Até não há muito tempo, numa escavação, os arqueólogos recolhiam apenas os cacos mais significativos, nomeadamente aqueles que, pelo seu recorte, ainda poderiam – mediante cuidada reconstituição – vir a dar uma ideia da forma original. Analisava-se essa forma, que meticulosamente se comparava com outras conhecidas; fazia-se um exame da pasta, com vista a determinar possível origem quer da oficina quer do barreiro donde a matéria-prima proviera. Estranha actividade, esta, de facto, que se preocupa com os cacos que sobraram do vasilhame partido há já milénios atrás!...
É que esses cacos permitem observações de vida quotidiana; dão azo, inclusive, a razoáveis conjecturas sobre correntes comerciais…
Assim, na asa de uma ânfora, no fundo de um pratinho ou de uma lucerna… vê-se, por vezes, cartela resultante de impressão com uma espécie de sinete. Exacto: é a marca do oleiro! Não em cerâmica comum, de todos os dias, que essa não trazia dividendos sociais ou económicos e não carecia, pois, de publicidade veiculada por meio de assinatura; mas a cerâmica mais fina, de ir à mesa só de quando em vez, porque não?
Tal como hoje, em dia de particular relevância na família, decidimos ir ao armário da sala e fazer uso do ‘serviço’, aquele que já vem de nossos pais ou avós ou foi oferta de casamento, também em tempo de Romanos havia loiça especial para dias especiais!
E com essas marcas se deliciam os arqueólogos, na sua decifração, na comparação com outras achadas aqui e além! Geralmente rectangulares, podem ostentar a fórmula EX OF, que significa EX OF(icina), «da oficina», seguida do nome do proprietário em siglas ou pelo nome com que era habitualmente identificado.
Outras vezes, essa primeira parte subentende-se e fica apenas a identificação, nem sempre passível de uma interpretação única, porque… estamos fora do contexto e, sem contexto, torna-se difícil saber ao certo o nome que ali se pretendeu perpetuar.
Publicado no quinzenário Renascimento [Mangualde], nº 571, 01-06-2011, p. 13.
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