Espectáculo
singular, donde não pode sair-se indiferente: ou se gosta ou se detesta.
Instantâneo do espectáculo. Foto: Casino Estoril. |
Escrevi
«espectáculo» e não «concerto». Concerto foi, sem dúvida; eu acentuaria, porém,
a sua vertente global. Tivemos o Rui ao piano, o motor da engrenagem; tivemos
os seus cinco companheiros, cada um a proporcionar-nos estranhos sons indizíveis:
Sim,
havia instrumentos de cordas: Bernardo
Fesch no baixo, Daniela Silva
no violoncelo, e Rui Moreira na
viola arco; havia as baterias e toda uma parafernália de percussão (Sandro Mota e João Cunha); mas os sons – perfeitamente
caldeados num grande apuro da sonoplastia, a cargo de João Paulo Nogueira – casaram mui harmoniosamente com os jogos
de luz, sob a maestria de Nuno Salsinha. Por isso, foi espectáculo, genialmente
urdido. Admiramos as sombras chinesas – que, amiúde, desaparecem executantes,
desaparecem instrumentos e há apenas sugestões em pano de fundo para que, com
maior intimidade, nos deixemos enlevar e envolver num mundo quase exótico,
etéreo, galáctico… Para outros mundos vamos…
Voluntariamente,
creio, não foi distribuído programa, não nos explicaram donde vinham os sons,
embora ousássemos identificar a pureza do xilofone, o suave passar dos dedos por
harpejos ou as carícias em rude bilha elevada ao estatuto das sonoridades
novas… Dizem que assim se penetra num mundo «neo-clássico», por o músico ter
partido da música dita clássica e a ter vestido de novas roupagens. «Neo-clássico»
grafado com hífen, para se não confundir com o Neoclassicismo antigo. Certo é
que – como sempre – a inovação tem
as suas fundas raízes e não podem fazer-se trechos assim sem um domínio
perfeito da arte dos sons.
Li
que Rui Massena explicara, a propósito de uma das suas iniciativas, que
«Abraço, Estrada, Alento, Liberdade, Dúvida, Borboleta, Amanhecer, Meditação e o Renascer» eram, para ele, «algumas das
emoções traduzidas em sons». É-nos, de facto, impossível não comungar com os
músicos, nesse ambiente onírico em que se movem. E todas essas são, não há
dúvida, emoções que nos invadem.
Gosta-se
ou detesta-se. Eu gostei e aplaudi!
José d’Encarnação
Publicado em Cyberjornal, 09-05-2018:
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