sábado, 4 de janeiro de 2020

Um ninho à minha porta!


Periquito junto ao Ribeiro do Cobre
Vivo num bairro periférico de Cascais. Ainda temos pinheiros mansos e bravos por perto; os leitos dos dois ribeiros que o limitam a nascente e a poente estão arborizados e constituem, por isso, nichos ecológicos para uma boa porção de aves. Há dias, vi por lá, quase a desafiar-me com os seus gorjeios, o casal de uma espécie de periquitos, tropical; e voltei a admirar, quase ao lusco-fusco, o voltear rápido de um pequeno bando de morcegos. Encantou-me ver o ninho de carriça à minha porta, no refego da varanda; os dois de melros no ficus frondoso e um de felosa preta (creio) na romãzeira. Rejubilo ao acordar com o assobio dos melros e o arrufo das rolas. Estranho quando, à hora do almoço, não vejo aparecer o pardal e o fuinho a debicarem no pitósporo e na buganvília. Hoje, o Pedro, o jardineiro, fez questão em deixar bem aconchegadas as folhas da iuca «para que haja ali ninhos»…
Rolieiro-de-peito-lilás (foto de J. Paiva)
            E chegou-me o cartão de boas festas do Professor Jorge Paiva. O 30º. A lançar a dúvida: «Não sei se continuarei». Aliás, continua, «Já deixei de escrever sobnre problemas ambientais, pois os leitores que me interessava que os lessem não o fazem (governantes, deputados, políticos e juventude)». Estas frases vêm numa folhita solta. O texto fundamental, a mensagem de Natal, tem por título «A inversão das biodiversidades; urbana e rural». Por isso, eu comecei como comecei esta crónica. É que o Professor Jorge Paiva aí explica tintim por tintim o que está a acontecer. Porque é que, por exemplo, eu vi raposas a passearem-se tranquilamente num dos jardins urbanos de Londres e, a 8 de Janeiro de 2018, ele próprio viu uma fêmea de javali a passear-se, manhã cedo, na rua onde mora em Coimbra.
            Muito simples: «A agricultura intensiva implicou o derrube de grande número de árvores e a poluição química dos campos, o que provocou uma diminuição drástica do número de insectos, vermes, pequenos mamíferos e respectivos predadores. Assim, muitos animais procuraram refúgio e alimentação nos espaços verdes urbanos».
            Eu estava encantado com a convivência que tinha com as aves. Continuarei encantado; mas vou começar a explicar tudo melhor aos meus vizinhos e amigos.

                                                           José d’Encarnação

Publicado em Renascimento (Mangualde), nº 768, 2020-01-01, p. 12.
Esquilo, na cidade de Londres, abocanhando o petisco que da janela lhe foi dado.

7 comentários:

  1. Tudo está em mudança e os animais todos procuram adaptar-se à destruição do seu habitat natural pela errada acção humana. Mas, como este lindo texto sugere, não deixa de ser um privilégio receber, nas proximidades de casa, nos jardins públicos e privados, a visita de pássaros exóticos que juntam os seus gorjeios ao dos melros. Parabéns e um abraço.

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  2. Partilho a sua «perplexidade agradada», chamemos-lhe assim, caro Professor. Cá por casa vão aparecendo passarocos os mais diversos que se vão afeiçoando no pequeno espaço verde de que dispomos. Até já colocámos um comedouro - assumidamente contra-natura - que tem proporcionado apoio no sustento em períodos de nidificação. Um só casal de pardais presenteou-nos, assim, com três ninhadas no ano passado. Para não falar dos melros, dos rabirruivos e, até, de um ou outro gaio. E todos foram à vida deles... mas já arribaram uns quantos, há poucos dias, estranhando o comedouro vazio. E vamos continuando a fornecer-lhes os restos do pão desfeitos, uns quantos grão de arroz, alguns grãos adquiridos na feira. Claro que isto não é muito defensável e sabemos estar a perturbar o ciclo natural. Mas também é verdade que chegámos a contar, de uma só vez, 14 pardalitos, alguns ainda alimentados pelos pais, em volta do tal comedouro. E tudo está fotograficamente documentado. Tenho para mim que a Mãe Natureza não ficou muito incomodada nem zangada connosco. Grande abraço.

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    1. Bem haja, Amigo Jorge, pelo oportuno comentário esclarecedor. Não, a Mãe Natureza não ficou zangada, não!

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  3. Vera Araújo Soares
    4 de janeiro às 18:53
    Por aqui os papagaios australianos são imensos! Então no jardim do António Pedro são o máximo: limpam a romãzeira e as amoreiras!

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  4. Eduardo da Naia Marques
    sábado, 4 de Janeiro de 2020 20:18

    Estava prevista a procura de outro “ambiente de vida” por parte dessas espécies que lhes pudesse ir servindo ATÉ À SUA EXTINÇÃO!
    Costumo, na minha linguagem africana, dizer que o elefante e eu temos o mesmo direito de habitar a TERRA, concedido pelo CRIADOR, mas em áreas diferentes e definidas. O homem não respeitou isso. Hoje, há 10% dos elefantes que havia nos anos 50 e porque há reservas de “CAÇA”.
    Começou a haver gente a mais neste planeta e com presença negativa.

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  5. Caro professor
    O seu artigo fala-nos da natureza ou melhor da natureza que nos resta. e quem como eu continua a olhar à volta e a ver o que nos rodeia e nos vai alegrando a vida, é bom sentir que não estamos sozinhos. No entanto há sinais que não são bons. Os papagaios e periquitos que se estão a multiplicar com rapidez a origem é o comércio ilegal de aves e o tráfico ilegal de ovos da América sul e da Ásia. Em Londres a proliferação destas aves foi de tal ordem prejudicial às espécies locais que foi promovido o abate . Quanto ao passarinho que fez o ninho à sua porta não é quase de certeza uma carriça, pois as carriças fazem os ninhos em forma de garrafa em tufos de feno. O descarado que fez o ninho à sua porta é quase de certeza uma espécie que habita por cá à poucos anos um passarito castanho mais ou menos do tamanho da carriça . coisas da alteração do clima.
    Cumprimentos deste seu admirador.

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    1. Bem haja pela sua elucidação. Tinha, de facto, dúvida acerca da identificação da carriça e lembrava-me de ela nidificar nas searas e, inclusive, no ar, subia e descia, piando. Vamos tentar saber qual é esse passarito cinzento que fez ninho no refego da varanda.

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