Por ter residido em Caxias, homenageou Jornal de Oeiras, na sua edição de 28 de Fevereiro, Igrejas Caeiro, «uma voz da Liberdade» (p. 5). Pôde ler-se, na entrada desse tocante depoimento de um dos amigos, José Manuel Marreiro, que o acompanhou nos últimos anos:
«Igrejas Caeiro até ao fim da vida demonstrou simpatia para com quem o rodeava, manifestando muitas vezes o que lhe custava já não poder fazer nada e os outros terem que fazer tudo».
Era, de facto, assim Igrejas Caeiro e ainda recordo a ‘festa’ que fez quando nos reencontrámos aqui há dois ou três anos, numa cerimónia. Aquele abraço amigo!
Igrejas Caeiro em Cascais
O meu primeiro «contacto» com Igrejas Caeiro aconteceu no ringue de patinagem de Cascais, num dos primeiros anos da década de 50, quando ali apresentou mais uma das sessões que o notabilizaram: «Os Companheiros da Alegria». Meus pais, que raramente iam a manifestações desse teor, não hesitaram em ir e levar-me, porque este programa de variedades detinha uma audiência extraordinária, graças também à inigualável simpatia de Igrejas Caeiro.
Viria a encontrá-lo já na década de 80, quando, no mandato de Helena Roseta (1983-1986), ficou a seu cargo o pelouro da Cultura. De imediato se criou entre nós uma grande empatia, facilitada, aliás também, pela amizade que ambos nutríamos pela então presidente. E foi Igrejas Caeiro quem, depois de Sousa Lara, continuaria a dar à Cultura maior visibilidade em Cascais, após o 25 de Abril.
Recordarei que foi no seu tempo que se criou e dinamizou a Comissão do Património Histórico-Cultural, a que presidiu, comissão constituída por individualidades (representantes de entidades ou a título particular pela sua competência) a quem na Câmara eram submetidos, para parecer, os projectos que se prendessem com o património cultural do concelho.
Para além do natural apoio ao Teatro Experimental de Cascais (ele que fora um homem do teatro), a Câmara comparticipou, logo em Julho de 1983, no Curso Livre de História, Geografia e Sociologia Locais, promovido, no Hotel Estoril-Sol, pela Sociedade Propaganda de Cascais. Hoje, iniciativas destas são vulgares; na altura, eram… pedradas no charco!
Também se vêem colecções de medalhas; desconhecer-se-á, porém, que foi em 1984 que a Câmara patrocinou uma colecção de seis medalhas de bronze (em estojo) intitulada Costa do Estoril Histórica e Monumental, com representação de seis dos mais característicos monumentos do concelho. E fez-se o primeiro guia de visita histórico-turística à vila de Cascais: Cascais, Guia para uma Visita (1983).
Prosseguiu a publicação da revista Arquivo de Cascais (nº 5, 1984), auspiciosamente iniciada ao tempo do seu antecessor, Sousa Lara; patrocinou-se a exposição «Cascais pelo olhar dos seus pintores», iniciativa do Jornal da Costa do Sol no Hotel Atlântico (Janeiro-Fevereiro de 1985).
No domínio da Arqueologia, diligenciou-se para que a gruta do Poço Velho viesse a ser aberta ao público (as inundações fariam abortar o projecto); apoiaram-se sem hesitação as operações de limpeza da villa romana do Alto do Cidreira, em Setembro de 1985, assim como o projecto de escavação do que viria a ser reconhecido como villa romana de Freiria (data desse mês a 1ª campanha).
Um testemunho e um desafio
Álvaro Ferreira – ajferreira74@gmail.com – teve oportunidade de divulgar ele próprio, no dia 22, um testemunho de que se me afigura interessante agora fazer-me eco.
Depois de se referir aos êxitos o folhetim humorístico "Zéquinha e Lelé" (de 1947 a 1948, com Vasco Santana e Irene Velez, sua mulher, na Emissora Nacional) e o já citado programa itinerante de variedades "Companheiros da Alegria" (de 1951 a 1954, para o Rádio Clube Português), dá Álvaro Ferreira particular realce à «impressionante série de entrevistas "Perfil de um Artista" (de 1954 a 1960, para o Rádio Clube Português), que contemplou 258 personalidades das artes e das letras portuguesas e estrangeiras (num total de 300 edições)». Considera, aliás, que esse será, sem dúvida, o seu «principal legado para a posteridade», pois se trata de um «acervo de inestimável valor histórico e documental», sendo «muito provável até que para algumas figuras da cultura portuguesa do século XX o único registo de voz que exista seja o desses fonogramas».
E acrescenta:
«Os registos (desconheço se todos – é bem possível que alguns tenham sido entretanto destruídos) estão soterrados e esquecidos sob o pó, no arquivo histórico da RDP. Ora o melhor tributo que a rádio pública pode prestar à memória de Igrejas Caeiro (e, bem assim, à dos seus eméritos entrevistados) é a transmissão de todas essas entrevistas».
Cá está uma excelente ideia!
Executivo fez um minuto de silêncio
Conforme se pode ler na minuta da acta da reunião camarária de 20 de Fevereiro, no primeiro ponto antes da ordem do dia, o Senhor Presidente evocou a memória de Igrejas Caeiro e lembrou que «também foi vereador nesta Câmara Municipal», acrescentando-se:
«A sua vida expandiu-se pela rádio, pelo teatro, pela televisão e pelo cinema, com especial destaque antes do 25 de Abril, tendo sido um cidadão empenhado na luta pela democracia»; «terminou propondo que a Câmara Municipal guardasse um minuto de silêncio em sua memória».
Nada mais se diz nessa minuta.
[Publicado no Jornal de Cascais, nº 305, 14-03-2012, p. 6].
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