sexta-feira, 17 de julho de 2015

Museu Território de Xisto

             Programas para reabilitar o chamado «Interior» do País não faltam por i. Projectos exequíveis para lhe injectar uma seiva fertilizante também não. Até, por vezes, acontece que desses programas e projectos se lança a primeira pedra. Com pompa e circunstância, como convém. Nomeadamente em tempo de eleições e suas promessas. No entanto, amiúde os prometidos apoios tardam ou mesmo cedo se dissolvem, aninhados no suave conforto de uma secretária qualquer, em acolhedor gabinete com vista pró Tejo, quiçá!...
            Fracassos, porém, não podem ser como as águas tormentosas, que não enchem abismos. Prefiro compará-los às folhas amarelecidas que atapetam o chão, lhe mantêm frescura e, paulatinamente, lhe injectam (elas sim!) bem precioso fecundante.
            No passado dia 22 de Junho, defendeu João Orlindo Marques, na solenidade da Sala dos Capelos da vetusta Universidade de Coimbra, a tese de doutoramento (em Letras, área de História, especialidade de Museologia e Património Cultural) intitulada Pelos Meandros do Xisto: o Património Rural na Freguesia de Vide.
Capa do I volume da publicação
            Ali miudamente se caracteriza o que foi e o que é esta freguesia do concelho de Seia, os valores patrimoniais – físicos e imateriais – que detém e que importa preservar. No fundo, um território cujas características populacionais e económicas não serão muito diferentes das dos que lhe são vizinhos, nesta zona em que as vidas se passam na agricultura e na criação de gado, na montanha e nos vales e onde um olhar mais arguto determinou migrações para as cidades, para franças e araganças, em vista do eldorado gostoso. E pelas terras outrora produtivas deu em crescer o que calhava e o vento trazia… E pelas chaminés das casas típicas já não se esgueira o fumo quente de uma ancestral lareira.
            Que fazer? Cruzar braços, saudar apenas num dar-de-vaia os velhotes sentados à porta, a contarem quantos dias faltam pró Natal?
            João Orlindo propõe que não. E se o aliciar os novos para reocuparem habitações desertas até poderá ser solução perante as crescentes dificuldades citadinas (e o Povo sabe dar a volta por cima, oh se sabe!...), a criação polinucleada de um Museu Território de Xisto poderá servir de bom repositório de memórias, de reencontro de gerações e de costumes, de recriação de uma comunidade que urge cimentar.
            Irrealizável utopia? Vamos acreditar que não!
                                                                                                          José d’Encarnação

Publicado no quinzenário Renascimento (Mangualde), nº 666, 15-07-2015, p. 12.
Reproduzido em Porta da Estrela (Seia), ano XXXVIII, nº 1017, 15-09-2015, p. 14.

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