Guiou-nos,
na parte respeitante à Ribeira das Vinhas, uma das moradoras mais antigas da vetusta
quinta sita no canto sudoeste da encosta
entre a Av. 25 de Abril e a R. José Florindo. Contou-nos do que eram os
hábitos, ali, nos anos 50, e, no troço inicial do percurso, a norte do mercado,
falou-nos, por exemplo, das grutas aonde outrora se acoitava a população aquando dos ataques dos piratas. Não podemos esquecer
que se chama Outeiro da Vela a colina a nascente, porque os cascalenses ali se
revezavam na «vela» da barra, a vigiar a entrada de embarcações na baía. Uma
dessas grutas terá mesmo assumido funções idênticas às do Poço Velho, ou seja, ali
terá havido ocupação humana no mesmo
período, a Pré-História.
Seguimos,
pois, o percurso em boa hora recentemente inaugurado pelas entidades locais,
junto ao leito da ribeira, ora inteiramente seco, mas limpo. Vimos como a encosta a poente, de pinhal, mantém os muretes que sustinham
os socalcos; mas encantou-nos, sobretudo, o facto de os terrenos do vale
estarem a ser aproveitados para mui vicejantes hortas. Por ali medram tomateiros,
alhos, cebolas, ervilhas, milho-miúdo, feijão, couves, alfaces… E, mais além, a
pachorra de um rebanho de ovelhas e a traquinice
dos cabritinhos…
Aqui
e além, um marmeleiro em flor (lá mais para montante, recorde-se, a ribeira
chama-se popularmente «Rio Marmeleiro»…). Uma senhora, de lenço na cabeça e
botas de borracha, ajeitava com a enxada a cova junto a um loureiro:
‒
Preparando a terra para a sementeira, não?
‒
Ná, agora já não se sameia nada,
senhor!…
Enfim,
uma outra Cascais, serena e sem ruídos – o rebuliço do mercado ficara lá bem para
trás… – ali a dois passos do centro da vila, no convite a uma caminhada tranquila,
na comunhão com a Natureza. Vinhas já não as há – uma que outra latada, só –
que a moléstia do míldio tudo matou há mais de um século. Mas ficou o nome e o
topónimo Alvide também essa antiga paisagem recorda.
O parque urbano dos Mochos
Subimos pela Rua
das Quintas. Fez-se paragem «técnica» na Farmácia e demandámos o Parque Urbano
da Ribeira dos Mochos (a que eu prefiro chamar do «Rio dos Mochos», porque,
habituado às cheias que ele tinha, em Birre, pelos Invernos mais rigorosos, o
povo assim lhe chamava).
Um
outro pa
Observámos
os troços conservados do aqueduto que, em tempos, levou água ao convento de
Nossa Senhora da Piedade (hoje, Centro Cultural); agradaram-nos os viveiros
camarários; louvámos a iniciativa da Cruz Vermelha de no parque ter implantado
uma secção da sua Academia Sénior…
E
quando, já na Rua Joaquim Ereira, nos despedimos, agradecendo o elevado
interesse da iniciativa, vínhamos com apetite para o almoço, sim, mas… com
apetite para mais! Noutra ocasião. Que o coração
da vila de Cascais, cada vez mais despovoado de seus habitantes e enxameado de
turistas, já nada tem a ver com essoutra Cascais natural que a periferia mui
gostosamente ainda deixa contemplar.
José d’Encarnação
Publicado em Costa do Sol Jornal [Cascais], nº 185, 03-05-2017, p. 6.
O enigmático castelinho da Zé Florindo, visto da ribeira
|
Ribeira vai seca, mas o leito mantém-se limpo. Uma bênção! |
Que de histórias tem ainda a ribeira para contar!... |
Retoiçam, tranquilas, as ovelhas e as cabras; e o centro de Cascais ali tão perto!... Quem diria? |
Nos viveiros camarários do Parque do Rio dos Mochos, um casal de coelhos, de orelhas arrebitadas, numa admiração... |
Maria São José Lalanda
ResponderEliminarAdorei o texto. É como estivesse a relembrar os campos junto à casa onde vivia no Estoril, há 32 anos.
Lino de Almeida
ResponderEliminarCaro Amigo Encarnação, gostei muito do seu texto e de rever, através do mesmo, alguns dos locais que a silenciada Moravela tanto defendeu há uns bons anos, como por exemplo o Outeiro da Vela e a Ribeira das Vinhas. Quanto ao Outeiro da Vela, sabe alguma coisa do que o "destino" reserva para aquele local há muito esquecido?
Comentário meu: Fala-se em condomínio fechado, depois de tanto se haver defendido a sua preservação para usufruti pela comunidade. Os tempos são outros, amigo Lino, e os miradouros também.
Maria Salomé Celestino Soares Obrigado, vou levar para o Pedra, bjs :-
ResponderEliminarSabina Cupi
ResponderEliminarObrigada de estas informaçãos
Bela narrativa, como sempre, a despertar recordações dos tempos em que descia a José Florindo para ir buscar leite à ordenha na Quinta das Rosas, e de onde, de quando em vez subiam patos para as poças, agora e em boa hora "extintas", no Bairro do Tremil, finalmente requalificado. Obrigado caro José!
ResponderEliminarGostei que lhe chamasse "Rio Marmeleiro" pois foi assim que os meus pais e avós me ensinaram. Comi muita enguia nos idos de 60 apanhadas ali "ao garfo". Bem haja José d'Encarnação.
ResponderEliminarMaria Manuela Baptista
ResponderEliminarObrigado pelo que nos ensinas!
Um grande beijo!
Sonia Carmona Antunes
ResponderEliminarCaro Professor e amigo,
Um grande Bem-haja pelos seus textos, que são sempre uma aprendizagem.
Gostei muito.