Em sítios assim, corriam as palavras e os sonhos que eram só nossos... |
O
ciclo da aldeia. O varejo da azeitona, a apanha dos tortulhos, o voo da
cotovia, o primeiro sinal do cantar do cuco (ai, os tortulhos «cuquedos» que já
não prestam!…)… O desejo de um melhor viver para anciãos e não só. Os poços que
são ratoeira e que importava sinalizá-los ou vedá-los. As noites de lobisomens,
as bruxarias. O ronronar das gatinhas meigas, uma companhia quando outras já
vão faltando. A importância enorme dos animais domésticos. As moças bonitas da
cidade («Teus olhos é que me matam!»). As festividades tradicionais.
O
mundo está, todavia, ali. Não apenas os versos de António Salvado ou as letras
dos fados de Ana Moura, mas a tragédia do Chapecoense, o horror da estrada de
Pedrógão Grande, a busca dos pokemons, o Marcelo que aparece agora todos os
dias…
Se,
ao longo das páginas destas «Digressões Interiores 2» (edição de Palimage, 2017), com 59 crónicas, de 2011 a Julho de 2017, João
Roque não hesita em empregar a típica terminologia aldeã – atitude de muito aplaudir!
– o certo é que não resistiu a, na crónica 52 (p. 219-222), esboçar eloquente
glossário de termos próprios dali. «Chicolate», «braboleta», «linterna» serão,
por exemplo, formas que noutras regiões se encontrarão, como deformação oral, mas quem há aí que saiba que escamunguer é
estragar ou que infoucedo é… um fraco? O que o Povo sabe!...
José d’Encarnação
Publicado em Renascimento
(Mangualde), nº 728, 01-04-2018, p. 11.
Um texto português, para que os Portugueses reflictam sobre o que fomos, somos e desejariamos ser, à margem de "Acordos" e desacordos...
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