Perplexidades
Perante o rol imenso de desgraças e de injustiças com que diariamente se depara, a nível nacional e internacional, e que nunca lhe passariam pela cabeça, o jornalista local até hesita em chamar a atenção para o buraco da rua, a lâmpada fundida, o autocarro que não cumpre horários, o parque de estacionamento de preço exagerado… Que é isso em comparação com o inaudito desespero de quantos nem uma negra côdea de pão têm para a boca?!...
Esquisitices
O caso – contado por fonte fidedigna – não se passa em Cascais, mas numa delegação do Banco Alimentar algures em Portugal: a roupa amontoa-se, porque os ‘necessitados’ são esquisitos na escolha e nem tudo lhes serve! E, do cabaz de alimentos recebido, logo mais adiante há quem deite pró contentor ou para a valeta os pacotes que não lhe interessam!
Comentários
18 de Outubro, RDP 1, programa da manhã. Não perdi o apetite para o pequeno-almoço, porque, hoje, é necessário viver um minuto de cada vez; contudo, as perspectivas de futuro que os noticiários nos apresentaram eram sombrias de mais!...
Aliás, na sequência do que muitos estamos a dizer há algum tempo, continua a apetecer perguntar: «Porque é que só se dá relevo à desgraça?».
Números
De novo, Mário Soares. Escalpelizou: importa tratar as pessoas como pessoas e não como números!
Há quanto tempo dizemos isso? E porque é que os que mandam tanto o esquecem? Não sabem que números não são susceptíveis de motivação nem de brio?
E, oportunamente, os publicitários aproveitam:
«Para nós, César não é um número. Ele é o pai babado da Sofia».
Oxalá assim fosse!
Terramotos
Nunca de tal me apercebera realmente; todavia, sempre que se fala em terramotos, vem, na verdade, à memória dos mais velhos, a madrugada de 28 de Fevereiro de 1969, quando Portugal foi sacudido por um sismo que, no seu epicentro, atingiu o grau 7,8 da escala de Richter.
Curioso verificar também que essa recordação está tão viva que o já aqui referido Rogério Pires de Carvalho o não esquece no livro Alenterra, quando evoca a sua estada em Lisboa. Igualmente José Manuel de Azevedo e Silva – exactamente, esse que foi o único ferido com certa gravidade da explosão no Cais-do-Sodré, a 28 de Maio de 1961, hoje professor universitário aposentado –, a essa ocorrência se refere na sua autobiografia, Passos e ‘Passas’ de uma Vida (p. 65-68); encontrava-se, na altura, a prestar serviço como agente da PSP na Parede.
Paulo Ossião
Seguramente, um dos nossos melhores aguarelistas em actividade. Tonalidades ténues, manchas cromáticas palpitantes, olhar perspicaz sobre os ângulos bonitos da realidade circundante.
Desde o passado dia 22 até 21 de Novembro, na galeria do Casino Estoril: «A minha Lisboa 30 anos depois». Magnífica! Uma cidade em tons de azul, a sinfonia dos telhados envoltos em neblina de aconchego. E pessoas! Pessoas à conversa na esplanada, a tagarelar nas janelas… Pessoas! Lisboa, afinal, humanizada!...
A não perder – que a cidade, assim, até a sentimos mais nossa!
Maria Helena Ventura
Munícipe de Cascais (vive entre nós há bastantes anos), Maria Helena Ventura tem-se notabilizado por uma escrita resultante de bem amadurecida investigação. Com um pé na ficção e outro na História, brindou-nos já com obras notáveis como, entre outras, Afonso, o Conquistador, evocação de D. Afonso Henriques (Março 2007); Onde vais, Isabel, a história da Rainha Santa Isabel (Março 2008); Um Homem Só, a sua visão da vida de Jesus Cristo (Maio 2010)…
O seu último trabalho, Cidadão Orson Welles (Março 2011, Edições Saída de Emergência, editora que a tem acompanhado), constitui eloquente forma de contar a biografia do controverso realizador. Esbelta tunisina apaixonada pela sua figura de criador e de Homem ousa interpor-se-lhe no caminho. Nasce daí acalorada paixão mantida secreta, miudamente narrada, psicologicamente densa, pretexto também para nos levar a passear pela Roma Eterna e seus infinitos recantos, por Florença, Paris e, até, no retorno à Tunísia do Museu do Bardo e do inesquecível oásis de Gabes…
Uma viagem cativante, mesmo quando se imagina o soar de «rajadas de vento à porta de uma cidade abandonada» (p. 115) ou só apetece «fundir as lágrimas nas águas do Tibre» e se anseia por que «as noites se fechem com o rótulo da esperança» (p. 19).
[Publicado no Jornal de Cascais, nº 287, 26-10-2011, p. 4].
Olá prezado Colega e Amigo José d'Encarnação
ResponderEliminarFazem-nos meditar as perplexidades das "andarilhanças 21", nomeadamente ao sabermos que, numa Delegação do Banco Alimentar em Portugal, «a roupa amontoa-se, porque os "necessitados" são esquisitos na escolha e nem tudo lhes serve! E, do cabaz de alimentos recebido, logo mais adiante há quem deite pró contentor ou para a valeta os pacotes que não lhe interessam!».
Obrigado pela referência ao meu "Passos e Passas de uma Vida",a alusão à bomba que me atingiu gravemente na Estação do Cais do Sodré, no dia 28 de Maio de 1961 e à minha recordação do violento terramoto que sacudiu Portugal, na madrugada de 28 de Fevereiro de 1969 (7,8 na escala de Richter no epicentro).
José Azevedo e Silva
Professor Universitário Jubilado