Está
a ouvir-se bastante esta palavra ‘retiro’.
No
tempo da minha formação, ‘retiro’ significava a semana em que um grupo de
jovens, devidamente orientado, se retirava para um lugar isolado – amiúde, um
convento ou mesmo uma ‘casa de retiros’ – para, em reflexão, pensar no seu modo
de vida e na forma de o melhorar e mais confortavelmente corresponder ao que
almejavam ser os objectivos das suas vidas.
Ouvi-a,
há dias, no programa do Herman: Cuca Roseta preparava-se para ir fazer um
retiro na Índia. O Oriente, berço de religiões como o Budismo, o Bramanismo…
parâmetros de vida em que se privilegia o autodomínio, o pensamento
disciplinado a disciplinar os nossos gestos e emoções.
O
Prof. José Mattoso, após uma vida bem activa de historiador, antecedida, como
foi, da reclusão monástica, retirou-se para uma aldeia perdida nos arredores de
Mértola. Meu amigo e colega João Roque, aposentação chegada, regressou à terra
natal, Calvos, bem no interior beirão, para viver o contacto diário com a
Natureza e a agricultura – e desse gozo nos dá conta nas suas crónicas.
Soube o imperador romano Augusto, no século I, rodear-se de poetas para lhe amenizarem as dores da governação. E lá esteve Ovídio, por exemplo, a cantar as delícias do campo, mezinha segura contra as irrequietas maleitas urbanas. No século IV, isso compreenderam melhor os cidadãos romanos e deram em refugiar-se nas suas casas de campo, as villae, bem adornadas de mosaicos com requintadas cenas da mitologia antiga para lhes dar recreação e redobrada atenção aos agrícolas lavores. Muito mais tarde, não foi ao seu retiro de Vila Viçosa que os conjurados de 1640 tiveram de ir buscar o Duque de Bragança, que aí procurava pôr em prática o que D. Francisco Rodrigues Lobo preconizara no seu livro A Corte na Aldeia, publicado em 1619?
E não estão
agora de moda, nas televisões, os programas a mostrar famílias que decidiram
aproveitar os campos de seus antepassados e aí cultivarem, aperfeiçoando
procedimentos ancestrais, não apenas o que era habitual mas também produtos
inovadores? E não se mostram imagens serenas desse novo viver, em que não falta
uma carícia aos animais que, serenamente, ali com os humanos agora convivem? E
há um lento passeio de burro ou a caminhada logo pela manhã ou quase ao sol-pôr
a ganhar forças ou a sorver, a longos haustos, a pureza de um ar despoluído…
José
d’Encarnação
Publicado no jornal Renascimento (Mangualde), nº 871, 15-11-2024, p. 10.
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