sexta-feira, 15 de novembro de 2013

O custo e o valor

            Apercebi-me de que mui louvavelmente se reacende, de vez em quando, a polémica sobre a diferença entre o custo e o valor. Conceitos bem distintos, que se prendem com a dicotomia, mais frequente, entre o ter e o ser.
            Curiosamente, diz-se vulgarmente: «Tudo tem um preço!». Foge-nos a boca para «preço» e poderia, de facto, na mesma ordem de ideias, afirmar-se que «tudo tem um valor». Neste caso, porém, quer realmente acentuar-se o carácter mercantil, aquilo que se compra e se paga.
            Recordei-me de imediato do cenário das eleições e do período que imediatamente as antecede. Aí, sem dúvida, é a palavra «custo» a mais usada. Preferiríamos que fosse «valor». Mas não é. E não há volta a dar-lhe, enquanto vogarmos neste mar encapelado do paradigma capitalista em que os ditos ‘governantes’ europeus teimam em querer fazer-nos naufragar. Não lhes bastam os que vêm lá das costas africanas e sofrem rombo de morte à vista de Lampedusa. Querem mais!...
            E essa dicotomia do custo face ao valor fez-me lembrar também duas informações recentes:
            – A publicidade ao jornal Folha de S. Paulo: «O jornal que mais se compra e nunca se vende»!
            – E a inteligente reflexão a propósito da origem etimológica de duas palavras do nosso quotidiano: «mestre» (professor) e «ministro». Deriva o primeiro da palavra latina magister, que vem, por sua vez, do advérbio magis, que significa "mais" ou "mais do que". «Na antiga Roma», rezava a mensagem que me chegou e eu confirmo, «o magister era o que estava acima dos restantes, pelos seus conhecimentos e habilitações»; havia, por exemplo, um magister equitum, chefe de cavalaria, e um magister militum, o chefe dos soldados; daí vem igualmente a palavra «magistrado». Por seu turno, o vocábulo "ministro" vem do latim minister e este formou-se a partir do advérbio minus, que significa exactamente o contrário do anterior, ou seja, "menos" ou "menos do que". E explicita-se: «Na antiga Roma, o minister era o servente ou o subordinado que apenas tinha habilidades ou era jeitoso». A diferença entre ser ministro e ser mestre! A diferença entre o custo e o valor – será?
            É sempre, pois, a mesma questão: de um lado, pugnamos pelo valor; do outro, regateia-se o custo!

Publicado em Renascimento (Mangualde), nº 627, 15-11-2013, p. 12.

4 comentários:

  1. Caro José d'Encarnação:
    Pois é... os ministros administram-nos evidências, para eles minudências, sem a menor moral, e os mestres não exercem a sua magistratura, admoestando-os de modo magistral...

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  2. Margarida Sobral Neto escreveu: "A origem etimológica das palavras esclarece e põe a nu algumas verdades. Precisamos de mestres a exercer as funções dos ministros."

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  3. Vanda Amaro Jardim Fernandes:
    Gosto imenso desta reflexão,mui pertinente e clarificadora!
    Leonor Casaleiro:
    Aprendi com a sua explicação. Infelizmente, no dia a dia, percebemos que poucos sabem que valor não é custo. Obrigada Zé.

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  4. Jose Fernandes Soares escreveu: "Apenas uma nota, meu caro prof. Não se regateia o custo, mas o preço. Preço e custo são duas coisas distintas em economia. O valor é uma noção subjetiva: é o que uma pessoa está disposta a pagar (preço) pela coisa desejada. Uma pessoa que valorize uma coisa muito, está disposta pagar muito por ele. Assim, quando regateamos o preço, estamos de facto a estabelecer o preço da coisa- aquilo que ela vale realmente para os intervenientes na transação. Se os intervenientes não se entenderem não há preço, nem valor. Desculpe-me esta incursão nos rudimentos da economia. Abraço."

    Não tens que pedir desculpa, porque aprendemos sempre contigo, meu caro Zé. Acontece, porém, que nos movimentamos em campos diferentes; tu no da Economia e Finanças, eu no quotidiano das pessoas. Os «governantes» também andam por esse e não por este. (Repare-se que pus «governantes» entre aspas e não acrescentei nenhum adjectivo!).

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