terça-feira, 20 de julho de 2021

Vamos salvar o Museu!

             Considera-se inegável que, na actualidade, o Museu do Trajo de S. Brás de Alportel constitui, no concelho, um foco cultural da maior relevância, tido em consideração pelos demais museus do Algarve, pelo dinamismo que tem demonstrado. 
         É de salientar, de modo especial, o seu imprescindível papel na aglutinação da comunidade em torno de valores como a Música, as Artes Plásticas e, inclusive, no apoio a todas as iniciativas de âmbito sócio-cultural. Aliás, tem sido o Museu um dos paladinos da chamada Museologia Social, que compreende a íntima interligação entre o espaço e a comunidade.
            Nascido e desenvolvido pelos Padres Cunha Duarte e pela constante doação de objectos por parte de particulares – de realçar as peças de vestuário e por isso se denominou Museu do Traje! – ficou integrado na Santa Casa da Misericórdia local. Aliás, na página dessa Santa Casa pode ler-se:
            «Constituindo a valência cultural da Misericórdia de São Brás de Alportel, o Museu do Traje destaca-se pela sua abertura e envolvimento com a população local. Para o turista, o interesse reside nas exposições, nos edifícios e nos jardins. Para a comunidade, o Museu é sobretudo um ponto de encontro, espaço de cultura, socialização e partilha de saberes».
          É isso mesmo! Os anteriores responsáveis pela Santa Casa levaram 35 aos a construir o Museu que temos hoje. Acontece, porém, que os actuais responsáveis por aquela instituição parece que se esqueceram disso. E – quanto nos é dado saber – também aí se quer impor uma lógica economicista. Estamos de acordo: o Museu pode dar dinheiro, pode não ser um peso para a instituição. Ou, se a instituição Santa Casa acha que não pode arcar com esse ‘peso’ da Cultura, desista e entregue a gestão a quem melhor a saiba e possa gerir. Não se fazem omeletas sem ovos; não se consegue manter o nível de acolhimento sem funcionários, sem estagiários, e sobretudo sem a LIBERDADE de gestão que é o oxigénio que a cultura necessita para se manter viva...
            Sim, aparentemente nas obras de Misericórdia que o Provedor, os membros da Mesa Administrativa e os membros da Mesa da Assembleia Geral juraram pôr em prática não consta a de manter um Museu. Mas ¿«Dar de comer a quem tem fome», «Dar de beber a quem tem sede» também não se entende no sentido espiritual – que a Cultura mata a fome e a sede de conhecimento? ¿E que tem feito o Museu senão «Dar pousada aos peregrinos» quando acolhe os estrangeiros que escolheram S. Brás para viver? ¿E não é o Museu a escola onde se «ensinam os ignorantes»?
          Um museu não é um depósito de objectos que ali se foram acumulando. Esses objectos requerem vida, requerem contexto, requerem investigação, requerem aliciante! Que este edifício apalaçado, do séc. XIX, que foi propriedade do industrial corticeiro Miguel Dias de Andrade, transformado, em 1986, no Museu do Traje, é bem o ex-libris de S. Brás de Alportel. É, pois, obrigação dos são-brasenses – e em primeiro lugar da Misericórdia de que administrativamente depende – salvaguardar religiosamente esta riqueza singular!        

                                                           José d’Encarnação

Publicado em Notícias de S. Braz, 296, 20-07-2021, p. 13.

 

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