quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Devorar e… digerir!

            Todos estamos de acordo: na recente campanha eleitoral, as cúpulas dos partidos esqueceram, mais uma vez, o País real. O ‘tempo de antena’ que nos noticiários lhes era concedido aproveitaram-no para dizer o que, garantidamente (!), fariam se fossem governo ou, sendo da esfera do governo, porque é que estavam a actuar assim e não doutra forma.
            Oportunidade perdida!
            Saudades? Sim, não o nego. Tenho saudades dos candidatos que conheciam os assuntos, os estudavam e que se sabiam rodear exclusivamente dos interesses locais.        O meu amigo António lembrou-se, antes da campanha, que seria de interesse ir visitar aquele lar da sua freguesia, para se inteirar da situação e saber o que, se eleito, poderia fazer para a melhorar. A directora advertiu-o, porém:
            – Vossemecê pode vir, mas sozinho ou com dois ou três dos seus colaboradores mais directos. É que, sabe, na outra campanha, um dos candidatos entrou por aqui adentro com bandeiras, camisolas, panfletos… algazarra! E os meus velhos muito aflitos: se era uma revolução, se tinham vindo ocupar o lar, o que era aquilo? Portanto, pode vir, mas não para fazer propaganda, que estes senhores que estão aqui tomara terem capacidade para comer, para se deitarem e tomar a medicação
            António compreendeu. E pasmou quando eu lhe contei que, de facto, um outro candidato decidira visitar um centro de acolhimento de indigentes portadores de doenças mentais das mais variadas e graves etiologias e se fizera acompanhar de todo o séquito propagandístico… Ele era carros, camisolas, bandeiras, bonés… «Dê-me uma camisola!», bradava o maluquinho, «Dê-me uma bandeira!», rogava outro… E o pessoal olhava-se entre si: «Esta gente não percebe mesmo nada disto! Coitados!».
O chefe daquele partido ia às terras, sim; mas sabia de antemão com quem deveria falar, quais os problemas fundamentais que afectavam a população e quais as medidas concretas que se deveriam adoptar. A inteligência ao serviço da política. Não telecomandada por quem da vida não tem experiência e se baseia apenas nos manuais que sôfrega e mui rapidamente procurou devorar.
Exacto: eu escrevi «devorar» – porque «digerir» é uma função bem diferente!

Publicado em Renascimento (Mangualde), nº 625, 15-10-2013, p. 12.

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