segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

Os números deram-lhes a volta ao miolo!

             Deve ter sido. «Cérebros» bem adestrados em promissor brainstorming. Tem de escrever-se em inglês, para dar a ideia de enorme caldeirada de ideias, em reboliço – que storming significa isso mesmo: «assalto». E vem de storm, «temporal, tempestade, borrasca»! E brain é cérebro mesmo!
            E os tais «cérebros» interrogaram-se: que vai ser da investigação em Portugal e na Europa nos próximos anos? Que vai ser? Que dinheiro poderá cabimentar-se? Não se sabe? Pergunta-se!
            E, vai daí, os cérebros apresentaram o projecto. Sim, tinha que ser um «projecto»! Não podia ser «proposta», que isso soava a plenário de trabalhadores. Projecto é que era! E foi aprovado!
            E os senhores investigadores europeus, que são, afinal, uma catrefada deles, foram, pois, intimados a preencher um quadro, apresentado na língua de Sua Majestade Britânica, onde tiveram de assinalar o número de livros que pensavam escrever em cada ano, de 2015 a 2020 (!!!); o número de artigos em revistas nacionais ou internacionais, sobretudo se com referees… O referee é assim a modos de um fiscal que ajuíza se aquilo tem jeito ou não, se vai ao encontro do que ele pensa ou se preconiza ideias subversivas (onde é que eu já ouvi isto?...). E, sem conceituado painel de referees, a revista não tem cotação no mercado, pronto!... Ah! E o número de congressos, com ou sem comunicação; o número de capítulos de livros; o número de conferências (no País e no estrangeiro), etc. Tudo bem escarrapachadinho, senhores! De 2015 a 2020, entenderam? Se não, não há dinheirinho!...
            «Daqui a sete anos!», disse para os meus botões. E lembrei-me de súbitos tornados; de cheias imprevisíveis; dos jogadores que assinam contratos por três épocas e caem por junto, de colapso fulminante; do carácter provisório em que, dia a dia, cada vez mais se nos vai a vida… Que faço daqui a sete anos? Sei lá eu o que me será possível fazer amanhã!
            E a alta individualidade, quando lhe apresentaram estes comentários, retorquiu: «Já viu quantos doutoramentos há em Ciências Sociais e Humanas? Já viu que os Checos escrevem todos os artigos em inglês?». E o seu interlocutor limitou-se a dizer-lhe que, se calhar, sem Ciências Sociais e Humanas não haveria comunidade lusófona e nem atenção se daria ao Homem como Pessoa. E quanto aos Checos escreverem em inglês e nós estarmos a pugnar pela Língua Portuguesa, porque é que ele, com a autoridade de que estava revestido, não incitava os Checos a escreverem na língua deles também?

Publicado em Cyberjornal, 06-01-2014:

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