Em entrevista de Alexandra Prado Coelho, publicada no passado dia 5, a cantora mexicana Lila Downs não teve receio em afirmar: «O idioma é uma arma de poder». Por isso, sempre insistiu em cantar na sua língua; e a entrevistadora sublinhou, na síntese inicial:
«Há línguas a desaparecer – e com elas perdemos ideias, poéticas, formas de entender o mundo. Mas há outras que resistem e se reforçam. Manter viva uma língua é uma forma de resistência».
Hoje,
nomeadamente em relação a textos científicos, exige-se publicação em inglês,
sob pretexto de ser uma língua supostamente ‘universal’ que todos entendem. É
um erro crasso.
Primeiro,
porque há conceitos que só na língua autóctone se conseguem expressar.
«Saudade», como se sabe, é o exemplo maior.
Segundo,
porque – por melhor que se conheça a língua inglesa – há frases idiomáticas que
não têm tradução precisa. Sabe-se que mesmo os cientistas ingleses estão a
ficar preocupados pela contínua adulteração que se está a fazer da sua língua,
devido ao seu mau uso. A possibilidade de a chamada ‘Inteligência Artificial’
se arrogar o privilégio de tudo traduzir mais veio agravar o problema. E nunca
será de mais recordar a cena em que se escreveu ter ido um professor fazer uma
conferência a Thin Point, que é como diz… a Ponta Delgada!...
Ser
uma arma de poder já temos bastos exemplos disso.
Aquando
da invasão de Timor pela Indonésia, a primeira medida dos invasores foi proibir
o ensino do Português nas escolas. Quando a Rússia (onde se usa o alfabeto
cirílico) se apoderou da Moldávia romena (que usa o alfabeto latino, pois o
romeno é uma língua latina), a preocupação foi ao ponto de até os epitáfios dos
cemitérios terem sido quebrados, a fim de os dizeres serem substituídos: tudo o
que era vestígio de soberania, memória, património precisava de ser extirpado!...
Curiosamente,
em relação a este país, atitude contrária teve Ceausescu que não hesitou em
reabilitar, em Adamclisi, o Trophaeum Traiani, monumento que, nos primórdios
do séc. III, o imperador romano Trajano mandara erguer para comemorar a vitória
sobre… os Dácios! Agora, eram os actuais Dácios que queriam mostrar-se latinos!
José
d’Encarnação
Publicado no jornal Renascimento (Mangualde), nº 876, 20-03-2025, p. 10.
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