quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Os papéis do dia-a-dia

            Quando, em Outubro de 1967, ingressei no corpo redactorial de Jornal da Costa do Sol, iniciei-me de imediato numa prática que hoje se classificaria de «ecológica» e que, nessa altura, obedecia apenas à necessidade de evitar o desperdício e poupar nas despesas.
            Dactilografar os textos ainda não era corrente e, por isso, havia na redacção resmas de papel utilizadas de um só lado (circulares, folhas de agências noticiosas, publicidade…) que serviam às mil maravilhas para as crónicas, as breves notícias, os artigos de opinião, tudo!...
            Era ainda no tempo do chumbo, das linotypes, em que os caracteres eram fundidos um a um ou em linhas e os tipógrafos sabiam bem ler e haviam estudado em escolas profissionais ou feito dura tarimba em oficinas, onde desde cedo se familiarizavam com o granel, o prelo, o linguado… termos, na actualidade, quase caídos em desuso. E desde cedo aprendiam também a necessidade do copo frequente de leite para fazer face aos nocivos efeitos tóxicos do chumbo a derreter…
            Ficou-me o hábito – que diligentemente transmito aos meus estudantes e que, de vez em quando, também noutros contextos, traz surpresas.
Recordo que me mostraram, a 24 de Julho de 1994, o foral novo de Pedrógão Grande, belíssimo exemplar em pergaminho. Para a encadernação, haviam sido usadas folhas de antigo antifonário – a merecerem, pois, cuidadosa análise também.
Uma das muitas histórias em que são férteis as Selecções do Reader’s Digest e que faziam as delícias da minha juventude referia como uma família, ao receber carta de amigos, mais se encantara com o que vinha no verso do que com as notícias escritas nesse papel reaproveitado.
Escusado será dizer que, para mim, rascunho do computador é sempre impresso na página em branco (o «lado b»!...) duma folha utilizada.

Publicado no quinzenário Renascimento (Mangualde), nº 601, 01-10-2012, p. 4.

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