terça-feira, 17 de abril de 2018

A cabeça no ar?

            Quanto me não ralhou minha mãe sempre que eu me esquecia dum compromisso:
            ‒ Cabeça no ar, é o que é! Quando é que vais aprender a ter juízo?
Retirado, com a devida vénia,
da história de Johnny
cabeça no ar
            Acho que algum já terei. Não muito, é certo; mas, se calhar, também ter muito juízo é capaz de não interessar. Se o tivesse, não me disporia a redigir esta crónica, que trata de pessoas desajuizadas. Eu conto.
            Enviaram-me por correio electrónico a informação, com calendário apenso, de que este mês de Maio iria ter cinco sextas-feiras, cinco sábados e cinco domingos. De acordo com uma crença chinesa, dizia, não só essa oportunidade só acontecia uma vez na vida da gente (de 823 em 823 anos!), como era de muito bom agoiro e haveria fortes possibilidades de, em quatro dias, eu vir a encher os bolsos de dinheiro! Achei piada, porque já o ano passado me haviam dito a mesma coisa e… dinheiro, viste-o?!...
            É, porém, tão grande a vontade de se enriquecer facilmente (bastava colar a mensagem no mural…) que nem sequer se olhava para o que nos diziam, assim com olhos de ver. É que o calendário não era o de Maio nem tinha esses tais dias cinco vezes seguidas e, além disso, já em Dezembro passado se verificara essa sequência, que voltará a acontecer em Março do próximo ano e, se Deus quiser, ainda havemos de cá estar.
            Outro caso: uma das minhas vizinhas começou a achar estranha tanta chilreada. Donde é que vem, donde é que não vem… Vinha do contentor do lixo. Alguém pusera lá uma gaiola com três bonitos canários, que, resgatados, foram, naturalmente, distribuídos pela vizinhança. Nem ouso comentar!
            Recorro amiúde aos serviços de uma instituição de saúde, obviamente muito frequentada nos tempos que correm. Há sempre mais anciãos do que eu a entrar ou a sair ou pessoas com canadianas ou senhoras. Gentilmente, porque minha mãe assim me ensinou, abro a porta e deixo passar. Agradeces tu? Assim agradecem eles! A maior parte das vezes nem «água vai!». Outro dia, voltei-me para a menina da recepção:
            ‒ Já viu? Nem boa tarde dizem!...
            ‒ Ah! Sr. José, não ligue! É assim, raramente alguém agradece, quando facilitamos a entrada ou a saída. É assim.
            E dei comigo a interrogar o Bom Senso e a Boa Educação:
            ‒ Por onde é que andam vocês, meus malandros?
                          
                                                           José d’Encarnação

Publicado em Renascimento (Mangualde), nº 729, 15-04-2018, p. 11.

6 comentários:

  1. Milú Balsemao
    Algumas nem bom dia... Enfim!
    Forte abraço para ti.

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  2. Sandra Neves
    Bom dia prof. É mesmo assim que acontece. E eu que estou nas urgências de um hospital...é repetitivo e diário. Enfim…

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  3. Teresa Losada
    Quando isso acontece, sou eu que agradeço; e, mesmo assim, ficam a olhar para mim, sem perceber que é uma chamada de atenção.

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  4. Manuel Fernando Marques Inácio
    E tem muita razão! Na generalidade é assim! Mas... eu, em voz alta, "e bom som" agradeço por eles. Alguns percebem!

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  5. António Silva Pina
    Novo normal...!!! Abraço.

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  6. Luis Maia 18/4 às 18:18
    Precisamente! A educação aprende-se em casa!

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