sábado, 6 de janeiro de 2018

O eucalipto é meu; o sobreiro do neto será!

            Quando estive de professor na Escola Profissional de Santo António em Izeda, no ano lectivo de 1963-64, levava os meus ‘correços’ ao rabisco da castanha e da uva e, na aula, em jeito de lição por essas andanças nos soutos e nas vinhas já vindimadas, falava-lhes de um provérbio que por lá aprendi: «Oliveira do meu avô, castanheiro do meu pai e vinha minha».
            Olhavam para mim com ar de espanto e eu explicava que a frase queria dizer o seguinte: se eles plantassem vinha, ainda delas viriam a comer as uvas e a fazer bom vinho; se preferissem castanheiros, mui provavelmente só os filhos deles comeriam as castanhas; e se, ao invés, se dessem ao trabalho de plantar oliveiras, só os netos lhes saboreariam as azeitonas.
            O provérbio poderia ter hoje outra formulação, do género de «O eucalipto é meu; o sobreiro do neto será!» – que é como diz: se eu me dedicar aos eucaliptos, meninos, é atar e pôr ao fumeiro, ganho dinheiro num abrir e fechar de olhos; se, pelo contrário, atender a essas ‘histórias’ da vegetação autóctone, do que é bom para o solo e optar pelos sobreiros e azinheiras, amigo, só meus netos delas tirarão cortiça e lograrão alimentar saudavelmente os seus porquitos com bolota.
            Essa, a lição que, mais uma vez, o Prof. Jorge Paiva, botânico da Universidade de Coimbra, nos dá no seu postal de Natal deste ano. É o sobreiro a sua «árvore de Natal especial» – e ilustra a frase com um sobreiro da Malhadoura (Parque Nacional da Peneda-Gerês), «cuja idade avançada se revela com a semelhança da base do tronco e a rocha circundante».
            Como, «devido ao actual “Aquecimento Global”, Portugal está a ter verões mais quentes, mais secos e de maior amplitude» e «as únicas árvores que temos, capazes de suportarem estas novas condições, são, precisamente, os sobreiros e as azinheiras», «é necessário repensar a floresta de produção e ordenar o país».
            «Sobreiros e azinheiras são árvores de crescimento lento e o ordenamento do território é muito trabalhoso e demorado», ainda que «isso já tenha sido feito no Ribatejo e no Alentejo», onde «os montados de sobro e de azinho demoraram dezenas de anos a formarem-se, mas hoje são rendíveis e sempre com o mesmo número de árvores, pois, conforme vão morrendo, vão sendo substituídas por outras».
            Daí o seu voto – que, evidentemente, partilho:
            «Que a época festiva do final do ano ilumine a consciência dos governantes e políticos de Portugal de modo a não continuarmos a ter “piroverões”».
 
José d’Encarnação

Publicado em Renascimento (Mangualde), nº 722, 1 de Janeiro de 2018, p. 11.
As fotos reproduzem o que o Professor Jorge Paiva incluiu no seu postal de Natal.


 

 

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