quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Um álbum bonito e de elevado interesse histórico no CCC

            Quatro aspectos notabilizam a exposição «Charles Landseer – Desenhos e aguarelas de Portugal e do Brasil, 1825-1826», patente no Centro Cultural de Cascais, com curadoria do Professor Leslie Bethell, da Universidade de Oxford.
            Fruto da eficaz colaboração da Fundação D. Luís I e da Câmara Municipal de Cascais com a Espírito Santo Cultura, do Rio de Janeiro, e o Instituto Moreira Salles, de São Paulo, detentor da colecção, enquadra-se a mostra nas iniciativas que pontuam o «ano» escolhido para consolidar as relações entre os dois países irmãos; e detém particular significado, se considerarmos que os desenhos expostos retratam aspectos da paisagem física e humana de Portugal e do Brasil, nos anos de 1825 e 1826, altura em que se processavam as negociações para o reconhecimento oficial, por Portugal, da independência do Brasil, tendo uma delegação do Reino Unido servido de intermediária, pois, como se sabe, era esse Reino o primeiro interessado em colher benefícios dos bons resultados que viessem a ser obtidos. Saíram esses documentos do génio do britânico Charles Landseer (Londres, 1799-1879), incumbido oficialmente de assim perpetuar o que via vendo e lhe parecia deveras significativo (não havia, ainda, a fotografia…).
            Esse, o primeiro aspecto, portanto: a selecção feita pelo artista, sintoma evidente da sua mentalidade, da sua cultura e, até, da sua vontade de intervir.
            Depois, a excepcional beleza do minucioso traço e do ténue colorido – que quase milagrosamente assim chegou até nós.
            Em terceiro lugar, ainda que sempre se possa especular acerca de um ou outro pormenor, onde, naturalmente, o artista quiçá deu azo à sua imaginação, a missão de que fora incumbido decerto o obrigou a ser o mais rigoroso possível, quando se dispôs a passar ao papel o que presenciava – paisagens, edifícios, pessoas… Por conseguinte, a cena do escravo a ser flagelado é bem capaz de mesmo assim então se passar habitualmente; a mole da Torre de Belém, vista aqui de um ângulo a que não estamos habituados, ou seja, de poente para nascente, tendo ao fundo a margem esquerda do Tejo, vai também merecer, decerto, alguma reflexão por parte dos historiadores de arte (se é que não a mereceu já), porque há pormenores aí bem diversos do que hoje nela se enxerga; o instantâneo dos aguadeiros junto a um dos chafarizes de Lisboa documenta uma actividade bem conhecida, mas elucida melhor que qualquer descrição de como eram os trajos, os pipos, a afluência…
            Houve, finalmente, por parte do Instituto Moreira Salles, a preocupação de preparar, sob proficiente organização de Leslie Bethel, exaustivo catálogo dos mais de 300 desenhos e aguarelas. Desse extraordinário volume ora se fez «réplica», não menos elucidativa e aliciante: o breve catálogo editado pela Fundação D. Luís I, com textos dos intervenientes no processo e reproduções, numa concepção de Nuno Lemos e Rita Ribeiro da Silva (ISBN: 978-972-8986-67-4).
            Trata-se, consequentemente, de bem valiosa iniciativa.
             Muito concorrida a inauguração, no final da tarde do dia 20 de Setembro. Além dos anfitriões (responsáveis pela Fundação), esteve o presidente da Câmara Municipal, que acompanhou na visita o Comissário do Ano de Portugal no Brasil, Horta e Costa, a Presidente da Espírito Santo Cultura, Maria João Bustorff, o embaixador do Brasil em Portugal (Mário Vilalva) e o director executivo do Instituto Moreira Salles (Raul Manuel Alves).
            No final, foi servido um beberete no pátio interior do Centro Cultural.
            A exposição estará patente de terça a domingo, das 10 às 18 horas, até 27 de Janeiro.

Publicado na edição de 2-10-2012 do Cyberjornal:

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