Permita-se-me que ‘recupere’ e divulgue o texto que, sob o título «A sugestão de… José d'Encarnação», foi publicado em Cascais – Agenda Cultural nº 21 (Jul/Ago 2006), p. 84-85.
«No nosso país são muitos os homens e as mulheres que se envergonham, na grande cidade, dos costumes da sua terra. Tragicamente, o mundo está a perder a originalidade dos seus povos, a riqueza das suas diferenças, no seu infernal desejo de “clonar” o ser humano para melhor o dominar. Quem não ama a sua província, o seu paese, a aldeia, o pequeno sítio, a sua própria casa, por mais pobre que seja, mal consegue respeitar os outros. Mas quando tudo está dessacralizado a existência é ensombrada por um amargo sentimento de absurdo».
A natural sugestão para os meses de Julho e Agosto seria, pois: descubra a sua terra, maravilhe-se, dê longos passeios a pé, embrenhe-se pelas nossas aldeias e descubra o que ainda têm de típico: no valado de pedra solta, na figueira-da-índia, no pinhal que sobrevive, no casal saloio…
Mas… leve um livro consigo. Fique-se sentado no lapiás da orla; deixe-se inebriar pela beleza ímpar da Biscaia e do manto enorme do Oceano a seus pés, mormente na dolência do sol-pôr… mas leve um livro!
Pode ser o da mesa-de-cabeceira. Eu tenho dois: um, espiritual, de Michel Quoist, Construir; e a eterna Citadelle, de Saint-Exupéry – para ir saboreando aos poucos.
Permita-me que lhe sugira dois. O primeiro, donde foi retirado o excerto com que comecei esta conversa, uma obra-prima, já por diversas vezes premiada: de Ernesto Sabato, Resistir (Dom Quixote). A reflexão desassombrada de um argentino nascido em 1911 sobre «a incomunicação, o culto de si próprio, a reverência aos deuses da televisão, o trabalho desumanizado, o império da máquina sobre o ser»… «Não podemos continuar a ler às crianças contos sobre galinhas e frangos quando temos essas aves submetidas aos maiores suplícios». «Temos de reaprender o que é gozar. Estamos tão desorientados que acreditamos que gozar é ir às compras. Um luxo verdadeiro é um encontro humano, um momento de silêncio perante a criação, o gozo de uma obra de arte ou de um trabalho bem feito». E, perante tudo isso, a palavra d’ordem, urgente: RESISTIR!
O segundo, de Alice Marques, Mulheres de Papel (Livros Horizonte, Setembro de 2004). «Representações do corpo nas revistas femininas». Numa escrita bem saborosa, o escalpelizar arguto do modo como se apresentou a mulher na Cosmopolitan e na Máxima, em 2000. Sintomático. Em tempo de Verão, tempo de «corpo de Verão», de perfumes, de conselhos omnipresentes sobre a imagem, corpo-aparência, corpo-útil, corpo-sedução, império da efemeridade, jogos de prazer, striptease, kamasutra, «um olhar intenso vale mais do que mil palavras picantes»… Alice Marques é professora do Ensino Secundário na Marinha Grande, licenciada em História e em Jornalismo pela Faculdade de Letras de Coimbra e Mestre em Estudos sobre a Mulher pela Universidade Aberta. Mulheres de Papel, um libelo – para homens e mulheres!
quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011
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