terça-feira, 17 de julho de 2012

Património e Turismo Cultural, binómio indissociável


            No quadro do XI Congresso Internacional de Reabilitação do Património Arquitectónico e Edificado que brilhantemente foi organizado na vila de Cascais e que lhe valeu, também por isso, ter sido eleita para sede europeia do CICOP (Centro Internacional para a Conservação do Património), realizou-se na sexta-feira, 13, durante todo o dia, na sala da música do Museu Condes de Castro Guimarães, o seminário «Património e Turismo Cultural, um binómio indissociável? – Um tema de reflexão», coordenado pela Dra. Simonetta Luz Afonso.
Assistiram cerca de vinte congressistas – haja em vista que as sessões eram simultâneas e se distribuíram por diversos locais.
Coube à coordenadora abrir a sessão, invocando três acontecimentos que, em seu entender, deixaram profundas marcas a mostrar que o investimento na Cultura contribui eficazmente para melhorar a imagem do País e, consequentemente, se deve assumir como indispensável e não menosprezável factor de crescimento económico: a Europália, realizada na Bélgica, em 1991, com Portugal como país-tema; Lisboa, Capital Europeia da Cultura (1994); e a Expo’98. Em todas elas, Simonetta Luz Afonso teve intervenção importante, como se sabe. Referiu, a título de exemplo, que data dessa década o interesse pela arquitectura de museus e o despertar da necessidade de haver preparações específicas dos agentes turísticos na área cultural, dado que, ainda que não se deva pensar em construir um mundo para o turismo, o certo é que 40% dos visitantes de Portugal vêm cá por motivos culturais e hoje, em que pode trabalhar-se em qualquer parte do mundo e, por outro lado, os turistas gostam é de sentir o viver da população local, a atenção das entidades governamentais e dos operadores turísticos tem de ter em conta essas vertentes.
            António Lamas – que preside à Sociedade Parques de Sintra, Monte da Lua, S. A., uma empresa criada em 2000, de capitais exclusivamente públicos e que não recebe contribuições do Orçamento do Estado – deu conta de como é gerir, equilibradamente, os recursos ao seu dispor. Referiu que, se um turista pensa estar 3 dias em Lisboa, reserva um para ir a Sintra; por isso, há que proporcionar-lhe aliciantes e isso se está a fazer, nomeadamente após se terem reabilitado a Casa de Monserrate, o palacete da Condessa de Edla, vários outros edifícios em ruínas e, de modo especial, o espaço envolvente: identificaram-se, por exemplo, 53 000 espécies arbóreas!... Acentuou que um dos segredos estava na atenção dada às pessoas, à motivação incutida nos seus funcionários e colaboradores, em que se incluem reclusos e jovens das CERCIs e, na central telefónica, pessoal de mobilidade reduzida. Registe-se que todas as obras e, inclusive, as escavações arqueológicas efectuadas estiveram abertas ao público, como motivo de atracção.
            Andreia Aires de Carvalho Galvão e José António Ribeiro Mendes apresentaram a rota dos mosteiros portugueses património da Humanidade: Jerónimos, Alcobaça, Batalha e Convento de Cristo. Andreia Galvão falou muito depressa, apresentou generalidades e da sua intervenção ressalte-se a importância de se produzirem conteúdos válidos para acompanhar essas visitas. Ribeiro Mendes, por ser da área das TIC (Tecnologias de Informação e Comunicação), hoje na moda, dissertou sobre o papel da Internet, designadamente porque muito se faz através da informática e, antes de partir para um destino, o turista é capaz de o visitar virtualmente; daí, de novo, a relevância que há em fazer uma boa gestão dos conteúdos a disponibilizar. Sublinhou que, de acordo com as estatísticas, disponíveis, 33% dos turistas se deslocam por terem consultado a Internet, 25% devido à publicidade boca a boca, 14% para rever sítios já anteriormente visitados e apenas 17% por acção de agências de viagens. No caso desta rede mosteiros, o slôgane poderia ser «mil anos de sabedoria» a descobrir! Na verdade, o viver uma experiência constitui cada vez mais um atractivo a fomentar.
            De tarde, Manuel Sande e Castro Salgado relatou a feliz experiência em curso no Bairro da Mouraria em Lisboa, um programa de desenvolvimento comunitário que está a dar excelentes frutos. Sob o mote «Há vida na Mouraria!», são quatro os eixos em que o programa se desenvolve: «revitalização do tecido económico local; melhoria da qualidade de vida dos idosos; promoção do acesso ao emprego, saúde e cidadania das populações vulneráveis, nomeadamente trabalhadoras do sexo, toxicodependentes e sem-abrigo; e a promoção do fado como factor identitário». Uma experiência notável!
            Virgílio Gomes, docente de História da Alimentação na Universidade Nova de Lisboa e interveniente em muitas experiências ligadas à Gastronomia (colaborou, por exemplo, com a Dra. Simonetta na escolha das ementas típicas portuguesas para o Pavilhão de Portugal na Expo), demorou-se na explanação do enorme papel que hoje a gastronomia tradicional detém no quadro da promoção turística. Demorou-se, mas não cansou, tão interessante foi o testemunho que nos trouxe. Preconizou o maior rigor na apresentação das iguarias – sobretudo se se tiver em conta que a gastronomia é considerada património imaterial (foi, por exemplo, classificada como património cultural a refeição gastronómica dos franceses e o México apresentou uma candidatura em que o milho, o feijão e as pimentas eram os principais condimentos… Criticou o facto de os restaurantes não darem a primazia, nas suas ementas, aos vinhos locais e regionais. Falou da alheira, da canja (trazida do Oriente por Garcia de Orta). Uma lição de grande alcance. Aliás, o professor pode ser visitado em http://www.virgiliogomes.com – onde há também muito para aprender!
            A Bruno Mota Martinho fora dado como tema «O turismo e o património cultural edificado em contexto urbano e na gestão das cidades». Perdeu-se, porém, num emaranhado de concepções teóricas, ilustradas com diapositivos abstractos cujo significado (decerto) escapou a boa maioria dos ouvintes; falou depressa, monocordicamente e, no fim, mesmo apoiando-nos no extenso resumo da conferência que nos foi facultado, recheado de frases bonitas, ficámos com a ideia de que o que preconizava era, fundamentalmente, «a criação de corredores contínuos e coerentes de oferta cultural e turística». Nesse aspecto, Belém poderá ser um bom exemplo (digo eu); mas o conferencista quiçá não se tenha apercebido também do ‘corredor’ em que se encontrava, na vila de Cascais, onde se criou, na verdade, um núcleo cultural da maior relevância, a abranger a Cidadela, o Palácio da Presidência da República, o Centro Cultural, a Casa de Santa Maria, o Museu dos Faróis, a Casa das Histórias e o Museu do Mar, tendo no meio o amplo e bem agradável Parque Marechal Carmona. E quanto ao património cultural edificado em contexto urbano nada soou, que eu me tivesse apercebido.
            A terminar, já quase em cima da hora de fechar (e foi pena!), Miguel Fialho de Brito veio falar das «novas redes de promoção». Atrasados como estávamos, poderia ter deixado a história do turismo, o diário da viagem a Portugal e a Espanha do senhor W. Beckford (1787-1788); e só quase no fim nos trouxe aquilo que nos interessava: como é que as redes de estudantes ERASMUS constituem doravante um excelente meio de promover o País e a mobilidade. Temos 8000 estudantes ERASMUS em Portugal, o que representa notável capital a não desperdiçar. O portal www.studyinportugal.net  apresenta, em inglês, dez razões para estudar em Portugal e o nosso País é aí apresentado como «a tua porta de entrada para o Mundo»! Sobre isto gostaríamos de ter ouvido falar mais.
            Simonetta Luz Afonso congratulou-se com a jornada e a fidelidade dos participantes.
            O Congresso redundou, de facto, num enorme êxito, com largos ecos, sobretudo se tivermos em conta as múltiplas facetas abordadas por conceituados especialistas de renome internacional. E não é de somenos realçar que no cartão de identificação dos participantes estava incluída uma caneta que contém as actas; ou seja, antes de o congresso se realizar já todas as contribuições estavam disponíveis! Uma ideia genial, mais um motivo para dar os parabéns aos organizadores. Cascais deu cartas, mais uma vez!

Publicado no Cyberjornal, edição de 17-07-2012:

Sem comentários:

Enviar um comentário