Impossível não evocarmos a eloquente
passagem de um dos sermões do Padre António Vieira, ao apercebermo-nos que, de
um bloco enorme, paulatinamente, à custa de muito desbastar, sempre com a forma
desejada em mente, o escultor Filipe Curado chegou à pureza das obras patentes
na galeria do Casino até dia 18 do corrente mês de Junho:
«Arranca o estatuário uma
pedra destas montanhas, tosca, bruta, dura, informe; e depois que desbastou o
mais grosso, toma o maço e o cinzel na mão e começa a formar um homem:
primeiro, membro a membro e, depois, feição por feição, até à mais miúda…».
Não,
não foi tanto a figura humana que o seduziu, mas as árvores, a Árvore no seu
enorme poder de, bem presa à terra, torcendo-se, retorcendo-se, alargando os
braços, a tudo resistir, para vir a alcandorar-se, gloriosa, lá num topo. A
lição da Árvore, a lição do escultor, que de monólito de mármore assim criou Beleza!
Natural
de Leiria (1978), Filipe Curado estudou por si e fez há 20 anos a sua primeira
exposição individual na Galeria Nava
Nova, do Instituto Português da Juventude de Leiria. De então para cá, praticamente
todos aos anos, decidiu mostrar o que tem feito. E vale a pena ir ver, na
galeria do Casino Estoril.
Dir-se-á que, no dia da inauguração,
Leiria quis também dar aqui um ar da sua graça, num momento em que, no domínio
do bailado, se alcandora a nível nacional.
Sentíamos nós um íntimo bailado nas
formas assim modeladas. As bailarinas do grupo Staccato tornaram, afinal, explícito o que nós imagináramos.
Durante largos minutos, em túnicas beije, evoluíram por entre as esculturas,
veneraram-nas, sentiram-lhes o génio que delas emanava, deliciaram-se e deliciaram-nos
também. Um momento de surpresa que divinamente se enquadrou no conjunto, a
música a tudo embalar!... Magnífico!
José d’Encarnação
Publicado em Cyberjornal, 2018-06-04:
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