quarta-feira, 17 de julho de 2013

A identidade

            Era a minha amiga Lourdes a Chefe de Divisão do Ensino. Se a palavra não era «ensino» era algo de parecido e o munícipe sabia logo que era com ela que tinha de tratar dos assuntos relacionados com escolas, o parque escolar, as obras, o apoio social a estudantes carenciados… Era com ela.
            Mas isso de «ensino» era, ao que parece, palavra demasiadamente corriqueira, cheirava, se calhar, a «antigo regime». Hoje, a Lourdes integra a Direcção Municipal de Capacitação e Coesão Social. Ora toma! Isto sim é que são palavras a preceito, o pessoal sabe logo o que é isso de capacitação («És capaz? Tá bem! Não és? Tá mal, vai aprender!). E «coesão social» também deve ser assim um tratado interessante, assim a modos de a gente ir todos para uma manifestação, alugar um autocarro e ir tudo cheiinho, coeso à brava!…
            Perdoe-me, leitor, a minha loucura, mas… quando eu era mais novo, dirigi a página infantil Os Castores num jornal regional. E dei-lhe esse nome, porque achei os bichinhos simpáticos, nessa altura eu andava na Faculdade e lia muitos livros sobre animais que ia buscar à Biblioteca Americana, a única que tinha livros sobre a vida selvagem nessa longínqua década de 60. E, para além de admirar a técnica dos castores de fazerem presas de água, eu achava interessantíssimo que a primeira preocupação da «família» era ‘marcar’ o território com o seu cheiro característico. Esta zona é nossa, pronto, nada de intromissões!...
            Está aí a campanha eleitoral para as autárquicas e o que eu mais aprecio é ver que cada nova equipa que entra muda de imediato não só os nomes das divisões e dos departamentos, mas também o logótipo. No brasão não tocam, que isso mete despacho e parecer da Associação dos Arqueólogos Portugueses; mas lá o logótipo, o letring (leia-se: o tipo de letra…) com que se passa a escrever ‘município’, ‘freguesia’, ‘câmara municipal’… isso tem de mudar, porque manter o que o Executivo anterior determinara era de muito mau gosto, pois então!...
            E assim, num país de desempregados, se vai dando emprego aos designers gráficos, aos criativos… Até as palavras de ordem têm de mudar! «Sabe bem viver em...» – qual quê! Que frase tão pindérica! Temos de inventar outra! Já!

Publicado em Renascimento (Mangualde), nº 620, 15-07-2013, p. 12.

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