domingo, 17 de fevereiro de 2019

Para uma história das companhias de seguros em Portugal


           O Doutor José Maria Amado Mendes, professor catedrático aposentado da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, cedo encaminhou a sua investigação para o estudo da história das empresas em Portugal. Aliás, não foi inocentemente que, na década de 80, propôs a criação, na Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, da cadeira de Arqueologia Industrial.
            Essa unidade curricular começou a ser leccionada em 1987-1988, numa altura em que esse tema ainda se não abordava em Portugal, cadeira que nasceu da necessidade de se procurarem analisar e, na medida do possível, salvaguardar os vestígios ainda existentes de muitas empresas, designadamente de carácter fabril, cujas instalações, abandonadas após a cessação da actividade, se deterioravam a olhos vistos, sem que delas se fizesse o registo devido.
            Não apenas esses espaços materiais, arqueológicos, interessavam. É que, amiúde, numa ânsia de modernização ou, por vezes, de menosprezo pelo passado, se deitavam fora – ou mesmo destruíam – documentos que hoje seriam preciosos. Todos se recordam dos crimes de leso património que se cometeram logo após o 25 de Abril com essa destruição de muita documentação do maior interesse para a História!
            Várias têm sido, por isso, as obras que, por iniciativa do Doutor Amado Mendes, se publicaram, resultado de mui cuidada investigação dos arquivos que se não perderam. Citem-se apenas algumas, todas elas concretizadas após se ter aposentado: História do Abastecimento de Água a Coimbra, vol. I: 1889-1926 (2007), vol. II: 1927-2007 (2009); «O Papel e a Renova: Tradição e Inovação» (2008); Manuel de Mello: O Homem e a Obra (2008); Construção Naval (2013); Dicionário de História Empresarial, vol. I: Instituições Bancárias, vol. II: Seguradoras (ambos em 2013); «Empresas e empresários no final da Monarquia e na I República: Industrialização em processo acelerado» (2014); Novos grupos económicos no distrito de Aveiro: Famílias Pinho e Amorim (2015); «Os Museus devem dedicar atenção ao Património Industrial e Técnico» (2015); «A Indústria em Portugal, de Pombal à República: Revolução Industrial ou industrialização» (2017).
            O sector dos seguros, por exemplo, dada a sua íntima ligação com a vida das pessoas e das instituições, tem-lhe merecido a maior atenção. Por isso, um dos mais recentes trabalhos do Professor, desta vez em colaboração com Duarte Manuel Freitas, é o livro Zurich em Portugal. 100 anos de História. Um compromisso com o Futuro (1918-2018) [Lisboa, 2018], fruto de uma investigação que a própria Zurich Portugal houve por bem patrocinar e publicar. Louve-se, desde logo, a atitude da empresa, por ter consciência de que o presente e o futuro (passe o lugar-comum) se alicerçam na experiência adquirida.
            Trata-se da história de uma importante companhia de seguros, nas comemorações do seu centenário, com base na exploração da numerosa e diversificada documentação do seu arquivo, bem como de fontes orais e várias outras. As suas raízes remontam a 1918, quando foi criada, em Lisboa, a Companhia de Seguros Metrópole.
            Em 1950, o Grupo Zurich, sediado na cidade do mesmo nome e com uma longa história e grande experiência internacional na actividade seguradora (desde 1872), adquiriu a quase totalidade das acções da Metrópole, pelo que passou a ter um papel activo na respectiva gestão, através do seu representante, como elemento preponderante no Conselho de Gestão.
            Todavia, as raízes da Metrópole mantiveram-se bem vivas ao longo do tempo, inclusive na própria designação de "Metrópole" que adoptou até aos finais do século XX, quando passou a usar a denominação de Zurich.
            Através de novos e actualizados métodos de gestão e da competência e empenho dos seus numerosos colaboradores, a Zurich foi diversificando a sua oferta em diversos ramos de seguros, de forma inovadora, alargando o âmbito da sua acção a todo o País, pelo que, a partir de certa altura, se guindou a um honroso 5.º lugar, no leque das seguradoras a operar em Portugal.
            Muito há, por conseguinte, a esperar ainda de José Amado Mendes, que prepara neste momento, segundo tive ocasião de saber, uma comunicação sobre seguros em Portugal no século XX, a apresentar em Santiago do Chile, em finais de Julho próximo, no Congresso Latino-Americano de História Económica, em que coordenará, com Mario Cerutti (da Universidade de Nuevo Léon, Monterrey, México), uma sessão sobre Serviços. Celebrar-se-á assim mais uma presença da Academia de Coimbra no país irmão, através de um dos seus membros que, embora aposentado, continua a fazer uma investigação digna do maior encómio.

                                                                       José d’Encarnação

Publicado em Cyberjornal, 16-02-2019:

2 comentários:

  1. Fica aqui um exemplo de boas práticas, da Secil, no que toca à salvaguarda e tratamento dos seus arquivos: AHFML

    Obrigado pelo seu excelente trabalho como comunicador de história J. d’E.!

    ResponderEliminar