segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Está manhoso

            ‒ Hum! O tempo, hoje, está manhoso, a ameaçar chuva da grossa. Se calhar, ele não vem!
            ‒ Nam acredito! Disse que vinha de tèmêdia e vem, que o miúdo é uma cegueira pelo avô e não descansa.
            ‒ Mas já viste? Numa jingajoga daquelas, caminhos maus, é capaz de desistir!
            Gostei de as ouvir.
            Primeiro, porque ‘manhoso’ é mesmo a palavra certa para dizer que ‘tem manha’, não se pode confiar nele! Aliás, em tempo de crise, é, se calhar, palavra bem ajustada, porque tudo agora está manhoso, não se pode confiar, que não há brio profissional como dantes! Nem no tempo!...
            Depois, aquele «tèmêdia» encheu-me as medidas. Forma sincopada de dizer «até ao meio-dia», expressão longa de mais para uma conversa rápida.
            Finalmente, jingajoga, que nem sei se a hei-de escrever como já vi por aí, jigajoga, com esse significado de engenhoca; se com g, a aparentá-la com o verbo gingar, porque, aplicada a um carro, uma pessoa pensa logo que aquilo baloiça tudo, tem-te não caias.
            Ah! E a cegueira pelo avô? Como quem está cego para tudo o mais!...
            Não sei como acabou a história. Se o filhote, que prometera trazer o garoto, sempre veio de tèmêdia; se a jingajoga (que comprara praí em 4ª mão!...) sempre aguentou o caminho; se o tempo desanuviou e o vento levou as nuvens cinzentas para o lado do mar. Tudo deve ter acabado em bem, acredito!

Publicado em VilAdentro [S. Brás de Alportel] nº 187-188, Agosto/Setembro de 2014, p. 10.

 

Sem comentários:

Enviar um comentário