terça-feira, 16 de junho de 2015

As palavras… mágicas!

             Isto de nos esquecermos de viver o momento presente, o único que, afinal, nos é dado viver, como foi tema da nossa conversa há dias, torna-se deveras interessante. Um jogo de cabra-cega, diria.
            Os professores universitários, por exemplo, que dantes também eram investigadores, porque se lhes dava tempo para isso, passam seus dias a fazer relatórios e projectos. Ah! E a estudar as palavras milagrosas para que os taumaturgos que os leiam mais facilmente façam o milagre de lhes dar a sua bênção. Soube, outro dia, que palavra mágica, agora, é «interdisciplinaridade». Podes fazer os arrazoados que quiseres, tudo muito certinho de cabo a rabo; mas, se não houver lá, mais do que uma vez (de preferência), a palavra interdisciplinaridade, esquece: teu projecto ou teu relatório nem vai merecer atenção!
            Outra ideia-chave é «equipa». Sim, trabalho que se preze nunca é individual: é sempre em equipa! Eu cá admirava-me de uma comunicação de vinte minutos em reunião científica vir «assinada» por cinco ou mesmo por dez pessoas. E perguntava-me como. Cada uma escreveu três linhas? Lá me explicaram: é «equipa», menino! Mesmo que o texto só tenha sido redigido por um, como o trabalho resultou, necessariamente, de contribuições várias, tem de ser: toda a gente assina! E assim é que é válido para o currículo!
            Como – ficas também a saber – só conta para o currículo se escreveres em inglês; mesmo que seja assim mais ou menos atabalhoado, mas que se compreenda que a intenção é ser em inglês. E, depois, toma atenção, não dá jeito nenhum publicar em revistas nacionais, mesmo que seja na língua de Sua Majestade. Interessa-te é que seja em revista doutro país. Vamos lá ver se a gente se entende: tu tens a revista da tua instituição, mas não deves escrever nela; a tua revista é para os senhores da estranja, que assim vêem reabilitados os seus textos, porque publicados numa revista que não é do país deles. Tu não: tu tens mesmo de publicar lá fora!
            Assim, o clima eleitoral: o futuro, senhores, é que vai ser bom, porque nós vamos salvar o mundo! «Vamos»: o futuro. E… cadê o presente? Li numa tasca: «Tomorrow the beer is free!». Excelente ideia: amanhã, venho cá tomar um copo! Esqueci-me, porém, da outra frase (desculpe-me o leitor, mas isto do inglês é mesmo doença que se pega…): «Tomorrow never comes» – o amanhã… não existe!
                                                                    José d’Encarnação

Publicado em Renascimento (Mangualde), nº 664, 15-06-2015, p. 14.

28 comentários:

  1. O tempora o mores! y te recuerdo que la cita viene del Contra Verrem.

    ResponderEliminar
  2. Isto da interdisciplinaridade já é antigo ...e pelos vistos chegou com muitos anos de espera à Universidade! Nos tempos mais antigos anos 70 do séc. XX chamavam-lhe no então Ciclo Preparatório, Centro de Interesse" e então era ver as parvoeiras que se lá metiam pois todas as disciplinas tinham de lá jorrar o seu saber. Imaginem no Convento de Mafra...estão a ver a Matemática , a indicar que os meninos iriam medir a altura das colunas, ou quantos metros media a basílica??? Pois era a interdisciplinaridade...os professores e os alunos assim trabalhavam "bem"!!!

    ResponderEliminar
  3. Mais um texto delicioso e sempre atual. Bj (Susana Bailarim)

    ResponderEliminar
  4. Caríssimo Professor José d'Encarnação, cá lhe deixo o meu abraço solidário, pelo meio destes destemperos hodiernos. E, veja lá bem, amanhã mesmo, por estas e outras, irei frequentar um curso interno de «gestão de stress», para o qual me foram elucidando que me devo deixar absorver pelo conceito de «mindfullness», sob pena de a bruxaria não funcionar... Como imaginará, logo vou eu já cheio de stress mas de espírito completamente «mindfullness».
    Isto não há chão desta terra de onde, aparentemente, estas abróteas não medrem, seja para ditames de cânones para relatório científico, seja para palpites abstrusos quanto à arte de bem se sentar um homem numa cadeira...
    Entretanto, espera-se sempre que «isto» mude e lá se faz algo para empurrar a mudança. Grande abraço.

    ResponderEliminar

  5. ________________________________________
    De: Manuel Martin-Bueno [mailto:mmartin@unizar.es]
    Enviada em: quarta-feira, 17 de Junho de 2015 16:29
    Para: José d'Encarnação
    Assunto: Re: Um texto de opinião

    Muy oportunas tus palabras amigo José.

    Creo que es un auténtico disparate, tanto la obligación de escribir en inglés muchos artículos de temas que no interesan, o muy poco, al publico anglosajón, como la de firmar un artículo por un número alto de personas, que como bien dices no se justifica por la circunstancia de que de se ha hecho en "equipo". El equipo sirve para proyectos globales, para informes, a veces, pero no para publicaciones científicas que deben estar firmadas, avaladas por pocas firmas, a ser posible individuales y por lo tanto poder conocer directamente al responsable de lo que se escribe. Otra cosa es que figure abajo, en la primera nota a pie de página la lista de los integrantes de tal o cual estudio o de tal o cual campaña de excavaciones o experimento, eso siempre se ha hecho, o debía hacerse, así.

    Estamos en un contexto de gestión de la ciencia (ciencias o letras no importa) en el que los aspectos secundarios se convierten en fundamentales y en el que los investigadores deben emplear su tiempo en cuestiones administrativas y no en aquellas para las que están o deben estar debidamente preparados.

    Hablar de cuestiones de poblamiento antiguo de un rincón de la Península Ibérica, debe interesar en un principio a los propios pobladores de la zona, para que conozcan su pasado, para que lo valoren y para que así defiendan su cultura y los restos patrimoniales que haya dejado. Con ese planteamiento que es básico, publicar los resultados de esa investigación en una revista ajena a nuestra zona, generalmente alejada cultural y geográficamente y además en la lengua de "Su Graciosa Majestad" es un sinsentido, propio de un neocolonialismo científico y cultural, de un papanatismo sin paliativos o de las dos cosas a la vez.

    La creación de redes de amistades, para "yo te publico, tu me publicas", "yo te valoro, tu me valoras", etc., es volver al clientelismo mas repugnante, que no solo se observa en las publicaciones, consejos de redacción de las revistas, congresos y ciclos de conferencias. Todo ello sirve en pro de los nuevos sistemas de evaluación y clasificación científica, pero no quiere decir, ni que sean los mas adecuados, ni los más justos, ni siquiera los mas eficaces.

    Decididamente, estamos volviéndonos locos y afortunadamente nosotros, los seniors ya tenemos poco tiempo para caer en esa locura colectiva, !Resistamos¡, Resistir es vencer.

    Un abrazo


    Manuel Martín-Bueno

    ResponderEliminar
  6. De: Jean-Pierre Bost
    quarta-feira, 17 de Junho de 2015 11:22

    Bravo, cher José, pour cet édito de bon sens. Rassure-toi, la maladie de l’interdisciplinarité et de l’équipe sévit partout ; quant à l’anglais, on le trouve aujourd’hui jusque dans des endroits inattendus come les appels à projet pour l’Agence nationale française de la Recherche, en France, pour des projets français ! Heureusement, tant que le bacalhau restera portugais et le fois gras, français, nous aurons de quoi nous consoler.
    Amitiés, JP

    ResponderEliminar
  7. maria helena coelho
    quarta-feira, 17 de Junho de 2015 11:09

    Como sempre, gostei do teu texto sobre as universidades e as exigências de hoje - palavras mágicas, equipa, inglês, publicar fora. Tudo isso e muito mais faz parte do reino da estupidez em que vivemos.

    ResponderEliminar

  8. De: Saul Gomes [mailto:sagcs@fl.uc.pt]
    quarta-feira, 17 de Junho de 2015 11:07
    Gostei muito do seu texto.

    ResponderEliminar
  9. De: Alain Tranoy [mailto:alain.tranoy1@orange.fr]
    quarta-feira, 17 de Junho de 2015 10:57

    c'est un peu la logique et la règle des publications des sciences dites dures (les nôtres seraient-elles molles?!!!) Isabelle ne publie qu' à plusieurs et en anglais et la plupart du temps dans des revues étrangères!

    ResponderEliminar
  10. De: Manuel Ramírez Sánchez [mailto:manuel.ramirez@ulpgc.es]
    quarta-feira, 17 de Junho de 2015 10:54
    Felicidades por el texto en tu blog, José.
    En efecto, esto ha cambiado mucho en las últimas décadas, pero al menos en España, los cambios han sido vertiginosos desde 2002, con la entrada en vigor de la nueva ley de universidades y la agencia nacional de acreditación del profesorado.

    ResponderEliminar
  11. De: Patrick Le Roux
    quarta-feira, 17 de Junho de 2015 10:43

    C'est ainsi depuis déjà quelque temps. H. Curien ministre de Mitterrand en 1982 demandait : pourquoi Dieu n'est-il jamais entré au CNRS ?
    Sa réponse :
    1 : il a fait une expérience et une seule que personne n'a jamais pu reproduire !
    2 : il n'a jamais travaillé en équipe !
    3: Il n'a jamais publié en anglais !

    Nunc est bibendum !
    Patrick

    ResponderEliminar
  12. De: Cinzia Vismara
    quarta-feira, 17 de Junho de 2015 10:26
    Altre due parole magiche: valutazione (MAI
    sulla qualità, ma su una serie di parametri - citazioni etc - dei medici
    e degli ingegneri...) e internazionalizzazione (l'importante è avere
    almeno una persona, anche se minus habens, nel gruppo di lavoro).

    ResponderEliminar
  13. ________________________________________
    De: Angela Donati
    quarta-feira, 17 de Junho de 2015 11:10

    Bellissime le tue parole magiche, e pienamente condivise (almeno da me, ma ... siamo vecchi)
    Angela

    ResponderEliminar
  14. De: Afonso Cunha
    Quarta-feira, 17 de Junho de 2015 11:29
    Saudações
    Palmas e mais palmas.
    Excelente análise.
    Parabéns!

    ResponderEliminar
  15. ________________________________________
    De: Helena Gimeno [
    quarta-feira, 17 de Junho de 2015 11:57

    Tive os dois minutos! Cuánta razón tienes.

    ResponderEliminar

  16. ________________________________________
    De: Maria Antonia Lopes
    quarta-feira, 17 de Junho de 2015 14:37

    Uma delícia! E na "mouche". Ups… :( Na "fly", claro.

    ResponderEliminar
  17. De: EUGENIO RAMON LUJAN MARTINEZ
    quarta-feira, 17 de Junho de 2015 17:21
    Muy acertadas consideraciones, querido José.
    Eugenio R. Luján
    Decano
    Facultad de Filología
    Universidad Complutense de Madrid

    ResponderEliminar
  18. De: Maria Manuel Valagao
    quarta-feira, 17 de Junho de 2015 17:36
    Concordo plenamente com a tua análise destes sinais dos tempos...
    MM

    ResponderEliminar
  19. ________________________________________
    De: cyberjornal Redacção
    quarta-feira, 17 de Junho de 2015 18:56
    Esperemos que o amanhã seja diferente...
    É bem verdade. Tenho uma amiga que andou a bater a todas as portas para lhe publicarem um texto (Sociologia) numa revista estrangeira.

    ResponderEliminar
  20. Agradeço, desde já, a quantos, de variados quadrantes, como se vê, tiveram a gentileza de me ler e, sobretudo, de me fazer chegar o seu comentário. Está, creio, nas nossas mãos, pugnar para que este paradigma se altere.

    ResponderEliminar
  21. vasco mantas
    quinta-feira, 18 de Junho de 2015 11:55
    Totalmente de acordo com a opinião de Manuel Martin-Bueno.
    A sociedade contemporânea, esta a que nos calhou assistir à fase de perversidade camuflada - ou não - e de falsos progressos sociais e morais procura disfarçar com infantilidades e exigências absurdas a total impotência perante os verdadeiros problemas do tempo.
    Um abraço a todos os que sentem o mesmo e um alerta para os que pensam o contrário. Os pratos de lentilhas pagam-se caros.
    Como muitos, não penso que "a minha Pátria é a Língua Portuguesa", pois não vejo na Língua a forma de uma falsa identidade nacional, já desprovida de outros valores essenciais e, ela própria, esmagada por exigências linguísticas (e ortográficas, já agora...) absurdas.
    Vasco Gil Mantas

    ResponderEliminar
  22. ________________________________________
    Angel Urban
    quarta-feira, 17 de Junho de 2015 18:09

    Querido José: he leído tu “As palabras mágicas”. Complimenti!!!! Estoy de acuerdo contigo. Podríamos añadir un montón de palabras más. Una de ellas, la tan cacareada “innovación”: una de las palabras más etéreas y venenosas que se nos están colando en todo el zoo universitario y que producen más montañas de papeles que auténticos resultados. En fin, empezamos a tener nostalgia de cuando, como tú bien dices, “los profesores universitarios eran también investigadores...”

    ResponderEliminar
  23. Ana Teresa
    17/6 às 23:09
    Professor, ainda hoje estou convencida que tive tão boa nota na tese por ter usado e abusado dessa palavra. Ainda por cima tive uma cadeira que versava esse tema chamada Introdução ao Pensamento Contemporâneo cuja palavra chave era pluri-inter-trans-disciplinaridade

    ResponderEliminar
  24. Claudia Beltrão [Rio de Janeiro]
    quinta-feira, 18 de Junho de 2015 00:11
    Aqui, do outro lado do Atlântico, vivemos o mesmo... e a correria, inimiga da reflexão, é regra geral.

    ResponderEliminar
  25. De: Antonio Sartori
    quarta-feira, 17 de Junho de 2015 21:25

    Caro José,
    volentieri rispondo al tuo ‘grido di dolore’ o meglio ‘grido di protesta’.
    Ho avuto qualche difficoltà nella comprensione di alcune finezze linguistiche, ma il senso complessivo e profondo è chiaro.
    Sono quasi in tutto d’accordo: e questo significa che siamo entrambi ‘sorpassati’, ‘jurassic magistri’.
    O meglio, nell’uso delle formule magiche ora di moda siamo sorpassati. Nelle nostre abitudini di lavoro, no, non siamo sorpassati.
    Interdisciplinarità? Va bene, io la posso anche praticare, purchè non sia un obbligo, e una magica panacea per sanare tutti i mali, per risolvere tutti i problemi.
    Lavoro in équipe? Può essere utile talvolta. Ma è inutile e dannoso quando è un obbligo: in équipe si possono raggiungere buoni risultati nella ricerca, ma le conclusioni e le ‘invenzioni’ sono di uno solo, magari del ‘leader’ di una équipe, non imposto per regolamento, ma creato spontaneamente.
    Pubblicare altrove e non a casa propria? Può essere interessante per confrontare le idee o per stabilire nuovi contatti (oggi si stampa troppo e si legge poco!); ma se diventa obbligatorio è dispersivo: e i risultati di una scuola, come e dove finiscono?
    Inglese sì, inglese no: inutile parlarne, per me è un falso problema. Perché l’inglese lingua franca per tutti? Una volta era l’italiano: male anche quello. Poi è stato il momento del francese, omaggio ai grandi risultati della grande scuola francese: male anche quello. Ora l’inglese, perchè è una novità, chi lo usa si sente subito alla moda e internazionale: male anche quello, anzi peggio!
    Tornare ciascuno alla propria lingua? Meglio di tutto (per non parlare del latino, forse un po’ troppo demodé).
    Ti comunico una grande novità: in Italia in molte università si tengono corsi solo in inglese; ma ora l’università di Pisa per la prima impone agli studenti degli ultimi anni un corso di ‘scrittura’ e uno di ‘sintassi della frase (!)’, perché… i laureandi non sanno più scrivere una tesi di laurea in lingua italiana corretta!
    Forse non siamo ancora completamente sorpassati. Anche noi abbiamo un radioso… futuro alle spalle.
    Un carissimo saluto e un invito a lavorare sempre come sappiamo,
    Antonio

    ResponderEliminar
  26. De: Maria Isabel Velazquez Soriano]
    sexta-feira, 19 de Junho de 2015 11:49

    Querido amigo:
    Me sumo a los comentarios que ha habido estos días de ilustres colegas. Estoy de acuerdo con la irritación que sentimos muchos contra esta tiranía de las nuevas directrices de calidad. Podría argumentarlo además con datos muy concretos, habida cuenta de mi experiencia en la gestión de este tipo de sistemas en España.
    Recuerdo las palabras de Tacito (Agric.): Dum singuli pugnant, universi vincuntur.
    Deberíamos de habernos puesto de acuerdo todos para oponernos a esta situación y a este sistema que parte, además, de un mundo ajeno a nosotros y que nos han impuesto, bien es verdad que con la anuencia de muchos de nosotros.
    Tal vez aún estemos a tiempo de hacer oír la voz de tanto descontento, a través de unirnos a mensajes como el que ahora envías.
    Un abrazo cordial,
    Isabel Velázquez
    Catedrática de Filología Latina
    Universidad Complutense de Madrid

    ResponderEliminar
  27. Fantástico artículo. Muchas gracias.
    Cuánta razón, por lástima, para las lenguas que tanto lucharon antaño por tener un espacio en contextos científicos.
    Lo mismo ocurre en España...
    Abrazos y muchas gracias

    ResponderEliminar
  28. Junto a minha voz às muitas que exprimem o seu repúdio pelo uso e abuso do inglês como língua da ciência. é um hábito ainda muito enraizado nas ditas ciências exatas que não vejo como erradicar. Abraço

    ResponderEliminar