Aceitou
a Freguesia de Viseu o desafio de publicar em livro de prestígio, excelente
apresentação gráfica, capa cartonada, o álbum intitulado Ruralidades, da
autoria do Dr. Alberto Correia. Fotografias do Arquivo Foto Germano, de Viseu;
design de Sónia Ferreira. 2023, 500 exemplares, 64 páginas.
Louve-se
a sensibilidade do seu presidente, Diamantino Amaral dos Santos, que salienta, na
Nota Introdutória, este «discurso simples e delicioso, que matiza e faz persistir
as memórias de gentes pitorescas»; louve-se a disponibilização de verba para a edição; louve-se a forma original
como o Autor legendou, na página da direita, a foto inserida na da esquerda,
fazendo-a falar, levando-nos, em clave poética, a melhor a contemplar e a
entrar, de mansinho, na existência antiga do que ali se apresenta como que
apanhado em fragrante…
Optou-se
– e bem! – por magníficas fotos a preto e branco, que mui adequadamente realçam
o instantâneo captado. Nada de poses, de artifícios! É mesmo o instantâneo natural,
susceptível de transmitir o viver quotidiano. Acontece, porém, que o Dr.
Alberto Correia não se limita à mera evocação dos seus tempos de menino, mas evoca
sobretudo – e isso é que importa realçar – o halo poético que deles
inevitavelmente dimana, com o objectivo de preservar a memória, fautor de manutenção
de identidade!
Não
resisto a exemplificar usando a imagem (mui difícil, muito difícil mesmo a
minha opção, confesso!) escolhida para a capa: a das lavadeiras na Ponte da
Azenha, no rio Pavia. Aí cumpriam elas «a arregimentada tarefa do lavar da roupa
de uma abonada burguesia (…)» e «de uma residual e caprichosa fidalguia». A
burguesia a viver em «solenes mansões»; os fidalgos, nos «últimos solares que resistiam
à ruína».
Tarefa
acabada, roupa corada, enxaguada e seca «na suspensão festiva do cordame»,
dobrados «os lençóis de linho, as roupas de uma não desvelada intimidade, toalhas
de mesa e peças de enxoval», o poeta
anota:
«Um
filho ao colo, um filho pela mão, os passos marcados no subir da calçada e o
cheiro a sol que as lavadeiras deixavam à porta de um lar. E a roupa delas que
ficar por lavar!...».
Ouvimos-lhes os passos,
sentimos-lhes o cansaço, deixamo-nos ficar. Maravilha!
José d’Encarnação
Publicado em Renascimento [Mangualde], nº 861, 15/03/2024, p. 10.
Muito grata pela revelação deste novo livro dado à estampo, José d' Encarnação, um documento para memória futura.
ResponderEliminarAdoro fotografia a preto e branco. Para revelar um tempo passado, não haverá melhor opção.
Sozinha esta imagem fala de usos e costumes pretéritos, gestos que marcaram gerações e que tão belos se tornavam, na tremenda injustiça das desigualdades sociais.
Um grande abraço. Parabéns e êxitos para para o autor.
"dado à estampa", mas que coisa restes enganos repentinos!
ResponderEliminarestes...
Eliminar