Houve
logo quem bramasse: «Um livro sobre toiros, agora que toda a gente está contra
as touradas?! Só visto!...».
A
crítica só pode ter saído da boca de quem não sabe distinguir os tempos e as
mentalidades e não tem a noção de
que algo que hoje é branco amanhã pode ser preto, se mudarem as circunstâncias.
Criticamos os políticos por dizerem hoje uma coisa e amanhã outra completamente
diferente; amiúde, eles nem têm culpa e explicam: «Senhores, as circunstâncias
mudaram!».
Mudou
hoje a mentalidade geral sobre as corridas de touros, nomeadamente porque se
começou a dar mais importância ao mundo animal, se começou a ver quão
importante é a biodiversidade. Dantes, eu matava lagartos, cobras, lagartixas,
aranhas; eu armava aos pássaros e matava-os (quando lhes acertava) com uma
fisga improvisada; hoje, saúdo as pequeninas lagartixas que andam pelo meu
jardim, preservo as osgas que me passeiam pelas paredes da garagem, porque me
comem os insectos, e também por isso protejo as aranhas…
Mudam
as mentalidades e o facto de as corridas, hoje, serem globalmente mal
encaradas, tal não quer dizer que, no passado, esse não tivesse sido um
entretenimento típico das zonas mediterrânicas e, de modo especial, de Espanha e
de Portugal. Aliás, não se combatiam as feras em plenos anfiteatros romanos e
não foi o nosso Salvação Barreto
chamado a fazer a pega no filme «Quo Vadis?», que evocava precisamente um
desses espectáculos, em que (pesa-nos!) às feras também eram lançados os
Cristãos?... Na actualidade, o solene anfiteatro romano de Nîmes, em França,
transformou-se em praça de touros, mas sobretudo em palco de grandes
espectáculos musicais. Tal como a Praça do Campo Pequeno, em Lisboa.
Uma tradição
Emília Sabino, representante da Junta |
O livro A Tauromaquia em Cascais, da autoria dos
já consagrados reveladores do passado cascalenses, Manuel Eugénio Fernandes
Silva e José Ricardo C. Fialho, em muito boa hora apoiado pela União de Freguesias
Cascais Estoril e apresentado perante mais de meia centena de amigos e
cascalenses, no final da tarde do passado dia 18 de Junho, no largo fronteiro
ao edifício da Junta, vem precisamente no sentido de nos revelar essa tradição , a das touradas em Cascais.
Manuel Eugénio e Ricardo Silva |
Uma
tradição que remonta ao século XIX e
se prolongou décadas afora, com a construção
de sucessivas praças, até à Monumental, inaugurada a 15 de Agosto de 1963 (faria agora 55 anos!) e demolida em Março de 2007,
por a Santa Casa da Misericórdia de Cascais ter considerado o empreendimento
não rendível, apesar de os baixos da praça estarem ocupados por
estabelecimentos comerciais e no terreno derredor se efectuar uma feira, a
conhecida «Feira da Praça de Touros». Demoliu-se, ficou longos anos –
demasiadamente longos! – o terreno a servir de parque «informal» de estacionamento
(como hoje se diz) e só agora para aí se logrou a aprovação
de um projecto urbanístico, que também não vai ser aceite sem reservas.
Aspecto da assistência à apresentação do livro |
Conta-se
tudo, tintim por tintim, nesse livro, ano após ano, corrida após corrida: quem
se notabilizou, que ganadarias, que cavaleiros, que forcados, se esteve frio,
se o vento (o grande inimigo, sempre, das touradas na Monumental!...) incomodou,
se houve praça cheia ou assim assim…
José d’Encarnação
Publicado em Costa do Sol Jornal (Cascais), nº 245, 2018-08-15, p. 6.
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