quinta-feira, 23 de maio de 2019

Serenidade e emoção num concerto único

              «Concerto único» foi designação usada para classificar o espectáculo que Teresa Salgueiro ia apresentar no dia 17, no Salão Preto e Prata do Casino Estoril.
            Dizia-se «único» nomeadamente por ser a primeira vez que a artista – para nós sempre recordada como vocalista dos Madredeus, ainda que faça hoje mui brilhante carreira a solo – convidava para estarem com ela três outras cantoras que, na verdade, assaz se coadunam com o estilo mavioso a que Teresa nos habituou: Sara Tavares e Marisa Liz.
            Difícil se apresenta, confesso, escrever sobre o que, nessas quase duas horas, nos foi dado assistir, numa atmosfera que muito tinha de espiritual – que me perdoe quem não acredita no espírito. Acreditaria, estou certo, se se tivesse deixado envolver pelo magnetismo terno, suave e quase místico que caracterizou a actuação de Teresa Salgueiro. Foi a sua voz límpida, imaculada, sem pressas, sim; foi também – e há que reconhecê-lo – a magia do ambiente, quer do que o publico se viu «obrigado» a manter, quer, de modo especial, pelo que a produção soube criar, pela sobriedade das luzes e pela exímia qualidade do som (a princípio, houve assim uma distracçãozinha, pareceu-me, e os instrumentos estavam com vontade de se sobreporem à voz, mas foi sol de pouca dura)
            Os músicos. Em perfeita sintonia com a artista.
          Deliciámo-nos com o veterano José Peixoto, uma lenda, mestre sublime no dedilhar da guitarra, vindo também ele dos Madredeus.
         Óscar Torres, no contrabaixo, emprestou aquela sonoridade cava que parece vir das profundezas, a acentuar o timbre claro da voz.
            Fábio Palma, no acordeão, em salpicos, diríamos, daquele cantar que só o portuguesíssimo acordeão sabe emprestar (e que bonito foi o diálogo entre ele e Teresa, no primeiro trecho com que fomos obsequiados, após o alinhamento previsto!).
            Rui Lobato foi-se desdobrando na bateria, nas percussões e na guitarra e se, cada vez mais, a bateria deixou de ser aquele instrumento a marcar o ritmo, teve aqui – nos bem conseguidos arranjos com que todas as composições se vestiram – um papel importante, no sublinhar sereno (permita-se-me o termo, aparentemente contraditório), «cirúrgico», do que Teresa ia cantando.
            Poderá parecer escandaloso dizer que momentos altos foram os encontros, primeiro individuais, de Teresa Salgueiro com Sara Tavares e com Marisa Liz, e, no final, a três (momento mui saboroso, esse!). Mas foram-no. E tenho a certeza de que Teresa não se importará nada com isso, porque o público bem compreendeu a enorme empatia que se gerou entre as três artistas, o enorme prazer que tiveram em estar juntas a obsequiarem, com o seu enorme talento, quantos tivemos a dita de as ouvir.
            E foi mesmo uma dita, essa, que dificilmente se esquecerá! Foi mesmo um concerto único, pleno de serenidade e de emoção! Num outro mundo se viveu ali – e não podemos deixar de estar gratos!

                                                           José d’Encarnação

P. S.: Fotos gentilmente cedidas pelo Gabinete de Imprensa da Estoril-Sol. Bem hajas, Luís Paralta!



Publicado em Cyberjornal, 2019-05-22:

Sem comentários:

Enviar um comentário