‒
… Não é para ajudar as pessoas?
‒
É, sim, Rogério. Às vezes, têm dificuldade em acertar na ajuda, mas a ideia é
essa!
Claro
que eu não podia explicar-lhe que, no caso vertente, o objectivo da ‘caça à
multa’, certamente em obediência a ordens superiores, ‘falara’ mais alto do que
um aviso ou o simples papel de multa pespegado no pára-brisas – pois continuo a
acreditar que o agente policial também é uma pessoa, tem família, tem contas
para pagar e também ele se queixa do escasso vencimento que recebe…
Ora,
obedecendo a ordens ou por sua iniciativa, o agente, aí uma hora e meia antes, bloqueara
duas viaturas e eu vi-o a esperar que chegasse o reboque para levar o outro
carro parado ‘fora dos trilhos’. Se calhar, já pusera nesse dia em acção todos
os bloqueadores disponíveis. Boa safra!... Por sinal, olhando bem, o carrito até
nem incomodava ninguém; mas… estava ‘fora dos trilhos’! Em transgressão! E foi mesmo
esse carrinho que, de mãos na cabeça, com o ar mais espantado do mundo, a proprietária
se apercebeu que… desaparecera!
Saía
do parque, com uma filhota duns quatro aninhos, ao mesmo tempo que eu; era
estrangeira residente em Cascais, pelo que percebi. Entrou em pânico, não tinha
a menor ideia do que lhe poderia ter acontecido. Nada havia ali que lhe
dissesse como é que o carro sumira!... Expliquei-lhe:
‒
Seu carro, minha senhora, não foi roubado, não, esteja descansada: foi levado
pela Polícia Municipal.
‒
Mas como? Não impedia nada! Há quatro anos que venho aqui e nunca tal me
aconteceu!... E como faço agora?... Estão no carro todos os documentos, o telemóvel…
Não tenho como contactar ninguém!...
Foi
essa aflição e choro que assustaram o meu neto e o levaram a fazer-me a pergunta
acerca da verdadeira missão da polícia.
Ia
disponibilizar-lhe o meu telemóvel, quando nos apercebemos de dois jovens voluntários
ao serviço da autarquia. A senhora francesa explicou-lhes a situação. Eles
pegaram no telemóvel (creio que de serviço) e terão ajudado a resolver a
questão. Vou supor que sim, que resolveram, pois me apressei a retirar-me, a fim
de poupar meus netos a mais cenas que pudessem contribuir para dar da polícia
uma ideia ainda menos… aliciante. Tal não impediu, porém, o suspiro do Rogério,
quando chegámos junto do nosso carro:
‒
Que bom, avô! O nosso eles não bloquearam!
É
que o reboque, nessa manhã, circulava lentamente em torno da Parada, qual ave
de rapina a pairar nos céus à espera de incauta presa. O dia estava nublado, o
Parque Marechal Carmona apresentava-se como excelente alternativa para uma
horinha de lazer com as crianças e – a vida vai difícil para todos, inclusive para
os polícias (dizem!)… – bom seria se se pudessem poupar uns cêntimos e não os
gastar no parque explorado pela Cascais Próxima (sim, bem próxima anda ela, é
preciso cuidado!). Claro, neste episódio e noutros, os parcos euros do parque acabaram
por ser bué multiplicados pela pesada multa aplicada e, sobretudo, pelo enorme transtorno
causado. Terá sido preciso, por exemplo, chamar alguém ou ir a pé até ao parque
do Bairro do Rosário, para onde o carro fora rebocado.
Confesso
que tive muita pena da senhora, para mais acompanhada, como estava, de uma criancinha,
que não compreendeu porque é que o carro onde tinha deixado a boneca levara
descaminho num ápice. Felizmente que eu estava ali naquele momento para lhe dizer
que não fora roubo, não, senhora, fora reboque, que é uma outra espécie.
Assim
como tive pena dos donos dos carros de matrícula estrangeira. Não apenas destes
mas também dos donos dos que puseram os veículos no sítio certo e que, se o
bloqueio se mantivesse muito tempo, eles próprios seriam injustamente
prejudicados.
Em
casa, expliquei ao Rogério que havia um parque de estacionamento explorado pelo
patrão daqueles senhores, que precisava de dinheiro para pagar ordenados e que
tinha o parque precisamente para ganhar esse dinheiro. Lembras-te? Quando eras
mais pequeno, eu punha sempre o carro lá!...
Nós,
como cidadãos, continuei, poderemos sempre reclamar por o preço ser muito alto,
embora nada adiante. O avô, por exemplo, falou no assunto logo no início, propondo
a primeira hora gratuita. Ninguém lhe deu ouvidos. Eles é que mandam, Rogério! Eles
é que fazem as contas ‒ como nós fazemos as nossas e, por isso, agora que se
contam os cêntimos, só se não houver alternativa, é que pomos lá o carro!
Publicado em Costa do Sol – Jornal Regional dos Concelhos de Oeiras e Cascais,
nº 59, 03-09-2014, p. 6.
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