sexta-feira, 20 de janeiro de 2017

O Corotelo está a morrer?

             Publicou o nosso jornal na passada edição, de Dezembro, a fotografia que registou o momento da partida para uma corrida integrada nas comemorações dos 50 anos da Sociedade Recreativa Corotelense.
A direcção da Sociedade com Eugénia Lima, 17 de Abril de 1988
            Em contacto com Vítor Barros, o grande zelador pela história desta esquecida fronteira noroeste do nosso concelho, fiquei a saber que, tendo a Sociedade sido fundada a 17 de Abril de 1938, a foto era, pois, de Abril de 1988. E enviou-me o recorte da 1ª página da edição de 31 de Maio de 1988 do nosso prezado colega «O Sambrasense», onde se dá miúda conta dos festejos e se explica que, dos 21 fundadores da Sociedade, só 4 estavam vivos nessa altura, passando já a colectividade por dificuldades, porque, da centena de sócios, apenas metade tinha as quotas em dia. E a festa, além da referida corrida de atletismo infantil, incluíra torneio de futebol infantil e baile de confraternização à tarde, tendo actuado o Rancho Infantil dos Almargens e jovens acordeonistas. O momento alto fora, porém, à noite o baile, abrilhantado pelo ímpar virtuosismo da sempre saudosa Eugénia Lima, que recordou, também ela, com saudade, as muitas noites festivas que ali passara.
            Dispus-me de imediato a escrever uma crónica sobre a Sociedade, cujas paredes, da última vez que eu as vira, em 2015, ameaçavam ruína, e aproveitaria, assim, para chamar a atenção da autarquia para o facto de ser evidente que, como essas paredes, a povoação estava a morrer. Tirando a algazarra das crianças da escola, Corotelo continuava a ser apenas – como sempre fora desde tempos de Romanos – terra de passagem e sem motivos para ser de paragem, até porque nenhum estabelecimento existe e cada qual se amanha como pode, numa população que se partilha entre os velhotes e os estrangeiros que escolheram o aconchego do Corotelo e da Fonte da Murta para se radicarem. Corotelo nem a uma placa toponímica tem direito; as ruas não têm nome; o lixo acumula-se junto dos contentores; não há transportes públicos; e, para qualquer compra, só indo à vila – mas já não há burros nem machos que levem a gente e os automóveis partiram de manhã para Faro ou para S. Brás e só depois do trabalho é que regressam...
            Mantém-se, a custo, o café, onde alguns reformados e estrangeiros apanham um pouco de sol; a Câmara Municipal faculta um autocarro, de quinze em quinze dias, às quintas-feiras, para os poucos moradores irem às compras; mensalmente, uma unidade móvel de saúde vai até lá para medir tensões e o enfermeiro dar dois dedos de conversa aos velhotes que aparecerem…
            Portanto, eu ia lamentar também o facto de nada se fazer pelo edifício da Sociedade de grande tradição, onde cheguei a deliciar-me com a actuação das charolas e, precisamente com Eugénia Lima, que me seduzia! Alertou-me, porém, Vítor Barros:
            «Quando refere que “me faz pena ver o estado em que se encontra o edifício”, deduzo que não sabe ainda o que lhe aconteceu… Pois bem, essas palavras pertencem ao passado. A Sociedade já não existe. Em meados de 2016, talvez Junho, o edifício foi demolido e já nada lá resta daquilo que conhecemos. Já não tinha existência como Sociedade, nem sócios, nem direcção e a chave já tinha sido entregue ao proprietário do imóvel. Como ameaçava ruir para a estrada, o mesmo resolveu deitar tudo abaixo. E assim morreu a nossa Sociedade. Ficam as lembranças e a saudade dos bons momentos lá passados pelos nossos antepassados e por muitos de nós, eu inclusive. Os bailes, as rifas, o grande jornal «A Bola» ocupando uma mesa inteira. A televisão em que se ia ver o Festival da Canção, as touradas, as petiscadas no bufete, namoricos, casamentos, etc., etc. Tudo está lá enterrado agora…».
            Obrigado, Vítor Barros!
            Não adianta chorar sobre pedras esboroadas. Pode ser que, um dia, quando algo de novo começar a surgir no horizonte, haja promessas… para cumprir!
            Oxalá!
                                             José d’Encarnação

Publicado em Noticias de S. Braz [S. Brás de Alportel] nº 242, 20-01-2016, p. 11.

 

 

6 comentários:

  1. Sonia Carmona Antunes
    20/1 às 7:49
    Saudades de uma vida simples e feliz.Imagens guardadas na nossa memória e que nos fazem tão bem. Fotografias tiradas do baú.Gosto imenso, caro Professor.

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  2. Maria Teresa Neves 20/1 às 18:08
    Não é só o Corotelo! Todos os sítios estão a ficar moribundos!

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  3. Josélia Viegas 20/1 às 20:47

    Em Fevereiro de 2016 fiz estas quadras:

    Com o perigo a espreitar
    Podia cair e causar
    Algum grave acidente
    Foi abaixo a Sociadade
    Deixa alguma saudade
    Nela se divertiu muita gente

    Há muitos anos fechada
    Mas ainda é lembrada
    Pelos famosos bailaricos
    Vinham de longe pra dançar
    E o acordeão a tocar
    Convidava aos namoricos

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  4. Célia Faria
    Saudades imensas de todo o passado!Era lá que eu ia ver a festa do 13 de Maio, em Fátima, o festival da canção... Beijinho e um bem-haja pela partilha.

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  5. Manuel Leitão
    Uma infância sem os gameboy, as PlayStation, etc. Mas com os carrinhos de rolamentos, o pião, o arco, os berlindes, etc..... Uma infância feliz onde se dava valor a uma verdadeira amizade, feita por entre os estudos e as brincadeiras na rua.

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  6. Ana Paula Bexiga Mariano
    21/1 às 0:13
    Dos Vilarinhos caminhando com as amigas até aos bailaricos! Era o da Pinha, o das tabletes de chocolate ��... Enfim, tudo pretexto para conviver com muita alegria. Tudo era mais puro, tudo era mais lindo, saudades desses tempos��

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