Mariposear: andar de um lado para o
outro, pegar numa coisa agora, deixá-la a meio, começar outra e, de seguida,
atirar-se a mais uma sem deixar acabada a anterior. Tal como parece ser a
mariposa, que vai daqui para ali, depois volta, volteia, poisa aqui, poisa
acolá, está quieta escassos segundos….
Meu pai preferia um termo mais
corriqueiro, menos… poético: besoirar! Besoirar quererá significar vulgarmente «incomodar
com barulho insistente», qual besouro que vai e vem e nos acicata os ouvidos.
Tenho-o, porém, num outro significado, porventura próprio do falar algarvio: muitas
vezes meu pai o usava, mormente quando, por exemplo, nos preparávamos para ir
para a mesa; minha mãe ou minha avó ficavam a «besoirar»: tinham sempre mais
uma coisa a fazer, faltava isto, faltava aquilo e parecia que nunca mais se despachavam!...
Lembra-me a palavra duas outras situações.
Uma, a dos que já estamos avançados nos anos e que, amiúde, vamos arrumar
a chave e vemos um sapato fora do lugar e o livro desarrumado e toca alguém à
porta e… ao fim do dia, perguntamos: «Mas onde é que eu pus a chave?»…
A outra, a história do chanceler D’Aguesseau, contada por Mário Gonçalves
Viana (A Arte de Estudar, 1943, p.
151): havia sempre um intervalo, mais ou menos longo, entre o momento em que o chamavam
para a mesa e aquele em que a refeição começava; decorrido algum tempo, o chanceler
apresentou à família, estupefacta, o livro que escrevera unicamente durante
esses ligeiros quartos-de-hora em que o resto do pessoal… besoirava!
E se a primeira situação acaba por constituir
um grito de alerta e nos obrigar, ao final do dia, a rigoroso exame de consciência
acerca do nosso estado de espírito habitual e da capacidade de dominarmos os
passos do nosso existir quotidiano, revela-nos a segunda um outro ‘drama’ que consubstanciamos
na frase «Não tenho tempo para nada!» e a que Michel Quoist retorquiria
prontamente: «Tens muito tempo à tua disposição, mas passas o tempo a perder o
teu tempo». (Construir, Livraria
Morais Editora, Lisboa, 1965, p. 123).
Publicado no quinzenário
Sem comentários:
Enviar um comentário