quinta-feira, 6 de dezembro de 2012

Andarilhanças (60)

O ‘computador’ das Finanças
            Não consigo acertar com essa tal de AT autoridade tributária e aduaneira. Assim, em letras minúsculas, como, ao que parece, deve mandar o tal Acordo Ortográfico. E será que Acordo Ortográfico tem direito a maiúsculas? Eu cá acho que não.
Voltando à AT: já devolvi umas dez vezes a correspondência que me chega às mãos referente a um contribuinte e a uma contribuinte, ao que parece, moradores, outrora, em determinada casa. Escrevi em letras garrafais e sublinhei: A DEVOLVER AO REMETENTE. DESCONHECIDO NESTE ENDEREÇO, como mandam as regras. Aliás, também já se fora à correspondente repartição da AT com o sobrescrito em mão e se explicou.
Então não é que o ‘computador’ não funciona e ainda não conseguiu dar baixa desse endereço? Ou, se calhar, a máquina segue aquela regra da «água mole em pedra dura…», que é como quem diz: «Qualquer dia, a pessoa vai lá, abre a caixa do correio (de que já não tem chave…) e descobre que andamos à procura dela!». Como se ela e ele não soubessem que a AT lhes anda no encalço!...
Como cidadão, porém, estou eu próprio a começar a ter dúvidas: vale a pena eu devolver a carta aos correios? Tiro a senha, espero que me atendam, para… nada?... Começo, de facto, a andar com o meu espírito cívico muito por baixo, confesso…

Não se incomoda?
            E poderá vir a talhe de foice outra história de há dias.
O avião ia levantar voo e eu até tinha ganas de ver de novo como é que estava o Mar da Palha nesta altura do ano. Haviam-me dado um lugar B e só poderia espreitar a paisagem se o vizinho do A deixasse. E não é que, sem mais nem menos, ele me fechou a portinhola na cara? Nem uma palavra! Fechou e… pronto!
Ensinaram-me pais e professores que, numa circunstância dessas – de janela para duas ou três pessoas – se deveria perguntar «Posso?», «Dá-me licença?», «Incomoda?». Como se faz no alfa ou no intercidades, onde não sabemos se, naquele momento, a pessoa da frente ou a de trás quer ver as vistas que nós estamos fartos de ver, embora o sol nos esteja a dificultar a visibilidade do ecrã do computador. Não. O senhor fechou, está fechado. Logo verá para a próxima!...

Não se incomodar
Essa do não se incomodar fez-me lembrar outra peripécia destes últimos dias, na Escola Hoteleira do Estoril.
Tem a Escola Superior de Hotelaria e Turismo do Estoril um grande «problema», se bem compreendi: vive em instalações arrendadas à Escola Média e quem pertence a esta nada sabe daquela ou, pelo menos, faz de conta que não sabe. Rara foi a vez que eu fui à Escola Superior que não tenha apanhado pela frente alguém da Escola Média e que, peremptoriamente, ao pedir-lhe uma informação, não me haja respondido: «Não sei, isso é da Escola Superior!».
Faz-me lembrar (desculpe-me, leitor, este encadeamento) quando estamos em Bruxelas: se na zona francesa, caso te dirijas a um agente público em flamengo, diz logo que não percebe nada – e vice-versa. A mim já me aconteceu com o revisor dum transporte público: o senhor só percebia flamengo na zona flamenga e francês na zona de língua francesa. Achei o máximo!...
Mas vamos ao caso da Escola Superior. Eu ia para um júri. A porta principal estava fechada, por obras. Indicou-me um estudante a entrada pela garagem. Andei às voltas entre cacifos, ia entrando numa cozinha, até que encontrei um segurança (acho que é assim que se chama…) que andava de um lado para o outro, na plataforma de um piso. Azar: era da Escola Média e nada percebia da Superior. Mandou-me para uma porta envidraçada, que ele (decerto já andava por ali, dum lado para o outro, a manhã inteira…) ainda se não apercebera que também estava em obras. Dei com o nariz nos vidros. Voltei a falar com o senhor, que me indicou outra porta de saída e, depois de mais umas voltinhas, lá consegui chegar a um balcão. A senhora também não sabia muito bem onde era a sala para que eu fora ‘requisitado’ e, ingenuamente, perguntei-lhe se não haveria por ali à mão de semear um telefone interno que a pudesse pôr em contacto com a direcção da Escola Superior, a dizer que estava ali um professor convocado para uma reunião e que já deviam estar à espera dele (entretanto havia passado quase um quarto de hora…). Resolveu-se o problema com o telefonema e uma senhora mui simpática do secretariado da Superior lá me encaminhou para a sala.
De regresso a casa, revivendo a situação, dei comigo a perguntar-me: com tanta falta de emprego, não haverá quem pense que civismo, brio profissional, atenciosidade, boa disposição são condimentos indispensáveis para se manterem no ganha-pão que ainda conseguem ter? E… essas ‘coisas’ já não se aprendem?

Publicado em Jornal de Cascais, nº 327, 05.12.2012, p. 6.

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