quarta-feira, 19 de abril de 2017

Um banco vazio e… um banco ocupado

            Há dias, no passeio com os netos pelo bairro, deu-me na veneta de seguir rumo diferente e passei por um recanto bem sossegado. Jardim cuidado, dois bancos, caixote para o lixo, distribuidor de sacos para os detritos caninos. Um melro saltitava pela relva e, na varanda de um rés-do-chão, o canito ladrou-nos compulsivamente, como que a dizer que não era aquele um território por onde humanos devessem passar.
Bancos vazios, na saudade imensa de uma conversa de anciãos...
            Lembrei-me de ver pelo meu concelho inúmeros recantos ajardinados assim, com bancos vazios, na saudade imensa de uma conversa de anciãos ou de algazarra infantil.
            E recordei também uma outra história verdadeira, não sei em que país, onde um ancião deixou parte da herança ao município para que mantivesse em bom estado o banco onde ele passara muitas tardes, junto ao curso de água que atravessava a povoação e onde suavemente se entretinham os patos e suas crias e iam bebericar os pardais – e ele entretinha-se a vê-los.
            Ano de eleições, este; ano de obras por toda a parte e o automobilista vê-se e deseja-se para seguir as placas DESVIO, sempre na dúvida, porém, se estarão actualizadas ou meramente esquecidas após o termo dos trabalhos, que o empreiteiro partiu para outra e a placa ali ficou. Soube, porém, que dessa vaquinha que dá pelo nome de Europa havia jorrado leitinho fresco para vilas e cidades que dessem prioridade à construção de ciclovias. E hoje não há aglomerado urbano que se preze que não tenha a sua ciclovia ou uma via pedonal, para o cidadão correr, mesmo que se situe em movimentada rua, mais poluída que charco ao pé de fábrica de químicos. Até Lisboa deixou de ser a cidade das sete colinas para se enfeitar de ciclovias, daquelas que são óptimas numa planíssima Holanda ou nas férteis planícies da nossa Gândara, onde as mulheres desde tempos imemoriais que vão de bicicleta para a amanha do campo, enquanto o homem vai pró mar.
            Lisboa, porém, foi mais longe, porque, como se sabe, está deserta de portugueses e prenhe de turistas. Uma imagem «chata», não há dúvida – que o estrangeiro vem e até gosta de ver gente e ouvir falar uma língua que é a quinta mais falada no mundo… E, vai daí, segundo consta, não esteve a autarquia com meias-medidas: contratou figurantes para se passearem nas ruas habitualmente vazias e se sentarem nos bancos plantados em meio da urbana poluição. Não é genial? Pois a informação vem numa reportagem que João Aragão pôs no youtubehttps://youtu.be/6frHVhxBoE0 – no passado dia 20 de Março. Foi maldade!
                                                                                  José d’Encarnação
 
Publicado em Renascimento (Mangualde), nº 706, 15 de Abril de 2017, p. 11.
 

3 comentários:

  1. Isilda Marques, 19-04-2017, 19:36 h
    Foi um prazer ler, até ao fim, este texto, onde as memórias passeiam, nos cantos e recantos, dos bancos do jardim, quem não tem memórias desse tempo de algazarras da infância, acompanhados pelo encanto no olhar e sabedoria dos mais idosos? Ó professor, grata por este momento onde viajei até à época em que havia mais tempo para se ser criança e até para se ser idoso. Um xi-coração.

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  2. Carlos Encarnação, 19-04-2017, 21:18 h
    Moral da história: há bancos bons e bancos nem por isso...
    O meu comentário:
    Pois, amigo Carlos! :) Um abraço!

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  3. Teresa Silva
    Este não é só um problema de Lisboa, há muitas outras grandes capitais que se "venderam" ao turismo com as consequentes descaracterização, massificação e encarecimento... eu sou lisboeta, nasci em casa da minha avó na Avenida Afonso III, mas há muito que deixei de ter gosto de ir a Lisboa, quando lá vou sinto-me turista...

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