quarta-feira, 19 de maio de 2021

Em prol da língua portuguesa

            Celebrou-se, a 5 de Maio, o Dia Mundial da Língua Portuguesa, na sequência de uma decisão da UNESCO em Novembro de 2019.
A língua mais falada no hemisfério sul e a quinta no Mundo merece, pois, essa honra e que nós, os seus falantes, nos habituemos a logo verter para português os termos ingleses que enxameiam textos, anúncios, programas… Que ponhamos a mão na consciência e saibamos rapidamente escolher as palavras mais adequadas – nossas! – para baptizar as novas realidades.
E, por falar em baptizar, lembrei-me de dois casos, por ser no baptismo que se escolhem os nomes para os neófitos.
O menino nasceu no ano em que o cometa Halley nos visitou (1986). O pai quis perpetuar a ocorrência dando ao filho o nome do astro, na perspectiva de ele o poder ver daí a 76 anos. No registo brasileiro, porém, era proibido, na altura, escolher nome com consoantes duplas. Então, o pai mudou para Harley, por sinal, sem o querer, o nome da famosa marca de motas. Por isso, quando lhe perguntam o nome, Harley, pintor da construção civil, responde sempre:
– Harley, como o nome da mota!
E lá se foi a evocação do cometa!...
       Um outro colaborador nosso, electricista, tem cafuso no endereço electrónico. Cafuzo? – perguntei-lhe. E a situação fora esta: quando moço pequeno, ao ver os mascarados do Carnaval, homens vestidos de mulher, outros mascarados de bichos… tudo isso, dizia ele para os amigos, «tudo isso me deixa muito cafuzo». Confuso queria ele dizer. E Cafuzo ficou a ser o seu nome artístico: Nuno Cafuzo!...
            Não soubéssemos nós a história dum e doutro, bem andaríamos às aranhas à procura de bem estranhas etimologias!
 

José d’Encarnação

 
Publicado em Renascimento (Mangualde), nº 799, 15-05-2021, p. 11.
 
 Post-scriptum: Pela Cartilha Maternal se aprendia a ler, a escrever e a pugnar pela Língua Portuguesa. Obra notável de um pedagogo singular. Aqui se reproduz, com a devida vénia, a capa de uma das edições, que ilustrou o artigo de José Belchior sobre João de Deus na SBA Revista de Cultura, 2, Maio de 2021, p. 14-21.











6 comentários:

  1. Conheço perfeitamente a Cartilha Maternal.

    No Alentejo há apelidos engraçadíssimos que começaram por ser alcunha e ficaram como nome de família.

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  2. Que texto tão interessante, pequenino, mas tão cheio de oportuno sentido. Aqui também se aprende a rir...O pai do Harley foi movido por nobre intenção, que culpa teve de não aceitarem o nome do cometa? Mas teria sido bonito que no dia da celebração da nobre Língua Portuguesa, já tivessem erradicado o malvado Acordo Ortográfico, que tem causado tanto dano como as ervas daninhas dos estrangeirismos. Por causa de um e das outras, por aqui anda tudo muito cafuso...

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  3. Esqueci-me de escrever sobre a Cartilha, por onde aprenderam a ler e a escrever algumas pessoas muito próximas. Merecia-me, pelo menos por isso, uma simpática referência. Muito grata pelo texto

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  4. Há uns anos atrás houve legislação ( penso eu) que quis pôr limitações aos anúncios em inglês que surgiam por todo o Algarve....isso teve alguns efeitos na altura ...E agora ? O meu café esplanada no paredão era o Jonas ....agora é SUN!!!!

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  5. Também partilho da aversão a toda essa «inglesice» (quando não «americanice») que por aí pulula, sem nexo, sentido ou necessidade. Subserviência, mania de armar em estrangeirado... venha o Demo e escolha. Que dizer, até, dos «Valentine's Day» ou do «Halloween», com muitas culpas para professores de Inglês que, na sua ânsia de promover a disciplina, importam essas festividades, com essa mesma denominação, para práticas festivas nas escolas portuguesas... Enfim, amenizando a conversa, sempre lhe deixo aqui mais um exemplo de um nome assumido por um chefe de serviço, dos meus «tempos heróicos», a quem passamos a denominar «Mandarelhos», apenas porque, certa vez, decidiu emendar uma nota de serviço de um subordinado, trocando o correcto «mandar-lhos-ei» por esse, concelebrado daí para a frente, «Mandarelhos». Grande abraço.

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  6. Julia Franco, 19 de maio às 11:22

    Sorri ao ler o seu texto...
    A nossa Língua tem vindo a ser invadida de estrangeirismos 😞... Assim como queiram que sejamos alguma peça ou funcionalidade informática...

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