segunda-feira, 4 de abril de 2022

A bandeira

               Desde muito pequeno que ouvia meu pai trautear «Se eu morrer nesta batalha, eu quero ter por mortalha a bandeira nacional». Soube, mais tarde, que eram versos do Fado das Trincheiras, imortalizado por Fernando Farinha.
            Impressionou-me, na instrução primária, a história de Duarte de Almeida, cognominado «O Decepado», por, na batalha de Toro, travada a 1 de Março de 1476 entre el-rei D. Afonso V e as tropas dos Reis Católicos, sendo porta-estandarte, ter defendido a nossa bandeira, mesmo depois de os inimigos lhe haverem decepado as mãos, segurando-a com os cotos em sangue e com os dentes, possibilitando assim que um companheiro de armas, Gonçalo Pires Bandeira, a viesse recuperar. Fiquei a saber quanto valia a bandeira. E ainda não ouvira o Paulo de Carvalho: «Os meninos à volta da fogueira vão aprender como se ganha uma bandeira, vão saber o que custou a liberdade»…
            Fui-me habituando a assistir à solenidade do içar da bandeira e, recentemente, já tive a honra de ser eu próprio a içar uma em cerimónias solenes ou, por exemplo, num jantar de Lions ou do Rotary de ser um dos chamados para ‘saudar a bandeira’.
            Também eu jurei bandeira, solenemente, após a recruta na Escola Prática de Infantaria de Mafra, em 1970.
E se oiço amiúde falar da necessidade de a TAP continuar a ser uma «companhia de bandeira» e gosto de «rir a bandeiras despregadas», o certo é que, nos últimos tempos, a bandeira acabou por ganhar para mim um significado maior, quando os nossos atletas choravam de emoção, ao verem a sua/nossa bandeira subir no mastro, porque eles haviam logrado ocupar um lugar no pódio.
«Irei partir. Dia 18 de Outubro levarei um cachecol de Portugal ao pescoço e uma bandeira na bagagem de mão. Levarei a Pátria para outra Pátria, levarei para outro país a excelência do que todas as pessoas me deram» – é uma passagem da «carta de despedida à Presidência da República» do enfermeiro Pedro Marques, no momento de emigrar «para o Reino Unido numa viagem só de ida». Emocionou-me.
Como me emociona, hoje, o ‘casamento’ da nossa bandeira com as cores azul e amarela da bandeira duma Ucrânia dilacerada. Mais do que um símbolo é uma identidade que, a todo o custo, queremos preservar. Aqui, além, em todo o lugar! De todos os lugares! 
 
                                                                José d’Encarnação

Publicado em Renascimento [Mangualde], nº 819, 01-04-2022, p. 12.

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