quinta-feira, 25 de janeiro de 2018

Será que as feiras têm magia?

             Criou el-rei D. Dinis, reza a História, as feiras francas. Francas, porque nelas se não pagava para expor os produtos e os vender ou trocar. Pretendia o monarca incrementar o comércio e, além disso, fomentar o convívio entre as gentes, que, vindo à feira, sabiam das novidades, trocavam impressões, aumentavam os seus conhecimentos, até porque, de vez em quando, lá aparecia um produto novo a atrair as atenções.
            Lembro-me que minha mãe reservava a quarta-feira para ir à praça na vila. Apanhava a carreira e por lá passava a manhã. Chegava quase à hora de almoço, de alcova carregada de legumes e peixe fresco. Não me parece que lá comprasse mais barato, regatear ela sabia, mormente com as vendedeiras já suas conhecidas, a menina Sara, por exemplo, a quem ela e meu pai compravam peixe desde que se haviam instalado na aldeia. Creio, porém, que o mais importante para minha mãe não eram tanto as compras, era o ambiente, as vizinhas e as amigas que por lá encontrava e sabia de parentes e conhecidos, a enxaqueca de um, a operação do outro, a Felisberta que ia casar, a Joquina que pró mês que vem teria criança… Da praça se desprendia, pois, uma certa magia, que a reconfortava e lhe dava ânimo para mais uma semana de azáfama.
            Viseu teve feira franca, dizem, que viria a dar lugar, séculos mais tarde, à tradicional Feira de S. Mateus. E Alberto Correia, com o livro infantil «Matilde e o Chapéu de Chuva Azul», em boa hora nos proporcionou a nós e, de modo especial, aos mais pequenos, uma viagem mágica a esse mundo inesperado e buliçoso. Já é edição de 2012, patrocinada pela Expovis, Promoção e Eventos, Lda., a entidade organizadora do certame; mantém, contudo, toda a sua actualidade, pela forma esbelta como, através de uma narrativa singela, bem ilustrada pelas fotografias de Rowan Shcelten, sabiamente emolduradas pela maquetização de Sónia Ferreira, retrata uma realidade feliz: o carrossel, o algodão doce, os balões… Matilde não reparou noutros vendedores nem noutros produtos – bons apenas para os adultos. Saída do sótão das coisas velhas levada pelos ares pendurada num velho guarda-chuva azul, só o Tio Chico, que os demais chamavam tolo, a vira e se deu conta dessa viagem. E, no final, quedamo-nos a pensar quanto é importante o sonho. Como sabiamente nos ajuda a compreender melhor a realidade!...
                                                                                  José d’Encarnação

Publicado no Renascimento (Mangualde), nº 723, 15 de Janeiro de 2018, p. 11.

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