos nos brindaram com interpretações magníficas.
            Sim, o 38º Festival do Estoril começara no Largo de S. Carlos, no dia 5, com a Orquestra Sinfónica Portuguesa, mas estes Menuhin Academy Soloists, integrando músicos de variados países europeus encheram-nos as medidas!
            Dirigidos pelo romeno Liviu Prunaru, violino, começaram por interpretar a Simple Sumphony op. nº 4, de Benjamom Britten: à alegria saltitante e quase heróica seguiu-se a serenidade bucólica do entardecer, que um pizzicato acordou para, de novo, extasiar na tranquilidade dolente a que os braços de Cristo pareciam convidar e a excelente acústica do templo nada deixava perder; heroicamente, dialogaram os violinos no último andamento, um vivace presto.
            De Malcolm Arnold, a obra 77, «Concerto para dois violinos» (Liviu Prunaru e Valentina Svyatlovskaya, russa) e cordas: uma imagem sonora da turbulência actual (a obra é de 1962). Transcrição de Piñeiro Nagy e orquestração – eloquente! – de Tiago Derriça, circunstância que se repetirá nas Goyescas e nas peças de Albéniz. Parabéns!
            Após o intervalo, Espanha foi nossa companhia. Primeiro, um intermezzo das Goyescas, de Enrique Granados, em que já intervieram, à guitarra, Piñeiro Nagy (a grande e perseverante alma mater das Semanas de Musica do Estoril) e o MikroDuo (Pedro Luís e Miguel Vieira da Silva). Depois, o eterno Isaac Albéniz, em três peças, retratando cada uma a alma de sua cidade ou região: Astúrias, Cádis e Córdoba. E as guitarras gostaram das cenas e lá ficaram para o primeiro extra: uma canção de Manuel de Falla. Delicioso, em seguida, apesar de bem retratar a fúria dos elementos a perpassar pelo endiabrado movimentar de dedos a comprimir as cordas, «Invierno porteño», de Astor Piazzola, com Oleg Kaskiv (ucraniano), violino, como solista: longos foram, naturalmente, os aplausos e os bem merecidos «bravo!». E Liviu como que aceitou o desafio não para uma desgarrada mas para o trecho de uma abertura de Bach: magistral!
            A finalizar, Navarra, de Pablo Sarasate: a alegria das danças rodopiantes, em rimo de valsa bailam frenéticos os dedos pelas cordas… Mas… tivemos direito a mais dois trechos extra-programa, para terminarmos em ritmo de tango, como convém a quem saiu do templo com a alma cheia!...
            O festival volta no sábado, 14: Naseer Shamma trará lendas do Médio Oriente, em alaúde, à Sala Atlântico do Hotel Palácio.
Publicado no Cyberjornal, edição de 12-07-2012:

quarta-feira, 11 de julho de 2012

Taluda de Natal dá hospital a Cascais

            No Natal de 2004, a taluda saiu à Santa Casa da Misericórdia de Lisboa; na reunião da Mesa Administrativa de Fevereiro de 2005, a Provedora, Maria José Nogueira Pinto propôs que o dinheiro fosse encaminhado para a construção de uma Unidade de Cuidados Intensivos e Paliativos. A Unidade foi inaugurada, em Cascais, hoje, dia 10, no local onde se situava a fábrica da Standard Eléctrica, ou seja, em S. Gabriel, Aldeia de Juso, mesmo à saída da A5, portanto.
            Descerrou a placa identificativa, às 11.30 h., Jaime Nogueira Pinto, viúvo da patrona do estabelecimento. O Prior de Cascais, Padre Nuno Coelho, procedeu à bênção não das paredes (disse) mas fundamentalmente das pessoas: uma bênção para o amor, para “a proximidade nas vidas que vão passar por aqui e que especialmente vão necessitar da presença do Senhor». Seguiu-se uma visita ao piso térreo e ao 1º piso (quartos) das instalações, após a qual, ao meio-dia, houve, no exterior, a cerimónia protocolar da inauguração.
            O presidente da Câmara, Carlos Carreiras, acentuou a importância desta Unidade, «projecto de esperança onde antes havia desespero», forma de «aliviar o insuportável fardo da solidão», evocando a figura ímpar de Maria José Nogueira Pinto, sublinhando, a terminar: «As pessoas serão a nossa responsabilidade».
Jaime Nogueira Pinto, em sentida alocução, agradeceu e evocou também ele a sua esposa, salientando a sua «fé em Cristo», o seu «elevado sentido público, com absoluto desinteresse», a sua capacidade de saber «usar e repartir o tempo».
Pedro Santana Lopes, provedor da Misericórdia de Lisboa, realçou relevante papel que Maria José Nogueira Pinto teve na vida pública, designadamente na Misericórdia, onde deixou profundas marcas. Recordou que o pai dizia dela que não sabia se ela fazia aquilo de que gostava ou se gostava daquilo que fazia e referiu um dos aspectos que dela mais o impressionou: a velocidade com que caminhava, como se quisesse apanhar o tempo e muito havia que fazer! Após se ter referido à importância desta Unidade, pois «a grande doença deste século é a solidão» (palavras ainda de M. J. Nogueira Pinto), terminou: «Ela deve estar a sorrir com aquele sorriso bonito; ela deve estar contente».
            A nova Unidade, com uma área bruta de 4883 m2, é administrada por Carlos Andrade Costa e tem como directora clínica Maria de Jesus Rodrigues. O projecto representou um investimento de 9,33 milhões de euros. Distribui-se por 6 pisos: zona de serviços na cave, zona social no piso 0, internamentos nos pisos 1 a 4, com um total de 42 quartos, 11 deles individuais, num total de 73 camas. Serão mais de 120 os colaboradores em actividade, num plano de intervenção multidisciplinar (especialistas de Medicina Interna e de Fisiatria, enfermeiros especialistas, psicólogos clínicos, assistentes sociais…), em que se contará também com a estreita colaboração dos técnicos do Hospital de Alcoitão, que, como se sabe, é também pertença da Misericórdia de Lisboa.





Publicado no Cyberjornal de 10 de Julho de 2012:
http://www.cyberjornal.net/index.php?option=com_content&task=view&id=16582&Itemid=67

segunda-feira, 9 de julho de 2012

Parque Marechal Carmona, em Cascais – É permitido matar; dar de comer, não!

            Ainda que não haja por ali nenhum aviso nem tenha sido distribuído qualquer comunicado, a esse respeito, à população, é agora proibido dar comida às aves do Parque Marechal Carmona, em Cascais. Tratava-se, como se sabe, de um hábito muito corrente, que fazia as delícias da pequenada: dar migalhas aos patos, aos pombos, às galinhas e até aos pavões.
            Terá sido, porventura, o resultado de uma nova qualquer directiva comunitária que o Executivo municipal se apressou a mandar cumprir ou deriva de inconvenientes que, à primeira vista, não se enxergam. Será que as migalhas poderiam trazer veneno e fazer mal aos animais? Será que, desta sorte, essa população ficava mais bem alimentada e o que importa, agora, é diminuir o número de pombos, por exemplo? Vamos esperar pela informação completa que os serviços camarários certamente vão facultar.
Em todo o caso, acrescente-se que, se não é permitido dar de comer, é completamente permitido matar. Tal é a tarefa diária das gaivotas, que vorazmente se saciam de pombos, de patinhos pequenos, de tartaruguinhas, de pintainhos, de ovos (que vão roubar aos ninhos!)… Se não dar de comer viesse a evitar que as gaivotas ali aparecessem, ainda vá que não vá; mas o que as gaivotas querem não são migalhas, é carninha tenra, são ovinhos frescos… – e isso há por ali em abundância e ao espectáculo desalmado, feroz e degradante dessa atrocidade não são as crianças poupadas! Já se sugeriu a manutenção das ninhadas, durante algum tempo, em sítio mais resguardado, inclusive onde a pequenada as pudesse ver e as gaivotas não entrassem… Parece, porém, tarefa difícil de levar a cabo. Proibir é sempre mais fácil, já se sabe!
Congratulamo-nos, no entanto, com o facto de ter sido ouvido o nosso apelo: a estátua de Neptuno e a sua bonita envolvência estão a ser alvo de restauro; e, pelo que tivemos oportunidade de ver, é natural que ainda este Verão todo o sistema, inclusive o hidráulico, possa estar em funcionamento, para gáudio dos milhares de pessoas que frequentam aquele parque, verdadeiro pulmão da nossa vila!

 Publicado no Cyberjornal, edição de 09-07-2012

domingo, 8 de julho de 2012

A fauna cascalense em destaque

            Não, amigo, não se trata dessa! É da outra, cientificamente assim designada: a dos animais irracionais. Merecem estes (ao contrário dos racionais, suspeita-se…) cada vez maior atenção, na medida em que são enormes fautores da biodiversidade, elos de uma importante cadeia que urge não romper.
            Estará recordado que foi por isso que, ao planear-se a A5, se deixaram ‘corredores’ para as cobras, as rãzinhas e os sapos, por exemplo, passarem de um lado para o outro. O pior foi que os seus predadores descobriram a senda e lá se prantaram à espreita dos incautos, qual caçador de montaria na porta de uma batida ao javali. Boas intenções!…
            Quando, em Cascais, se abriu o Parque Urbano do Rio dos Mochos (impropriamente chamado de «ribeira»), houve também a feliz ideia de se publicar o livrinho Aves da Ribeira dos Mochos – Cascais, texto e magníficas fotos de um dos seus atentos vizinhos, José Manuel Durão, solenemente ali apresentado a 3 de Março de 2011.
No passado dia 5 de Junho, foi a vez de se apresentar, na EcoCabana (um lugar, sem dúvida, bem simbólico, sito à entrada do Parque Marechal Carmona), o livro As Borboletas de Cascais (a 244ª publicação da Câmara Municipal, desde que existe a inscrição no ISBN), resultante da paciente investigação levada a cabo por João Pedro Cardoso, desde 1977.
De cerca de 100 páginas e complementado por uma ficha de campo, de mui excelente apresentação gráfica, a cores (como não podia deixar de ser), a obra tem prefácio de António d’Orey Capucho; um texto de Patrícia Garcia Pereira (do Museu Nacional de História Natural) sobre a relevância da biodiversidade; introdução, da responsabilidade de Ernesto Maravalhas (membro também ele, como o autor, do Tagis – Centro de Conservação das Borboletas de Portugal), com breve historial acerca do interesse pelos lepidópteros (nome do género a que pertence as borboletas) em Portugal. Segue-se o texto propriamente dito, com a identificação ilustrada de espécies emblemáticas, explicitando-se depois os métodos de trabalho utilizados e assinalando-se, em mapa, os locais das intervenções feitas no quadro do Parque Natural de Sintra-Cascais.
24 pranchas ilustradas identificam os espécimes com o seu nome científico e a época de voo. Índice desses nomes científicos e bibliografia completam este bonito volume de capa rija, útil não apenas para os interessados neste tipo de actividade como também para mostrar a beleza, ainda que efémera, como se sabe, das mariposas que nos rodeiam.

Publicado no Cyberjornal, edição de 7-7-2012.

quinta-feira, 5 de julho de 2012

Andarilhanças 50

«Museu» do Canteiro
      Nunca será de mais salientar a importância que deteve a iniciativa de, no âmbito das festas populares de Tires, se reconstituir o ambiente do trabalho da pedra, desde a sua extracção até ao mais fino objecto.
      «Tires, terra de canteiros» foi o tema e não há dúvida que vale a pena recordar o que foi essa actividade, florescente ainda na 2ª metade do século XX e que ora vai desaparecendo, devido a serem outras as motivações e mui diversos os processos.
      Aquando  da inauguração, que contou com presença do Sr. Presidente da Câmara, no dia 8 de Junho, foram dadas explicações e houve, inclusive, encenação de alguns dos momentos marcantes da faina diária de antanho: o frémito do acender do rastilho para o tiro; a hora do almoço na lancheira trazida pela mulher; as andanças do aguadeiro; o aguçar da ferramenta na pedra de amolar; as combinações para o balho de domingo num catrapiscar de moças namoradeiras…
      Enfim, a criação de um ambiente que a maior parte das pessoas de agora desconheciam por completo e cuja memória urge salvaguardar. O monumento que erguemos na rotunda de Birre, na freguesia de Cascais, mostra o azulino cascalense como pólo de imigração de algarvios, alcains, coimbrões; evoca agora Tires, na freguesia de S. Domingos de Rana, a tradição saloia, que de braços abertos aceitou quem veio de fora. Ergueu-se singelo monumento numa rotunda da povoação, como se sabe; contudo, o entusiasmo que a iniciativa ora concretizada revelou não pode ser descurado e há que pensar num pólo museológico ali. Vontades particulares não faltam; verbas não serão necessárias muitas; vontades públicas há que incentivar!
      Para já, como filho de cabouqueiro que nas pedreiras viveu a sua meninice e parte da juventude, não posso deixar de muito me congratular com o que vi! Parabéns!

Jogos Tradicionais
      Depois do grande encontro nacional, o 5º, que reuniu dezenas de praticantes no Parque Marechal Carmona, nos dias 19 e 20 de Maio, João Mounier, alma-máter do JOTRA (Jogos Tradicionais), ligado ao Agrupamento de Escolas de Alvide, decidiu sair para o Jardim Visconde da Luz, no coração da vila, no passado 10 de Junho, a proporcionar a todos, velhos e novos, a aventura de verificarem se ainda sabem pegar numa gancheta e correr com o arco, se se recordam de como se joga o pião ou ao burro…
Também para ele um forte aplauso de parabéns – pela carolice, pelo entusiasmo, pela extrema dedicação. Dele e de toda a equipa, naturalmente.

Vender quartos ou emoções
      Não resisto a voltar a comentar o que aprendi na jornada que reuniu, na Escola Hoteleira, a 8 de Maio, pessoas interessadas em reflectir sobre o fenómeno turístico, no seu passado, presente e futuro. Apreciei sobretudo, repito, aquela ideia de os hotéis deverem doravante não apenas preocupar-se em vender quartos mas sim… «emoções».
      E lembrei-me da ideia quando, outro dia, ao entregar a chave do quarto, a menina me perguntou se eu me tinha servido da garrafa de água que estava sobre a mesa. Disse-lhe que não e expliquei que por dois motivos: primeiro, porque cada vez mais preferia beber a água da torneira; segundo, porque, mesmo que outro fosse o meu hábito, ao ver o papel pendurado no gargalo com o preço de 1 euro, eu perdi ainda mais a vontade de beber. Claro que apreciei o bloquinho para os apontamentos e o lápis (cada vez se usa mais…) e trouxe-os como recordação; no entanto, dei comigo a pensar naquela imagem que fora transmitida na tal jornada: um miminho proporcionado ao cliente acaba por o cativar e dar-lhe vontade de voltar. Agora, o papel com 1 € pespegado em realce no gargalo da garrafa… não é que, de vez em quando, me lembro dele?                    
[Publicado no Jornal de Cascais, nº 317, 04.07.2012, p. 6].

História contada nos versos do Povo

      Quando, no Verão de 1988, timidamente ousei dedicar algumas páginas do Jornal da Costa do Sol aos singelos versos de Isolina Alves Santos, tive o grato prazer de receber longa carta do Professor Ernesto Guerra da Cal, professor emérito de Literatura Comparada na Universidade da Cidade de Nova Iorque, em que, a dado passo, me dizia, depois de se referir à importância da poesia popular:
     
      «Isolina é uma das últimas representantes desses “poetas naturais”, que outrora supriram as necessidades líricas de todas as populações rurais; que deles também dependiam funcionalmente, para as letras de cantigas e bailados, baptizados, casamentos, aniversários e festas patronais».
      E, quando viu pela televisão o massacre de Santa Cruz, a 12 de Novembro de 1991, Isolina não hesitou: pegou na esferográfica e escreveu o poema ‘Timor’, que termina assim:
                    Estão tão longe de nós
                    Ou estão perto outra vez
                    Porque a sua triste voz
                    Ainda reza em português
                                (Percorri a Minha Terra, Cascais, 1993, p. 97).

      Essa poesia dita «popular» constitui, a meu ver, um dos filões da História nossa contemporânea, nomeadamente da História Local e Regional, a que importa dar atenção e quiçá não seja despiciendo que dela se faça doravante ponto de partida para  investigação mais aprofundada.
      Prendem-se estas reflexões com dois acontecimentos da minha infância que ora, passado mais de meio século, acabei por recordar em versos. Por isso, escrevi dois despretensiosos apontamentos, na certeza de que poderão suscitar algum interesse os temas a que se referem: a participação de soldados idos da Metrópole na defesa dos Açores por ocasião da II Grande Guerra e o descarrilamento do rápido do Algarve. Poderão ser lidos e comentados, respectivamente, neste blogue, em:
e