sexta-feira, 20 de julho de 2012

Feira do Artesanato - Inauguração envergonhada ou incompetência reinante?

            Os factos: a 49ª edição da FIARTIL – Feira do Artesanato do Estoril – abriu na quinta-feira, 21 de Junho, às 18.00 h. Pelo Gabinete de Imprensa da CMC, foi enviada à Comunicação Social, às 18.08 horas desse mesmo dia, a seguinte informação:
«A partir de hoje, dia 21 de junho, abre portas mais uma Feira de Artesanato do Estoril, promovida pela Câmara Municipal de Cascais, através da Cascais Dinâmica, no recinto em frente ao Centro de Congressos do Estoril. Até dia 2 de setembro, o certame mais antigo de Portugal reúne mais de três centenas de artesãos para mostrar ao vivo técnicas e tradições ancestrais das artes populares de Portugal. Com um vasto programa de animação, de que fazem parte nomes como Paulo de Carvalho, Vitorino, Lenita Gentil, Carlos Alberto Moniz, Ana Lains e Cuca Roseta, este ano, pela primeira vez na história da Feira do Artesanato do Estoril vai também decorrer um concurso de Fado, para descobrir novos talentos desta sonoridade que é património imaterial da humanidade.»
No dia seguinte, 22, no começo da tarde, foi-nos enviada a habitual agenda do presidente, onde constava para esse dia, às 18.00 horas, a sua presença na «inauguração da Feira do Artesanato do Estoril».
Pelo que pude apurar, estiveram presentes ao acto pouco mais do que cinco individualidades. As fotografias divulgadas, por exemplo, pelo nosso prezado colega local que teve publicidade de capa (página inteira), na sua edição do dia 27, mostram dois artesãos sozinhos e a imagem dos dois intervenientes na inauguração: o Senhor Presidente da Câmara e o Senhor Presidente da Cascais Dinâmica, a empresa municipal que gere a feira.
Por conseguinte, observados os factos, creio justificar-se a pergunta feita: preconizaram uma inauguração envergonhada, para, por exemplo, não fazer concorrência aos outros muitos eventos da temporada, ou tudo isso reflecte uma enorme incompetência ou desinteresse pela Feira por parte da Cascais Dinâmica?
Vivemos em Cascais há muitos anos. Acompanhamos a Feira do Artesanato desde o 1º ano em que nasceu, quase no âmbito das comemorações do VI centenário da elevação de Cascais a vila. No Antigo Regime, sucedânea de certo modo, como fora, do Mercado de Abril, a inauguração tinha honras de Chefe de Estado e ministros. E assim continuou nos primeiros anos após a Revolução, porque se compreendia perfeitamente que o artesanato vivo que ali se apresentava, além de ser forte atracção para os habitantes – ponto de encontro privilegiado das noites dos nossos Verões – o era também para os forasteiros. Turista que se prezasse ia à Feira do Artesanato saborear petiscos bem portugueses e deliciar-se com o que eu cheguei a chamar «Portugal pelas mãos do seu Povo». Ali se convivia com os bonecos da Rosa Ramalho, de Barcelos, os Cristos ingénuos de Mestre Josafaz, a louça de Bisalhães ou os barros negros de Molelos, as procissões com centenas de figuras de Estremoz, a loiça de S. Pedro do Corval, as filigranas minhotas, as rendas de bilros, as bilhas de Nisa… Era isso: Portugal pelas mãos do seu povo, vendo trabalhar ao vivo artesãos autênticos.
E o dia da inauguração era um dia de festa, o Dia da Festa do Turismo Local. Nessa tarde – por que se esperava o ano inteiro – ali se reuniam os hoteleiros, os responsáveis pelas agências de viagens, os capitães do Porto (o que estava em funções a os anteriores, porque, por inerência do cargo, o capitão do Porto pertencia à Junta de Turismo), os representantes das forças vivas do concelho, os jornalistas locais e os nacionais, representantes de empresas ligadas ao turismo, a vereação camarária, os deputados municipais, membros dos executivos das juntas… Enfim, a inauguração constituía agradável pretexto para troca de impressões e de experiências, para gizar novos projectos, para, enfim, juntar num mesmo recinto emblemático quantos contribuíam para o que era (e não continuará a ser?) a principal fonte de riqueza do concelho.
Nessas alturas, não estava lá, claro, ninguém da actual Cascais Dinâmica. Não admira, por isso, que dessa memória nada se tenha retido ou recebido. Ou, se se recebeu, decidiu-se fazer tábua rasa, para se ser inovador ou, se calhar, para tentar reduzir a feira a algo sem importância de maior. E é pena. Mormente porque depressa se terá esquecido, por exemplo, das lutas grandes que tivemos para que esse pinhal fosse preservado para a feira e não transformado – houve projecto quase em fase de aprovação!... – em empreendimento habitacional de luxo, arrancando os pinheiros e contaminando também o manancial que lhe passa por baixo e alimenta as termas do Estoril.
É pena que se tenha perdido a memória. È pena que não se publicite mais a feira (que a determinado momento se começou a chamar Fiartil porque englobou artesanato doutros países). É pena que o artesanato lídimo tenha dado lugar, de modo prevalente, ao chamado artesanato urbano. Mas… é o que temos, que é que se lhes há-de fazer? Se, ao menos, tivessem estudado a História Local!...

 [Publicado no Jornal de Cascais, nº 318, 18.07.2012, p. 6].

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