sábado, 28 de junho de 2025

Os correspondentes

          

 
            
– Olá, Amigo! Há séculos que não sei de ti. Como vais passando?
            É mensagem que surge, inesperada e com carácter de urgência, quando me lembro de um amigo de que há muito não tenho novas, mormente se se encontra na mesma situação que eu, de aposentado, e o sei a morar sozinho. Nestes casos extremos, raramente, porém, recebo resposta, porque a preguiça nos enreda e nem sempre há tema de conversa e, mesmo por correio electrónico, há que ligar o computador ou ir ao livro de endereços buscar o endereço e uma pessoa já se esqueceu se o pôs lá com o diminutivo, pelo primeiro nome ou pelo ‘nome de guerra’ ou pelo apelido. Bem sei que devia ser sempre pelo apelido e estávamos conversados. Mas aquele eu conheço é por Blé, aquela colega é a Mané e sei lá eu qual é o apelido que tem agora, depois de casada!...
            Custa-me passar largos tempos sem saber de quem partilhou comigo parte significativa da minha vida e tenho a ideia de que uma palavra pelo aniversário, por exemplo, é sempre reconfortante, a dar a ideia de que uma pessoa não se esquece. Elaborei também listas diferenciadas de amigos a quem, de vez em quando, envio uma ‘circular’ sobre tema que suponho seja do seu interesse. O rol dos destinatários vai, como é da praxe, em bcc (conhecimento oculto), não só por discrição mas também para dificultar a caça a endereços. Dos destes róis, tenho sempre dois ou três a quem, por mais que lhes diga que não, fazem questão de agradecer e lá fica cheia a caixa de correio com desnecessárias mensagens!...
Pior são aqueles amigos que recebem o vídeo sobre a catedral de Notre-Dame renovada ou o Trump vestido de papa e o partilham com o mundo inteiro. Já o recebi mais de dez vezes! Ou a Amiga que diariamente colhe na internet a mensagem «Bom dia» e a dispara em rajada. Ou quem, todos os dias, morando não muito longe de mim, me informa «Hoje, o céu cinzento!». E aqueloutro a quem eu enviei uma informação e ma reenvia, não se apercebendo que fui eu mesmo quem lha remeteu?!...
Ao tempo do Sr. Júlio Dinis e da sua Morgadinha dos Canaviais, a chegada do carteiro era uma festa, na esperança de se ter carta da amada, do marido ou do filho. E nunca com obreia preta! Hoje, rezamos para que a caixa não se encha depressa!...

                                               José d’Encarnação

Publicado no jornal Renascimento (Mangualde), nº 877, 21-04-2025, p. 10.

1 comentário:

  1. Caro José. Nada pode bater o que se sente ao receber uma carta ou um postal, não por email, mas na caixa do correio física. Infelizmente em papel, já só facturas ou propaganda de vários tipos. Que fazer? Abraço!

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