quarta-feira, 23 de junho de 2021

A ver se a gente se entende…

               O estudante, acabado o curso, interrogava-me: «E agora, professor?». E eu perguntava-lhe o que ele queria fazer na vida.
            – Gerir uma sapataria?... Então, começa a olhar para as lojas, lê tudo o que encontres sobre isso, interroga-te sobre o que poderias melhorar, oferece-te para estagiar gratuitamente numa loja.
         – Ser jornalista de cultura? Vai a todos os eventos culturais que possas: inauguração de exposições, conferências, concertos… Observa como se organizam, que documentação é dada, que aspectos são deveras interessantes… Há uma recepção antes? Não hesites em pegar no teu copo e, se adregar meteres conversa com alguém, não deixes de o fazer.. Serenamente, faz-te conhecido, sem te pores, no entanto, em bicos de pés. E se aproveitares para fazer uma nota de reportagem e enviares, como quem não quer a coisa, para um jornal local?
            – Queres ser arqueólogo? Então, lê tudo o que puderes sobre esses temas, candidata-te a integrar uma equipa de escavações…
            Importante: não queiras assentar praça em general, que os que hoje vês em lugares cimeiros passaram as passinhas do Algarve para chegarem onde estão, salvo mui raras excepções! Sim, se for necessário ires para caixa dum supermercado, vai, que não te caem os parentes na lama e já viste a quantidade de pessoas que vão passar a contactar-te diariamente? Pode muito bem ser que, entre essas, haja uma que goste da tua maneira de ser. E se fores um bom caixa, se souberes sorrir, quem sabe?...
            Um dos lugares mais importantes na época romana eram as termas. Não fundamentalmente por as pessoas necessitarem de tomar banhos, mas porque as termas tinham um espaço destinado à troca de impressões e muitas das iniciativas, a todos os níveis, eram preparadas aí, pois os Romanos sabiam unir o «otium» ao «negotium»!
            Portanto, qual a razão do título desta crónica aqui e agora?
Eu explico.
É que vamos entrar em campanha eleitoral para as autarquias. E, já que o não souberam fazer no decurso do seu mandato, todos os já eleitos – e os que, porventura, sonham em (re)candidatar-se – não deveriam, a meu ver, desaproveitar todas as ocasiões para serem conhecidos. «A iniciativa é do partido que ganhou e eu não estou para lhe dar brilho!» - Errado! Primeiro, porque a iniciativa é do Executivo e não dum partido e, por sinal, até se integra na defesa do património, no fomento do bem-estar dos munícipes – e não foi isso que tu também incluíste no teu programa eleitoral? Depois, estando presente, melhor verificas o que corre bem e o que corre menos bem e o que, se fores tu a programar, poderás vir a fazer melhor.
            E vou ao fundo da questão que me levou a este desabafo. Com toda a franqueza e não por ser a minha associação uma das promotoras, com o Município, das cerimónias, que até correram bastante bem (congratulo-me), evocativas de Camões. É que procurei, entre a multidão, os eleitos pela «oposição» – e não os vi (com excepção da Junta de Freguesia de S. Domingos de Rana, que sempre teve outra posição). Como habitualmente não estão (se não erro) em outras iniciativas camarárias – e que, por serem ‘camarárias’, de todos são, acho eu! A ver se a gente se entende!...
            Lá diz o Povo: «Quem não aparece esquece!».

                                                      José d’Encarnação

Publicado em Costa do Sol Jornal (Cascais), nº 335, 2021-06-23, p. 6.

1 comentário:

  1. Há uma perversa confusão entre ideologia e clubite que, em minha modesta opinião, não serve a ninguém ou, pelo menos, aos munícipes não serve. Mas será que estamos em presença da aplicação do provérbio segundo o qual «burro velho não toma andadura»? Ou vamos a tempo de que todos os eleitos, com mais ou menos votos, interiorizem e assumam que a «res publica» é muito mais do que um palco de vaidades e protagonismos?

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