Era graciosa hortinha, que dava gosto ver. Um projecto camarário ainda por concretizar obrigou ao seu imediato abandono. Cresce a erva, suspira a estrelícia e... mais de dez anos passaram! |
Distracções.
…
Tinha
a equipa de obras 5 pessoas. Uma sofreu um acidente, está de baixa; outra tem
um reumático danado; as três restantes optaram por ir ao médico de família, que
andavam mal da cabeça. Coisas da psiquiatria. O médico de família não podia
passar baixa por essas coisas da cabeça, mas passou. Baixa prolongada.
Distraiu-se. E os 5, uma pechincha a não desaproveitar, porque, pela ADSE,
ganham mais de baixa que ao serviço! Não há equipa para obras? Que se danem!
…
Excelente
oportunidade, aquele espectáculo de lotação esgotada, 200 pessoas. Oferece-se cocktail de boas-vindas e, assim, dão-se
a conhecer os nossos vinhos: tinto, branco, rosé. Distraíram-se, porém, os promotores.
Para 200 pessoas, uma senhora só, por mais eficiente que seja, é pouco. Formaram-se
filas. Rosé tem de ser bem fresco – e esqueceram-se de mais recipientes com
gelo.
No
recanto do átrio espalharam-se três mesas de pé alto para os pratinhos dos
salgados. Olha, é óptima para nos encostarmos à conversa! E as duas senhoras plantaram-se
ao redor da mesa, acompanhadas por um cavalheiro que puxou do telemóvel e o pôs
ao lado dos pratinhos, tranquilamente a ver as mensagens… As senhoras na
conversa. E os convidados pediam licença para tirar um salgado. E as senhoras,
concentradas na conversa e distraídas do cocktail
para 200 pessoas, não arredaram pé, até que a porta do teatro abriu.
…
Entre
as mensagens que me pedem para divulgar há os call for papers. As
revistas ou os organizadores de reuniões científicas utilizam a Internet para
publicitarem as edições ou os temas das reuniões e a sua calendarização. Apelam,
por isso, a quem se disponibilize com um artigo ou comunicação, o que, em inglês,
se diz paper, «papel» – que é, aliás,
cada vez menos papel e mais escritas no mundo digital.
Já
sei que, embora me dê ao trabalho de pôr no «assunto» o título certo e mude
para português de gente tudo o que é «flyer», «call», «info sheet»,
«newsletter», «abstract», «website» and
so on (que quer dizer: etc.), já sei que tenho de estar muito atento, pois
é assaz frequente que amigos meus aproveitem a boleia do título e, até,
mantendo o que lhes enviei, me escrevam a tratar de um assunto pessoal que nada
tem a ver com o «subject» (leia-se «assunto») em epígrafe. Distracções! Ou será
preguiça? Ou um viver bem apressado, não tenho tempo para nada, isto é um
horror!...
Confesso,
porém, que pasmei outro dia. Já não tenho idade para pasmar; mas desta vez
pasmei mesmo e até perguntei ao meu amigo se fora ele que escrevera. É que eu
anunciara (também em título) um desses call
for papers (claro, pus «chamada de colaborações»…); ¿ e não é que esse
amigo, que até é licenciado há um ror de anos e ocupa cargo de
responsabilidade, me respondeu assim:
“José,
agradeço .houve este ano enviar .conta comigo.um abraço”
Tal
e qual. Com os pontos onde estão e este «houve» que deve ser algo como «eu vou»
disléxico!...
Uma
linha só e sem qualquer sentido. E para mim que nada tenho a ver com a revista
anunciada!... Fiquei altamente preocupado, confesso.
E
distracções destas eu presencio às dezenas todos os dias.
Onde
é que vamos parar?
José d’Encarnação
Publicado em Costa do Sol Jornal (Cascais), nº 229, 2018-04-11, p. 6.
Julia Fernandes 12/4 às 10:02
ResponderEliminarTriste a história do velhinho e da horta. Há gente sem coração.
Maria David 12/4 às 16:57
ResponderEliminarBom artigo, como é habitual.Tudo automatizado, aliás cada vez se pensa menos, ouve menos, mas muito se fala... sem nexo.
Maria Isabel Sousa Pereira 13/4 às 10:20
ResponderEliminarTudo acaba vítima do descuido...
Fernanda Gonçalves
ResponderEliminardomingo, 15 de Abril de 2018 00:14
Meu caro amigo,
Que maravilha, adorei os textos, tão reais e fantásticos. Parabéns pelos textos e por partilhar comigo a real sabedoria do escrever bem.
Adorei a cruel realidade do exposto de forma tão sábia.
Vou publicar.