Recordo, amiúde, a resposta dada por um recluso, em vésperas de Natal, a Luís Represas, no decorrer de uma visita ao estabelecimento prisional:
‒ A primeira coisa que eu vou fazer quando sair daqui? A primeira coisa, Luís, é ir ver o mar!
Para quantos, como é o meu caso, sempre vivemos à beira-mar, no tremendo privilégio de ouvir, em noites de tempestade, o bramir das ondas contra os rochedos e o ronco angustiante dos faróis… estar algum tempo longe dessa vastidão arrasta saudade. A possibilidade ímpar de um alaranjado pôr-do-sol, a ver as longas e rápidas filas negras de patos rentinhos à água em demanda de lugar para a pernoita…
Pensei nisso tudo quando tive a notícia, bem propalada na Comunicação Social, de que Mangualde ia ter praia artificial, possivelmente já disponível a partir do Verão. Achei a iniciativa genial e logo supus que de pronto se levantariam vozes cépticas, algum sarcasmo, agoiros de mocho em noite sem lua…
Do litoral onde vivo tenho demandado ultimamente terras várias no interior do País. E o sentimento que me assalta é cada vez maior: vive-se bem aí; os municípios têm apostado largamente no bem-estar da população, na criação de pontos de encontro, amplos jardins, esplanadas, até ruas pedonais, bibliotecas novas e bem arejadas, auditórios e salas de exposições, museus a pedir meças aos de Lisboa que, frequentemente, não atam nem desatam, alvo predilecto, como são, das quezílias partidárias e governamentais…
Tem-se melhorado a oferta de alojamento; os restaurantes primam pelo preciosismo de uma decoração tradicional e, claro, da culinária típica. O turismo em espaço rural ganha adeptos; um projecto como o de Póvoa Dão, a conhecida aldeia rural recuperada na freguesia de Silgueiros (Viseu), deliciou-me e, se todos quisermos, outros exemplos idênticos poderão surgir.
Sim, apetece ouvir o mar, alongar os olhos pela sua vastidão imensa; mas é também no aconchego da ruralidade, no saborear de um naco ainda quente de pão trigueiro que a alma se nos reconforta e ganha serenidade…
Publicado no quinzenário de Mangualde, Renascimento, nº 567, 01-04-2011, p. 13.
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