Chata que ela
é! Bem gordinha, decerto uma daquelas que fica grávida e depois busca um
cantinho como que para hibernar e aí depositar os ovinhos. Põe, dizem os entendidos,
100 a 150 num dia e realiza umas 5 posturas durante uma quinzena. As crias
demoram 24 h a sair e aumentam, em 4 dias, 54 vezes a sua estatura. Calcula-se que
um casal de moscas pode gerar, num Verão, mais de 300 biliões de descendentes!
Foi por saber
disto logo na minha juventude, que, anos seguidos, sem dó nem piedade, eu agarrava
num folha de papel, encostava a mosquinha a um dos caixilhos da janela e… era
uma vez! Irritava-me vê-la a voar dum lado para o outro. Distraía-me.
Agora, mercê
de tantas campanhas em prol do valor dos insectos, acabo por me levantar (bom pretexto
para exercício físico), abro uma das folhas da janela, agarro numa folha de
papel e insisto com ela: saia para a Natureza! E digo insisto, porque habitualmente
teima em não querer seguir os meus mecânicos conselhos, esgueira-se por baixo
da folha e volta a bater nos vidros mais afastados. Ganho paciência e consigo libertá-la.
As varejeiras –
desculpem! – essas, apesar do corpo azul-esverdeado, tão luzidio quão repelente,
não gosto delas, porque me lembro sempre delas a poisar no peixe e, até, descaradamente,
a depositarem lá os ovinhos. Agora, as vulgares até as aprecio, sobretudo após
ter visto macrofotografias dos seus olhos, com as suas 4000 (quatro mil!...)
lentes hexagonais – agradeço a Fernando Ferreira, o fotógrafo da Natureza,
ter-nos facultado uma! – e saber que batem as asas ao ritmo de 350 por
segundo!...
Tive acesso a
uma ficha moscométrica: nome – mosca; apelido – insecto díptero; olhos – salientes;
cabeça – elíptica, com antenas e tromba; cor – negra; estatura – 7 milímetros;
profissão – aborrecer e contagiar!
E não resisto
a transcrever o que li numa revista, em Julho de 1963:
«E se o trazer
mosca (meia dúzia de pelos sob o lábio inferior) é moda masculina, como igualmente
o sinal preto no rosto (mosca) foi, e é, enfeite para algumas damas; se ter
mosca é sinónimo de dinheiro – não desejamos que nenhum dos nossos leitores ande
com a mosca ou mereça o epíteto de mosca-morta com que os vocabulários
familiares costumam brindar as pessoas sonsas ou indolentes».
José d’Encarnação
Publicado em Renascimento (Mangualde), nº 824, 15-06-2022, p. 12.
Parabéns pelo texto.
ResponderEliminarFiquei encantada com os elementos informativos deste texto. Tão detalhados, podiam levar incautos a simpatizar com as moscas. Estive quase... mas de repente acordei para os biliões de perigos que elas conseguem gerar e contive-me. Não suporto nem as moscas comuns, nem as moscas-mortas. E sei de uma criança que há muitos anos morreu por causa de uma mosca que a a infectou com o carbúnculo. Prefiro ir nessa de colocar a folha de papel...e zás. Afinal ainda ficarão muitas para aborrecer as almas. Um abraço. Muito grata.
ResponderEliminarNão simpatizo nada com esses bicharocos, mas... adorei o texto!
ResponderEliminarDe: Alberto Correia
ResponderEliminar16 de junho de 2022 23:44
Teremos que respeitar essas criaturas que o Criador nos deixou?!.
E os impertinentes mosquitos? (Logo ontem destruí alguns...)
E as impertinentes melgas? Reais e figuradas?!...
Obrigado professor José por continuar a valorizar o meu humilde trabalho.
ResponderEliminarO texto está fantástico.
Um grande Abraço.
https://www.facebook.com/FernandoFerreiraPhotography/
Teve Fernando Ferreira a gentileza de me explicar o seguinte, em mensagem de 23-06-2022, que agradeço:
ResponderEliminar«As moscas também são muito importantes para o nosso ecossistema...😉
Temos moscas predadoras e parasitóides (que ajudam a controlar outras espécies de insetos e até mesmo as próprias moscas), moscas detritívoras (ajudam na limpeza dos nossos terrenos, animais mortos, dejetos, etc...), moscas polinizadoras (muito importantes, por exemplo, sem elas não tínhamos chocolate (cacau), etc...
António Keating (entomólogo forense) diz:
"As moscas limpam o mundo. Bastam as moscas para limpar a carcaça de um elefante".