– A senhora não beba dessa água!…
Quantos anos tem?... 50?... Se quer viver mais 50, não beba dessa água, beba
água da torneira!
Não consegui ouvir contar das
aldrabices que, em seu entender, envolviam o negócio das águas engarrafadas; entretanto,
chegámos ao Monte Estoril e a senhora saiu.
Também nós cá em casa éramos partidários
da «água da torneira». Defensores incondicionais, até que sucederam dois casos.
O primeiro: terem detec tado os fiscais da Águas de Cascais uma rotura no
cano que, da boca-de-incêndio, levava ao meu contador. O cano estava na base do
muro do quintal e, por isso, disseram-me (nada foi comunicado por escrito,
registe-se) que eu tinha de mandar reparar a rotura e, caso não fizesse tal
diligência dentro de quinze dias (pareceu-me que foi quinze dias…), corria sério
risco de me virem cortar o abastec imento.
A mim a rotura não me preocupava nada, porque quem estava a perder era a Águas
de Cascais, uma empresa privada. Não quis, porém, criar conflitos e, dolorosamente,
lá paguei ao canalizador e ao pedreiro e os telefonemas vários que tive de
fazer para virem fechar a água, para virem inspeccionar, para virem abrir…
Confesso, todavia, que me assustei
ao ver o estado lastimoso em que se encontrava o cano por onde, até essa altura
e desde a década de 60, passava a água que a família bebia, crianças e adultos.
Chama r àquilo ferrugem seria usar um
termo delicado.
Há semanas (é o outro caso), uma
vizinha apercebeu-se de que deveria haver uma fuga de água junto ao seu portão.
Cidadã como é, telefonou para a Águas de Cascais. Vieram uns senhores, confirmaram,
abriram vala, puseram nova manilha de junção, uma torneira e… abalaram, sem tugir
nem mugir. Passaram uns dias e tudo continuava na mesma: a rotura, acrescida
dos naturais inconvenientes de um passeio inutilizado por onde passam os
utentes da clínica próxima, crianças, um carrinho de deficiente, as pessoas,
enfim!... Tirei-me de cuidados e, com esta mania – que cada vez vou tendo
menos, confesso… – de ser cidadão interveniente, contactei a Águas de Cascais.
E vim a saber que era à proprietária que competia agora continuar o arranjo e
suster a rotura (que, repita-se, a ela nada incomodava enquanto rotura, porque
quem estava a perder era a Águas de Cascais). Pasmei! «Então e ninguém diz
nada? Ninguém informa? Ninguém explica em que lei se baseia para imputar à senhora
os custos da reparação de uma rotura antes, até, da boca-de-incêndio?». «É
assim». É assim. Perante o perigo para os transeuntes, optámos por mandar fazer
a obra. Pagamentos aos pedreiros, ao canalizador, telefonemas… Ainda se apelou
para a companhia de seguros. Ná! O agente dos seguros foi peremptório: «A
rotura acontec eu antes do contador;
por sinal, até antes da boca-de-incêndio e, portanto, é à Águas de Cascais que
compete o pagamento!». Desistimos, porque com a Águas de Cascais, já sabíamos, não
vale a pena dialogar. É assim e… prontos!
O
mais interessante foi o que vimos e essa a razão primordial desta nota: o
interior do cano que ligava à boca-de-incêndio era uma ferrugem pegada!... Por
ali passava, pois, a água que se bebia! Ficámos horrorizados.
E, por muito que me custe, não dou razão ao senhor de cabelos brancos
(como eu), que, às 13.15 horas do dia 21 de Setembro do ano da graça de 2012,
incitava a passageira sua desconhecida a beber água da torneira.
Publicado em Jornal de Cascais, nº 323, 10.10.2012, p. 6.
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