sábado, 18 de maio de 2013

Enxúndia, pachos & rezas

             Sei que nesse domínio há muito quem saiba muito. Lengalengas, rezas miudinhas a imprevisíveis santinhos, que nem constam decerto no rol consagrado pela Igreja. E há que tentar passar a escrito, com urgência, o que as velhotas ainda lembram, não vá o Diabo tecê-las e a memória escapulir-se.
            Dessas rezas não sei. Contudo, tive papeira, como toda a gente, quando era catraio. Minha avó matou a galinha melhor lá da capoeira (melhor para o efeito, já se vê) e tenho a vaga ideia de que, dias a fio, me untou o pescoço com a enxúndia da mesma. Era assim uma espécie de gordura, cheirava mal que se fartava, mas fazia muito bem, curava num instante, garantia minha avó, que isso de ter papeira é um perigo, pode deixar males para o futuro e o mê menino, Deus o abençoe, valha-nos Deus!
            Descobri que enxúndia é palavra clássica, do latim: axungia, nome dado à banha do porco. Não sei se também tinha então virtudes terapêuticas.
            Punha-se assim em pachos (e lembro-me que, um dia, apanhei merecida sova de meu pai e só pedia a minha mãe que me pusesse pachos quentes nas nádegas, para atenuar a dor das nelgadas que mãos calosas me haviam aplicado. Pois também de pacho descobri agora que equivale a parche e que tem igualmente origem latina (imagine-se!): vem de parthicum. Se calhar, mezinha que o Romano aprendeu com os Persas (também chamados Partos). O certo é que se conta de uma saborosa receita romana chamada «pullum parthicum», ‘o frango pártico’. E lá caímos nós na… enxúndia de galinha, outra vez!... Já chega!

Publicado em VilAdentro [S. Brás de Alportel] nº 172, Maio de 2013, p. 10.

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