terça-feira, 23 de janeiro de 2024

David Pedro Inácio (1932-2024)

           David Pedro Inácio, canteiro, natural do Corotelo, onde nasceu a 29 de Abril de 1932, faleceu no passado dia 3 de Janeiro. Residia em Cascais desde Agosto de 1945, para onde foi praticamente pouco tempo depois de ter feito a 3ª classe. O pai viera já antes para trabalhar nas pedreiras e foi com ele que aprendeu o ofício, tradicional já na família.
Na breve biografia que ele próprio redigiu para o seu primeiro livro de versos, Chamaste-me Rouxinol, que a Associação Cultural de Cascais lhe publicou em 2008, escreveu:
«Aprendi um ofício muito penoso. No Verão, fazia muito calor; no Inverno, muito frio... Enfim, os anos foram passando, com maior ou menor dificuldade. Fui casado, fui feliz».
 A prematura morte da esposa, em 1998, terá despertado nele não apenas a saudade da sua ausência, mas também, com ela, a vontade de se exprimir em verso, decerto algo que lhe ia já na alma corotelense. Ele o confessa:
«Nunca tinha pensado em escrever poemas mas quis o destino que isso, um dia, acontecesse.
A história é simples.
Foi num lindo dia de Agosto de 2001, enquanto eu assobiava no jardim de uma grande amiga que tenho, que ela, ao ouvir-me, me chamou rouxinol. Foi nesse momento que me inspirei e daí nasceu a vontade de escrever o meu primeiro poema, ao qual dei o título “Chamaste-me rouxinol”. Desde esse dia, não mais parei de escrever. Alguns dos poemas que escrevi dediquei-os a ela e também a muitas amigas que tenho. Todas autorizaram que eu publicasse os poemas que lhes dediquei; por isso, para todas vai o meu muito obrigado e um abraço cheio de carinho. Bem hajam!».
Passou os seus últimos anos no centro de convívio da Associação dos Idosos de Santa Iria, em Murches, e depois desse 1º livro, publicaram-se Na Cadeia dos Teus Braços (Novembro de 2019) e A Árvore da Vida (Abril de 2022). Vem neste o poema «Despedida», de que se transcreve esta quadra:

                                    Bem longos anos de vida 

                                    Estou agradecido a Deus

                                    Um abraço de despedida

                                    Família e amigos meus

            Apesar de viver longe, jamais esqueceu a sua terra natal, que lhe mereceu bastantes versos, de que ora se destacam estes:

            Algarve é a minha terra

            Alportel o meu concelho

            Fica à beirinha da serra

            A sul do Barranco Velho

                                    Vou escrever de certeza

                                    E o que eu escrevo é fiel

                                    Para oferecer à beleza

                                    Que é São Brás de Alportel.



            Que descanse em paz quem assim soube manter a tradição corotelense: o trabalho da pedra associado ao gosto pelo versejar quase espontâneo, ao jeito do António Aleixo.

                                                           José d’Encarnação

Publicado em Notícias de S. Braz [S. Brás de Alportel], nº 326, 20-01-2024, p. 13.

Com o presidente da Junta de Freguesia de Alcabideche, no dia do lançamento do seu último livro

terça-feira, 16 de janeiro de 2024

Belezas ignoradas


 
          O meu primeiro despertar para a infinita beleza da fauna e da flora resultou da leitura, ainda em plena juventude, do livro Belezas Ignoradas, do Dr. Tihamér Toth (Coimbra Editora, 1958), especialmente dirigido aos seus «jovens leitores», nomeadamente escuteiros.
Dei comigo – recordo-me – a admirar, por exemplo, a vida das formigas, a imensa variedade de formas de folhas e de flores, a maravilha que é verificar como essas folhas e flores se movimentam em função da luz.
 Na escola, pasmei quando vi, pela primeira vez, a imagem da welwitschia mirabilis, essa planta rasteira que logra sobreviver na seca agressividade do deserto do Namibe. Maravilha para que, no seu habitual postal de boas-festas deste ano, o Doutor Jorge Paiva chama a atenção, dadas suas características ímpares.
Jorge Paiva descreve-a assim:
«É um autêntico bonsai natural, por ser uma planta lenhosa com o tronco atarracado (aborta o crescimento apical inicial e o tronco passa a crescer perifericamente), apenas com duas grandes folhas (rasgadas longitudinalmente) de crescimento contínuo […]. Não é mais do que um pinheiro anão e atarracado, só com duas folhas grandes».
Quem diria?
Aliás, desta feita, Jorge Paiva só aparentemente é que deixou de parte o seu pendor combativo. Preferiu um combate pela positiva, referindo o que, como botânico,  o foi maravilhando nas suas inúmeras viagens de estudo.
«Encantaram-me as plantas epífitas com uma única folha apoiada horizontalmente nos ramos das árvores, para, assim, receberem o máximo de radiação solar».
Tenho em casa e no jardim três ou quatro variedades de orquídeas, uma flor de mui fascinante beleza. E diz Jorge Paiva: «Muita gente não sabe que temos cerca de 60 espécies de orquídeas nativas em Portugal, todas terrestres e vistosas».
Que maravilha!
Nada melhor, de facto, para nos consciencializarmos de quão importante é a biodiversidade para a saúde plena do nosso planeta.
Pormenores são, não há dúvida, mas de significado maior.
E bem anda o Doutor Jorge Paiva por, pontualmente, em cada Natal, fazer questão em no-lo recordar. Estamos-lhe gratos por isso!

                                                                             José d’Encarnação

Publicado em Renascimento [Mangualde], nº 858, 15/01/2024, p. 10.

 Post-scriptum: as fotos a que infra se alude.


Welwitschia mirabilis feminina. Angola, Deserto de Namibe 08.08.2007

Welwitschia mirabilis feminina. Pinhas com sementes aladas. Angola. Deserto, entre Namibe e Virei  18.05.2013
Sementes aladas de Welwitschia mirabilis


quinta-feira, 4 de janeiro de 2024

O Grupo Coral dos Amigos do Museu

            Começou por haver o espaço magnífico, um solar nobre, digamos assim, de que urgia usufruir. Depois, um sacerdote encarou o seu múnus pastoral como de promoção humana também, no seu todo, envolto sempre no halo de Beleza, apanágio da divindade. A beleza física, concreta, dos objectos e das pessoas; a beleza espiritual consubstanciada, por exemplo, na música, tão presente sempre nas cerimónias litúrgicas.
            Decidiu, então, o prior que o espaço magnífico que fora disponibilizado à comunidade poderia ser museu. Vira, por exemplo, como o vestuário rapidamente evoluía. Efémeras eram as modas e muitos ‘trapos’ acabavam por se perder. Daí, o Museu do Traje. Daí, concomitantemente, o acordeão. Ai, a magia do acordeão! Olá, Eugénia Lima!
            E o Museu do Traje de S. Brás de Alportel aí está. Mostra, sim, velharias prestes a desaparecer do uso comum, carros de atrelagem usados por nossos bisavós… Tudo!
            Há, porém, uma fascinante característica: o museu é congregação! Chama-se-lhe «museologia social», por constituir elo de ligação, tão necessária hoje na sociedade são-brasense, onde o elemento forasteiro ocupa lugar de relevo, inclusive pela sua vontade de aproveitar a vida.

Natural, pois, que tenha nascido a Liga de Amigos do Museu e, nela, o Grupo Coral.

            De três vozes mistas – sopranos, altos e vozes masculinas – conta, actualmente, com 18 elementos, que, resultado da sua multinacionalidade, raramente estão todos juntos, devido a os membros passarem o seu tempo entre o país de origem e Portugal. Há sempre, no entanto, um núcleo suficiente para continuar a actividade.

Sob direcção do maestro António Manuel Maria de Jesus, apresenta o coro um reportório diversificado, a abranger vários períodos, estilos e compositores desde o barroco até aos contemporâneos, de diversos autores e países. Cantam, em várias línguas, música sacra, não sacra e popular portuguesa, sendo a predominante a música sacra.

Um grupo de amigos apaixonados pelo música coral, vindos de todo o Algarve Central, que reúne às quintas-feiras no Museu do Traje. Uma mais-valia a jamais perder!

 

                                 José d’Encarnação

Publicado em Notícias de S. Braz (S. Brás de Alportel), nº 325, 20-12-2023, p. 17.