Decerto se ouviu
de novo, com emoção, tanto no 25 de Abril como no 1º de Maio, o grito «Fascismo
nunca mais!». Um bom desejo, de facto – para nós, Portugueses, e para o mundo, quando,
agora, se vai sabendo de tantos fascismos por esse planeta além, tanta tortura
e mortandade!...
Reencontrei,
há dias, a Genoveva.
– Então, já
temos novidades em relação à casa?
– Oooh!... Nunca
mais disseram nada! Garantiram-nos que voltariam para ver o estado em que se
encontra e nada. Nunca mais disseram nada!
«Nunca mais!».
O desalento estampado no rosto de quem dispõe de casa pertencente a um
departamento do Estado, em mui precárias condições de habitabilidade. Aquando das
grandes chuvadas, o telhado abateu. Lá se conseguiu, depois das mais variadas diligências
e empenhos, que uns senhores viessem ver o que se passava. Que voltariam, disseram.
Não voltaram. Não deixaram contactos. E Genoveva, já septuagenária, o marido
com alzheimer, espera. Desespera!
Quando por i tanto
se apregoa das casas devolutas, quantas do Estado e de instituições públicas não
conhecemos nós!...
Mas, confesso,
o que me doeu foi esse «nunca mais» embrulhado na mais profunda melancolia e
desvontade de viver assim!...
Claro, também me
lembrei daquela tarde em que, regressado da pedreira, ao saber que eu pregara
mentira da grossa, meu pai pegou no cavalo-marinho e ameaçou, com voz grossa:
– Tu nunca mais
me voltas a mentir, ouviste?
O
cavalo-marinho era um pedaço de pneu de camioneta, preparado em jeito de
chicote, que pendia atrás da porta. E meu fofo bem sabia quão doloroso ele era!
Preferia que Genoveva
me tivesse respondido:
– Ainda não vieram;
mas lá virão decerto.
Gostava que esse
«ainda não» reflectisse réstias de esperança. E que, aliás, de semblantes
carregados, olhares tristes, a expressão «nunca mais» começasse a ser visceralmente
banida, substituída por um sorridente «ainda não». E não é que – com esse, mais
suave, ‘ainda não’ – até nos sentiríamos melhor?!...
José d’Encarnação
Publicado em Renascimento (Mangualde), nº 844, 15-05-2023, p. 10.
Ho impiegato un bel po' di tempo per capire tutto, almeno spero, ma è molto toccante quello che scrivi.
ResponderEliminarCaramente. Eugenia