domingo, 24 de maio de 2015

A singularidade do Salão de Primavera

            Poderá parecer, à primeira vista, mais um «salão», mais um pretexto para expor trabalhos pictóricos de uns quantos entusiastas pelas Belas Artes. Nada mais errado!
            Na verdade, esta 28ª edição do Salão de Primavera, inaugurada no sábado, 23, na Galeria de Arte do Casino Estoril é muito mais do que isso.
            Para já, é de se atentar no número, a significar que este projecto, iniciado em 1981, teve seguimento. Por ele já passaram, pois, como Nuno Lima de Carvalho explicita na bem oportuna abertura do catálogo a que deu o sugestivo título de «Nobreza no ensino da Arte», 916 jovens artistas, «muitos dos quais», acrescenta, «são hoje pintores de referência ou profissionais qualificados no mundo artístico, como é o caso dos mestres que escolheram os participantes da exposição do corrente ano», Hugo Ferrão (de Lisboa) e Domingos Loureiro (do Porto). De muito louvar, portanto, essa continuidade, num mundo em que iniciativas do género surgem aqui e além e mui rapidamente se dissipam….
            Depois, aqui se expõem, agora, obras de 24 finalistas das Faculdades de Belas Artes de Lisboa e do Porto. Para muitos deles, será essa a primeira linha a figurar no seu currículo, o pontapé de saída para uma carreira que se antoja promissora e estou bem ciente de que o facto de terem aqui sido acolhidos será memória boa a acompanhá-los vida afora.
            Finalmente, é exposição com catálogo a preceito, em bom papel couché, que traz a reprodução, a cores, de uma das duas obras expostas de cada um. Um investimento apoiado, mui naturalmente por Estoril Sol III, mas que deve realçar-se, porque é, sem dúvida, o que fica como documento-memória.
            Apresentou Filipa Tojal (a artista a quem foi atribuído o Prémio Rainha Isabel de Bragança) dois óleos sobre tela a que deu o nome de «Jardim em Azul», ao amanhecer e ao entardecer. Foi o do amanhecer que conquistou o júri, que certamente apreciou a maestria com que soube levar-nos a penetrar numa floresta – mais do que jardim, eu diria – onde a serenidade impera e, diante dela, interrogamo-nos como é que nos cativa assim tanto este aparente emaranhado de verdes e de azuis, e a nesga de céu por cima, verde-acinzentado…

Dei uma volta pelo salão
            Pedro Cunha, densos rostos enclausurados;
            Elisa de Sousa, a serenidade, quiçá desalentada, de um cordeiro;
            Mónica Medeiros, cromático geometrismo;
            Sérgio Almeida (menção honrosa), retratos tristes, castanhos;
            Rita Alfaiate (menção honrosa), uma «narcoléptica prostrada» e um nu prostrado também, de bem visíveis costelas;
            António Bahia (menção honrosa), arranha-céus, na geometria dos telhados creme;
            Rita Sá Lima (menção honrosa), explosão de cor nos seus vasos floridos;
            Carolina Machado (menção honrosa), de roupas espalhadas a dizerem que assim está bem;
            Benedita Santos (menção honrosa): que bem atormentados são esses rituais eróticos, menina!...
            Teresa Pessoa, «memórias» salpicadas;
            Carolina Sales (menção honrosa), «positivo opaco» e «negativo transparente» (mero jogo de palavras, será?);
Eva, de Karyna Igesias
            Karyna Iglesias (menção honrosa), também gostei da sua Eva expectante ou sonhadora, assim como das duas meninas com o coelho de peluche por companhia (bonito aquele fundo de um branco intenso!);
            Eduarda Alves, negrura trágica;
            Juliana Lopes, da originalidade de bem sofredora superposição, como de duas personalidades que teimam em não se encontrar, sangrentos são os rostos;
            Marisa Nóbrega, a comprazer-se no verde duma imaginária floresta;
De João Maria Ferreira
            João Maria Ferreira, o quarto antigo e a velhota a surpreender-se, que é como quem pergunta ‘o que é isso de «7 ou como tornar alguém neutro para que o comprem»’?, que é o título do quadro;
            João Miguel Ramos, «bêbedo» e «Telémaco», retratos em ambiente surreal;
             David Lopes, a obsessão de uma bisnaga de tinta azul;
            Digo Branco, névoa?
            Jorge Charrua: os putos;
            Pedro Poscha : uma visão de anjos bem estranhos, um tem leveza (garante o pintor), o outro… vai-se embora!
            David Simões (menção honrosa), lúgubres são as figuras, amigo!
            Margarida Lopes (menção honrosa), tersas pinceladas de paisagens!...

                                                         José d’Encarnação

 Publicado em Cyberjornal, 2015-05-24:
 
Filipa Tojal com representantes da Estoril Sol
                                                               Os finalistas concorrentes
 




 



 

 


Sem comentários:

Enviar um comentário